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PROJEÇÃO
Estudo de 1999 previa que, com economia de apenas 0,03%, seria possível manter relação dívida/PIB de 46,5%
BC errou superávit deste ano em 9.970%
GUSTAVO PATÚ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
"Há razões para duvidar que a
dívida pública no Brasil é sustentável?", pergunta, em seu título,
um recente estudo do Banco Central que serviu de base para as metas acertadas com o FMI (Fundo
Monetário Internacional) destinadas a conter a escalada do endividamento brasileiro.
Para sua sorte, o governo não
deu um título tão desafiador nem
dedicou tanto alarde a um estudo
semelhante do BC produzido há
menos de três anos, em dezembro
de 99: ali se estimava que, no ano
de 2002, um superávit primário
de R$ 500 milhões -ou 0,03% do
PIB (Produto Interno Bruto)-
bastaria para manter a dívida estável em 46,5% do PIB.
Como foi divulgado nesta semana, 2002 terminará com um
superávit primário -a parcela
das receitas do governo destinada
ao pagamento de juros- de R$
50,35 bilhões, valor que a equipe
econômica descobriu ser necessário para segurar a dívida em desejados 59% do Produto Interno
Bruto.
Olhando apenas para o valor do
superávit imaginado, trata-se de
um erro de 9.970%.
Na comparação entre a dívida
estimada em 99 -coerente com
as metas do acordo da época com
o FMI- e o valor esperado para
este ano, a diferença é de R$ 140
bilhões.
O trabalho de 99, elaborado por
um grupo de técnicos do BC, se
amparava no que os especialistas
chamam de modelo econométrico: a partir de hipóteses para o
comportamento futuro de fatores
que influenciam a dívida pública,
como os juros, o câmbio e o crescimento do PIB, foram calculados
os superávits necessários para
manter a dívida no patamar desejável.
O trabalho mais recente, do diretor de Política Econômica, Ilan
Goldfajn, segue a mesma lógica,
embora com hipóteses diferentes
(leia quadro nesta página).
No modelo de Goldfajn, exibido
nos sites do Ministério da Fazenda e do BC, estima-se o comportamento da dívida pública se mantido, por vários anos, um superávit
de 3,75% do PIB. A conclusão é
que não há razões para temer a insolvência do Estado brasileiro.
Desvios na origem
O sucesso de modelos como esses depende, obviamente, das hipóteses utilizadas no cálculo.
Escolhas infelizes são responsáveis pela grande maioria dos já
folclóricos casos de previsões erradas de economistas.
No estudo de 99, por exemplo,
imaginou-se que, em 2001, o dólar
ficaria em R$ 2,03, os juros do BC
seriam de 11,92% ao ano e o PIB
cresceria 4,5%.
Como nada disso se confirmou,
esfarelaram-se não só as estimativas para aquele ano, mas também
todos os resultados calculados para o período 2002-2010.
Na época, o acordo entre o Brasil e o FMI estipulava metas rígidas de superávit primário para os
anos de 99, 2000 e 2001. Pelo discurso oficial, em 2002 o acordo
não seria renovado e não haveria
mais a necessidade de sacrifícios
tão grandes.
Os cálculos de Goldfajn partem
de uma situação catastrófica se
comparada às previsões de 99. A
dívida pública estimada para este
ano é de R$ 765 bilhões, contra R$
625 bilhões calculados pelo modelo anterior.
Em defesa da solidez dos novos
números, o estudo diz ter usado
hipóteses "conservadoras": dólar
nos níveis atuais, juros reais de
9% ao ano e crescimento econômico de 3,5% ao ano. Sob essas
condições, a dívida cairia a
49,86% do PIB em 2010.
Riscos em 2003
A longo prazo, de fato, não são
hipóteses otimistas, uma vez que
o dólar hoje bate recordes, juros
reais de 9% continuariam entre os
mais altos do mundo e o crescimento imaginado seria medíocre
para um país como o Brasil.
O estudo ainda se preocupou
em testar hipóteses ainda piores,
consideradas improváveis, e ainda assim a dívida se manteve em
trajetória razoável na maior parte
dos cenários.
Há, porém, um problema: se
são "conservadoras" para uma
década, as hipóteses soam como
feitos espetaculares para o ano de
2003, na comparação com o desempenho recente da economia
brasileira e diante da perspectiva
de permanência da crise financeira internacional.
Se o sucessor do presidente Fernando Henrique Cardoso, em seu
primeiro ano de mandato, não
conseguir deter a alta do dólar, reduzir os juros para o menor nível
desde o Plano Real e obter a melhor taxa de crescimento desde
2000, todo o cenário básico do estudo estará inviabilizado.
Não por acaso, o acordo com o
FMI já exigiu a elevação do superávit para 3,88% do PIB neste ano
e estabeleceu quatro reuniões para reavaliar as metas fixadas para
o próximo.
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