São Paulo, quinta-feira, 11 de setembro de 2008

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PIB a 3,5% não é tragédia, afirma Belluzzo

Na opinião do economista, a crise global levará o Brasil a diminuir o ritmo e pode requerer um forte corte de juros

A exploração dos campos do pré-sal ajudará o Brasil a absorver melhor o impacto da desaceleração mundial, afirma conselheiro de Lula

Joel Silva - 13.jun.08/Folha Imagem
O economista Luiz Gonzaga Belluzzo, professor da Unicamp

DENYSE GODOY
DA REPORTAGEM LOCAL

O desempenho da economia brasileira no segundo trimestre foi animador, mas, agora, já se notam sinais de desaquecimento, diz o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, 65, professor da Unicamp e conselheiro informal do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para ele, não se deve fazer drama com a diminuição do ritmo do país, pois os futuros avanços partirão de um nível de atividade elevado.

 

FOLHA - O PIB brasileiro cresceu 6,1% no segundo trimestre porque os juros ainda não começaram a fazer efeito. Como fica o cenário para o Brasil em 2009, considerando também a crise global?
LUIZ GONZAGA BELLUZZO
- Minha impressão é que já há sinais de desaceleração. Acho que teremos, sim, uma taxa de crescimento mais baixa. Mas precisamos ter claro que uma queda de 6% para 4% ou 3,5% [ao ano] não é nenhuma tragédia. A partir de um nível já alto, vai ter um crescimento menor. E não há como evitar essa desaceleração, pelo menos nos próximos anos, enquanto durar a desaceleração global.

FOLHA - O senhor disse anos?
BELLUZZO
- O Brasil terá que atravessar um período de ajustamento, no tempo que durar a recessão global. Mas, depois, tem a exploração do pré-sal, que começa a dar resultados.
Será necessário então cuidar do financiamento à exploração. A descoberta do pré-sal pode reduzir um pouco as trombadas do ajustamento brasileiro.

FOLHA - A economia dos EUA cresceu 3,3% no segundo trimestre. Isso significa que o alastramento dos problemas bancários pela economia ainda não se deu?
BELLUZZO
- Na verdade, o setor externo deu uma contribuição importante para que o PIB americano não recuasse. Porque todos os componentes da demanda agregada caíram: o emprego caiu, a produção caiu, o desemprego aumentou. O efeito positivo do setor externo vai depender [daqui para a frente] da reação das outras economias à recessão dos EUA.
Os países que precisam do empuxo da economia americana estão começando a entrar em recessão, como a Europa e a Ásia. A China certamente vai se desacelerar, e não temos certeza -pois trata-se de um momento inédito- de qual será a sua reação. O seu peso não é suficiente para compensar uma desaceleração dos EUA e da Europa. Não digo que não possa, mas tenho minhas dúvidas.

FOLHA - Analistas afirmam que o Brasil não mostra estar sofrendo muito com a crise justamente porque a China segue crescendo bastante. Quais seriam as conseqüências para o país se ela diminuir consistentemente o ritmo?
BELLUZZO
- A queda de preços das commodities que estamos vendo é resultado da desmontagem de posições no mercado futuro mas também das expectativas de demanda no mundo real. Temos que esperar para ver o que acontece. O BC brasileiro está em uma situação muito difícil, precisando tomar decisões complexas. Seria conveniente que tivesse mais tempo para pensar, mas isso não é possível.

FOLHA - O senhor acha que o BC errou ao diagnosticar que a inflação tinha um componente forte de demanda interna?
BELLUZZO
- Esse é um juízo muito complicado, não dá para ter uma posição radical em relação a isso. Sempre que você toma posição radical, você corre o risco de errar. Como disse [Antônio] Delfim [Neto], se você não tem certeza do que está fazendo, faça devagar...

FOLHA - No aumento da Selic, o BC está indo bem rápido...
BELLUZZO
- Ali atrás, o julgamento do BC era que havia um choque de commodities junto com a aceleração do crédito e da demanda interna, um processo que poderia levar à disseminação do choque de preços. Agora, estamos em um momento diferente, mudaram as perspectivas. Diria que é um azar o BC ter que decidir agora, ele pode se equivocar.

FOLHA - Continuar elevando os juros é um equívoco?
BELLUZZO
- Corre-se o risco de se cometer um exagero.

FOLHA - É possível combinar controle da inflação com crescimento da economia?
BELLUZZO
- Acho que o Brasil vem tendo um comportamento mais do que razoável. Desde 2004, o país está crescendo a taxas compatíveis com uma inflação baixa. Porém, dependendo da velocidade [da desaceleração global], a política econômica [do país] é outra.

FOLHA - Como seria, nesse caso?
BELLUZZO
- Tem que desmontar rapidamente esse diferencial de juros, senão você vai aprofundar a sua recessão, como os alemães fizeram em 1930. Eles acharam que o choque de 1929 era transitório, mantiveram uma política de juros altos para atrair de volta os capitais e conseguiram na realidade agravar a sua deflação interna, o que levou a um desastre. Não digo que a nossa situação é a mesma; porém, se a desaceleração for muita e a aversão ao risco continuar e começar um movimento de capitais daqui para fora, podemos ter uma situação difícil a enfrentar.


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