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Inclusão em "lista negra" pode afetar outras pessoas de uma mesma família
Parente de quem vai à Justiça também fica sem emprego
DA REPORTAGEM LOCAL
As "listas negras" não afetam
somente o trabalhador, mas também o emprego de outras pessoas
de sua família. O Ministério Público do Trabalho de Campinas
reúne denúncias de casais que
não conseguem voltar ao mercado porque um deles reclamou
seus direitos na Justiça.
Carlos Pedro Rangel, residente
em Igarapava (SP), por exemplo,
não consegue emprego na região
porque sua mulher entrou com
ação trabalhista contra uma cooperativa agrícola. "As listas estão
bem ativas na região", diz Raimundo Simão de Melo, procurador-chefe do Ministério Público
de Campinas.
Outros depoimentos reunidos
pelos procuradores de Campinas
revelam que os trabalhadores
chegaram a ouvir de empresas
que iriam contratá-los -mas
que, após consultar as listas, não o
fizeram- que teriam dificuldade
para conseguir emprego por terem movido ações trabalhistas.
Ao saber da existência das listas,
Maria José Francisco, 49, que reside em Matão (SP), trocou até a
função de colhedora de laranja
pela de empregada doméstica. Ela
moveu ação trabalhista contra
uma empresa que contrata mão-de-obra para a colheita da safra na
região. "O empreiteiro que trabalhava nessa empresa me disse que
quem tem processo trabalhista
não arranja mais emprego. Agora, mesmo quando uma empresa
não paga o que temos direito, temos de ficar quietos?", questiona.
Os autônomos também são vítimas das listas. No Ministério Público do Trabalho de São Paulo há
denúncias de taxistas de frotas
que dizem ter sido discriminados
por empresas por terem movido
ações trabalhistas.
Mas o MPT tem dificuldades
para conduzir a investigação porque a DRT (Delegacia Regional
do Trabalho) de São Paulo entende que eles não têm vínculos de
emprego e, portanto, o assunto
deve ser tratado na Justiça comum. O caso dos taxistas está nas
mãos da procuradora Célia Regina Stander. "Mas, se ficar provado
que a empresa discriminou esses
motoristas, ela será punida. A investigação não vai cessar se a ação
não puder ser conduzida na Justiça do Trabalho."
A proliferação das "listas negras" on-line já chegou ao TST
(Tribunal Superior do Trabalho)
por meio de denúncia do Ministério Público do Trabalho de Brasília. O TST já retirou os nomes das
pessoas que moveram ações trabalhistas dos sites que informam
sobre os processos, como medida
para inibir a listagem de nomes.
Agora, a busca pode ser feita pelo
nome do advogado ou pelo número do processo.
Guilherme Mastrichi Basso,
procurador-geral do Trabalho,
solicitou ao TST que recomende a
mesma prática aos outros TRTs
(Tribunais Regionais do Trabalho). Essa ação, diz, se deve ao fato
de que o número de denúncias de
trabalhadores que se consideram
vítimas das "listas negras" está
crescendo a cada dia em várias regiões do país.
As denúncias, diz Basso, chegam por e-mail, telefone, cartas e
sites. Em sua maioria, são anônimas, informa o procurador-geral.
Do baixo ao alto escalão
As "listas negras", de acordo
com advogados trabalhistas ouvidos pela Folha, existem em todos
os níveis de trabalhadores -dos
cargos mais baixos até o de presidente. Recentemente, um executivo que deixou a chefia de uma
indústria alimentícia foi barrado
ao tentar ocupar a mesma função
em outra indústria do setor por
estar na "lista negra" -ele moveu
uma ação trabalhista contra a empresa que deixou. Mas acabou
sendo ressarcido pelo dano: a Justiça determinou que ele fosse indenizado com a quantia de R$ 500
mil.
Luís Carlos Moro, advogado
trabalhista, informa que tem cerca de dez casos de vítimas de listas
para cuidar no seu escritório. O
que ele afirma perceber, ao tentar
reunir documentação para encaminhar à Justiça, é que as listas estão cada vez mais eficientes.
As dificuldades para comprovar
sua existência chegam a desestimulando o trabalhador a fazer a
denúncia. Segundo Moro, a troca
de informações sobre empregados que movem ações trabalhistas
ocorre também entre federações
de indústrias e associações de
classe patronal.
"Isso é discriminação, o que é
proibido por lei no país." Isso está
claro, diz, no artigo 373 da CLT,
que estabelece restrições à discriminação. Em 98, a OIT (Organização Internacional do Trabalho)
estabeleceu quatro bases para o
trabalhador quanto ao direito internacional: a promoção da liberdade sindical, a negociação coletiva, a eliminação do trabalho escravo e a eliminação da discriminação no emprego, como é o caso
da "lista negra".
(FÁTIMA FERNANDES E CLAUDIA ROLLI)
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