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ARTIGO
Pacote é derrota para próximo presidente
Associated Press
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Operadores da Bolsa de Chicago, na sexta-feira, pacote para o Brasil impulsionou alta nas Bolsas |
WALTER MOLANO
ESPECIAL PARA A FOLHA
O "pacote de resgate" anunciado para o Brasil marcou
um acontecimento raro na vida, a
oportunidade de recuperar dinheiro depois que uma aposta dá
errado. Os analistas ficaram em
êxtase com relação ao acordo.
Todos tentavam se superar em
elogios ao pacote. No entanto,
basta observar alguns detalhes
para perceber uma história diferente. O pacote de resgate de
US$ 30 bilhões consiste de três
grandes componentes: redução
do piso mínimo de reservas cambiais, rolagem das obrigações para com as instituições multilaterais em 2003 e dinheiro novo.
Em troca, o governo brasileiro
se comprometeu a manter um superávit fiscal primário de 3,75%
do PIB pelos próximos três anos.
O governo concordou em que o
FMI (Fundo Monetário Internacional) monitorasse seu desempenho fiscal em base trimestral.
Diversos analistas elogiaram o
pacote porque o programa prevê
empréstimos escalonados, com a
maior parte dos fundos desembolsada em 2003. Mas estudo
mais detalhado do plano sugere o
oposto. O verdadeiro benefício do
programa será realizado em 2002,
permitindo que o presidente Fernando Henrique Cardoso e sua
equipe econômica encerrem seus
mandatos sem sofrer o embaraço
de uma moratória ou de um colapso econômico.
O estudo dos detalhes revela
dois elementos cruciais. O primeiro é uma redução de US$ 10
bilhões no piso de reservas cambiais, de US$ 15 bilhões para
US$ 5 bilhões. Wall Street considera que essa medida foi muito
positiva, porque provê cerca de
US$ 16 bilhões em liquidez adicional para o mercado de câmbio.
O real certamente subirá, o que
é uma ótima notícia para os bancos que precisam liquidar posições ou encerrar contratos de financiamento comercial, mas não
representa vantagem nenhuma
para um investidor que detenha
uma obrigação com vencimento
em 2040. Pelo contrário. Para os
investidores de médio e longo
prazos, é uma má notícia, porque
significa que existe uma boa
chance de que o país perca suas
reservas no curto prazo.
Há outro elemento interessante
no plano. O FMI só ofereceu
US$ 6 bilhões em dinheiro novo.
No entanto, esse dinheiro será desembolsado em 2002. O comunicado do FMI informava que o
programa seria aprovado até o
começo de setembro e que os
US$ 6 bilhões estariam disponíveis para saque imediato. Ou seja,
o dinheiro vai para o governo
atual, e a conta, para o governo
que será eleito.
Sem novidade
Assim, não há nada de novo no
pacote do FMI. Foi aquilo que nos
acostumamos a esperar. Um programa modesto de US$ 6 bilhões
que comprará tempo suficiente
para FHC encerrar seu mandato.
O resto do pacote não passa de
prestidigitação. Foi simplesmente
uma autorização do FMI para que
a equipe econômica que está saindo do poder esgote a maior parte
dos ativos líquidos brasileiros. E
também permite que o Brasil role
suas obrigações para com as instituições multilaterais que vencem
em 2003, algo que já sabíamos que
aconteceria.
Em resumo, o pacote foi proposta vencedora para todos os envolvidos nas negociações. Foi
uma vitória para o Tesouro dos
Estados Unidos porque minimiza
o uso do dinheiro dos "encanadores e carpinteiros" que vai parar
em contas na Suíça. Foi uma vitória para o Departamento de Estado porque causou a impressão de
que os Estados Unidos estão dispostos a apoiar seus aliados latino-americanos.
Foi uma vitória para o Departamento de Comércio porque permite o avanço das negociações da
Alca (Área de Livre Comércio das
Américas). Foi uma imensa vitória para FHC porque permite que
ele encerre seu mandato sem
grandes embaraços. Foi também
um ganho extraordinário para os
bancos de investimento, porque
permite que liquidem suas posições de curto prazo e realizem
"hedge" para as demais.
Infelizmente, foi uma derrota
para o próximo presidente do
Brasil, porque deixou a ele o ônus
de manter superávit fiscal primário de 3,75% do PIB durante a
maior parte de seu mandato. Embora diversos analistas tenham
elogiado a adoção desse percentual, ele é muito superior ao superávit primário obtido por FHC
durante seu primeiro mandato.
A equipe de FHC vem trabalhando com uma meta de superávit primário de 3,75% há apenas
algumas semanas. Além disso, o
novo governo terá de enfrentar
inspeções trimestrais do FMI.
O pacote do FMI autoriza o governo em fim de mandato a limpar os cofres do Banco Central e a
deixar as contas para a próxima
administração. Portanto, a probabilidade de moratória brasileira é
maior agora do que no passado.
É hora de sair da festa. Aproveite a oportunidade criada pela demanda por papéis brasileiros e
procure a saída mais próxima.
A conta, por favor.
Walter Molano é analista para a América Latina da corretora BCP Securities.
Tradução de Paulo Migliacci
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