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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Redes estratégicas criam ondas de acumulação
GILSON SCHWARTZ
ARTICULISTA DA FOLHA
A vança pouco e mal o debate sobre políticas de desenvolvimento no Brasil. O país
continua na UTI, e o governo federal ainda está a meio caminho
entre gerenciar uma herança e
construir novos modelo e regulação.
Algum consolo vem de olhar
para o resto do mundo e ver como outros países desenham e
implementam políticas estratégicas mesmo (ou sobretudo) em
períodos de crise.
Entre as organizações estatais
mais bem-sucedidas no desafio
de manter a visão estratégica no
longo prazo está a Jetro (Japan
External Trade Organization, a
Organização de Comércio Exterior do Japão). Seu Instituto de
Economias em Desenvolvimento acaba de publicar um estudo
detalhado sobre processos de
aglomeração industrial ("Industrial Agglomeration: Facts and
Lessons for Developing Countries", editado por Mitsuhiro
Kagami e Masatsugo Tsuji).
A aglomeração de indústrias,
fenômeno conhecido também
como formação de "clusters" ou
distritos industriais, é objeto de
pesquisas desde o século 19.
A aglomeração é um processo
que obviamente se dá no espaço,
é um aspecto da geografia econômica. Mas a internet e, de modo geral, as novas tecnologias de
informação e comunicação promovem novas formas de organização que parecem colocar em
segundo plano o enraizamento
espacial, as vantagens de localização. Do telemarketing aos pólos de produção de software, a
geografia econômica mundial e
a divisão internacional do trabalho são redesenhados, criando
novas oportunidades de desenvolvimento econômico.
Os estudos publicados pelo
IDE sugerem, no entanto, que as
oportunidades de acumulação
de capital têm sido transformadas, mas não eliminadas por redes como a internet . Aliás, alguns dos indicadores de desenvolvimento de redes levantados
pelos pesquisadores indicam algo surpreendente: os espaços de
aglomeração que implementam
redes digitais interativas são os
que obtêm maiores índices de
acumulação de capital e desenvolvimento.
Essas redes criam ondas de
acumulação que surgem e se
aprofundam principalmente em
espaços urbanos ou regiões onde já é maior a facilidade para
combinar contatos remotos
com encontros "face a face".
A conclusão dos organizadores do estudo é clara: entre as
tecnologias de informação e comunicação (virtuais) e os contatos humanos (reais) há uma relação de complementariedade,
não de substituição. Os dois se
tornam mais intensos e dinâmicos em conjunto. Foram comparados "clusters" no Japão, nos
EUA, na Itália e no México.
O Brasil tem vários espaços de
aglomeração industrial e em São
Paulo há até vários "clusters"
bem conectados por rodovias e,
cada vez mais, por redes de alta
velocidade.
Esforços obcecados em favor
da descentralização industrial e
do desenvolvimento regional fizeram nas últimas décadas a alegria de muita elite nordestina,
como relembrou há alguns dias
o presidente Lula. Podem ser
uma estratégia condenada ao
fracasso.
Investimentos, principalmente de governos e prefeituras, no
desenvolvimento de redes digitais interativas que aprofundem
ainda mais o paradoxo da acumulação onde já existem pólos
de crescimento podem ser a
aposta mais inteligente para dar
saltos de desenvolvimento que
beneficiem o país inteiro.
É uma conclusão pouco simpática e um tanto incorreta politicamente. Mas, a julgar pelos
estudos dos especialistas, é assim que o capitalismo costuma
funcionar.
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