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RECEITA ORTODOXA
Presidente só aceita prosseguir com 4,5% para inflação de 2005 se equipe econômica continuar reduzindo a Selic
Lula exige juro menor para manter
meta
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Para manter a meta de inflação
do ano que vem em 4,5%, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva
exige o compromisso da equipe
econômica de que a taxa básica de
juros, hoje em 16% ao ano, continue a cair e, na eventualidade de
um choque externo, não volte a
ser elevada.
A Folha apurou que o ministro
da Fazenda, Antonio Palocci Filho, que resiste a alterar a meta de
inflação de 2005, já iniciou articulações nos bastidores com o presidente do BC (Banco Central),
Henrique Meirelles, para satisfazer o desejo presidencial. Palocci
trabalha nesse sentido mesmo sabendo que não é possível dar garantia completa de que, num cenário extremo, o governo possa
evitar aumento de juros.
Essa é a saída política encontrada por Palocci para tentar evitar
uma derrota no debate econômico aberto pelo próprio presidente
no último dia 15 de abril, ao realizar uma reunião ampla com ministros de várias áreas e líderes
congressuais a fim de discutir a
proposta de Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2004. A LDO, enviada ao Congresso em abril último, fixa regras para a elaboração
do Orçamento de 2005, cuja proposta será fechada em agosto.
Nessa reunião, o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), e o ministro Ciro Gomes (Integração Nacional) defenderam a mudança da meta de inflação de 2005 de 4,5% para 5,5%.
O argumento, que sensibilizou
Lula, foi o de dar mais espaço para
manter o ritmo de queda dos juros básicos.
No regime de metas de inflação
adotado pelo Brasil, a política monetária (juros) é feita de forma
mais ou menos restritiva para
atingir o chamado centro da meta. Se a meta de 2005 fosse alterada, o BC poderia ser mais flexível
na política monetária, já que trabalharia com uma meta maior.
Em 2002, ainda no governo Fernando Henrique Cardoso, o governo mudou a meta de inflação
para 2003, que subiu de 3,75% para 4%. No ano passado, o governo
Lula também alterou a meta de
inflação de 2004, que passou de
3,75% para 5,5%.
Ainda em 2002, o governo também elevou de 2 pontos percentuais para 2,5 pontos a banda de
variação da meta de inflação. Esse
intervalo foi mantido para este
ano. Ou seja, a meta de inflação de
2004 terá sido cumprida se o
IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) estiver entre 3% e
8%. De janeiro a abril, o IPCA, índice oficial da meta de inflação,
acumula alta de 2,23%.
Meirelles sob pressão
O argumento principal de Palocci é que o efeito da mudança da
meta de 2005 seria nulo, pois já
existe a banda de variação. No limite, a inflação do ano que vem
poderia atingir até 7%. Mas Mercadante e Ciro rebateram essa alegação, ao dizer que o BC tem se
comportado de forma ortodoxa e
mirado no centro da meta.
Ou seja, se o BC evita usar a banda, precisa ser mais conservador
na política monetária, e isso inibe
o crescimento econômico. Daí
Mercadante e Ciro insistirem na
alteração da meta para 5,5% (8%
no limite máximo da banda).
Na época, Lula comprou a idéia
porque estava muito contrariado
com o BC. No final de 2003, o presidente deu demonstrações explícitas de satisfação com Meirelles.
Mas, hoje, está insatisfeito.
Lula avalia que o Comitê de Política Monetária, órgão do Banco
Central que se reúne mensalmente para fixar a taxa de juros, errou
em janeiro e fevereiro, quando
manteve inalterada a taxa Selic.
Para Lula, essa posição do BC
inverteu o clima de otimismo que
se desenhou em relação a 2004 no
final de 2003. Na seqüência, o governo viveu sua pior crise política
(caso Waldomiro Diniz) e as dificuldades do "abril vermelho" (invasões do MST, greves, recrudescimento da violência no Rio e em
Rondônia). O clima político ruim
contribuiu para diminuir a expectativa otimista em relação à economia e gerou caldo de cultura
para críticas à gestão econômica.
A Folha apurou que Lula já disse a mais de um interlocutor que
Meirelles precisa deixar de pensar
que "preside o Banco Central da
Dinamarca". Foi no contexto dessa insatisfação que prosperou a
idéia de mudar a meta de inflação.
Em junho, o CMN (Conselho
Monetário Nacional), organismo
formado por Palocci, Meirelles e o
ministro Guido Mantega (Planejamento), faz a reunião na qual
deve definir a meta de inflação de
2006. Seria, na visão de Mercadante e Ciro, a hora de rever a meta de inflação de 2005.
Como Mercadante falou sobre o
tema publicamente, Palocci ficou
contrariado. E passou a bombardear a idéia. Chegou a estudar a
opção de fixar a meta de inflação
com base no "núcleo" do IPCA.
Usar o núcleo do IPCA, que expurga efeitos sazonais, como choques externos, daria mais credibilidade ao mecanismo. O núcleo é
um índice mais estável, já que sofre menos influência dos fatores
sazonais. Mas essa idéia, hoje, está
em segundo plano.
O presidente teve uma conversa
franca com Palocci. Disse-lhe que
a manutenção de um superávit
primário alto, de 4,25% do PIB
(Produto Interno Bruto), era insustentável politicamente com taxas de juros nas alturas.
Lula, então, exigiu o compromisso de diminuição das taxas de
juros e o de não aumentá-las caso
ocorra um choque externo. Do
contrário, o governo se arriscaria
a "jogar fora", segundo expressão
presidencial, o sacrifício fiscal feito até agora.
A exigência de Lula explica também por que o ministro da Casa
Civil, José Dirceu, disse publicamente na última semana que o
Brasil deve perseguir uma taxa de
juros real (descontada a inflação)
de 6% ao ano. Hoje está pouco
abaixo dos 10%. Com uma taxa
real ao redor de 6%, Lula acredita
que a evolução da dívida pública
em relação ao PIB vá ficar sustentável e acabará com temores dos
investidores em relação a eventual reestruturação do débito.
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