São Paulo, domingo, 12 de janeiro de 2003

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NEGOCIAÇÃO

Principais setores e organizações do país já pressionam o novo governo sobre salário mínimo, reformas e inflação

Trégua dos "cem dias" cede às cobranças

ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

O clima amistoso entre o governo Lula e os principais setores e organizações do país -que geralmente dura os cem primeiros dias de uma nova administração- deve dar lugar a uma cobrança latente. A pressão já figura em torno de três pontos: a definição do novo salário mínimo -que vigora já em maio-, o encaminhamento das reformas previdenciária e tributária e o controle imediato da inflação.
A movimentação entre os empresários, sindicalistas e líderes setoriais é clara nesse sentido. "Nós temos essa mania de declarar lua-de-mel nessa fase e isso não dá em nada. Essa filosofia de ficar quieto só nos faz perder tempo", diz Sérgio Haberfeld, presidente da Dixie-Toga e um dos primeiros empresários a declarar, em 2002, apoio ao então candidato Luiz Inácio Lula da Silva.
A posição é a mesma defendida pelos líderes da Força Sindical. Cinco semanas de governo já seriam suficientes, no entender da organização, para Lula mostrar a que veio. Partindo desse raciocínio, já em março os sindicalistas iniciam marcação mais cerrada para pressionar o governo em torno do salário mínimo de US$ 100. O novo valor vigora a partir de 1º de maio.
Na prática, a Força, que passou de aliada do governo tucano para a oposição, quer se recuperar da derrota de suas lideranças nas urnas -e a pressão sobre o governo Lula será a principal arma.
Uma arma não só dela: no fim dos cem dias iniciais de governo, a cobrança em cima do salário mínimo virá ainda das alas mais radicais da CUT (Central Única dos Trabalhadores) -como as correntes sindicais ligadas ao PSTU (Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado)-, que também se preparam para exigir de Lula a execução de suas promessas logo.

Mais espaço
Marcação forte, ainda que bem mais discreta, também do lado da indústria. Tanto que o ministro do Desenvolvimento Luiz Fernando Furlan, por onde a indústria se fará ouvir no atual governo, já começou a mexer os pauzinhos: quer "dividir" o BNDES em dois, para incentivar as exportações da indústria e, apurou a Folha, já esteve conversando com o representante comercial dos EUA, Robert Zoellick, para tratar da questão da barreira ao aço nacional.
"Nesse caso, a diferença é que Furlan é da indústria e há uma possibilidade de maior espaço para dizer o que precisa ser feito", diz Pio Gavazzi, diretor da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
Para Odair Abate, economista-chefe do Lloyds TSB, a pressão será crescente e contínua em torno do encaminhamento ao Congresso da proposta de reforma previdenciária, pelo menos, até o fim do primeiro semestre. Uma prova de que esse é um debate delicado já foi dado. Na última semana, servidores públicos deram o tom da conversa.
Representantes de entidades do funcionalismo público dizem que vêem com ressalvas a reforma da Previdência, no que diz respeito à unificação dos sistemas (com regras iguais para todos os trabalhadores públicos e privados). E ao estabelecimento de um teto comum para as aposentadorias dos setores público e privado -a proposta inicial do governo Lula.
Como os servidores não têm um teto para as contribuições como os trabalhadores do setor privado, a questão é saber logo se o valor da contribuição também será unificado, segundo o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social, Wladimir Nepomuceno.
Para o economista Odair Abate, entretanto, a lua-de-mel do governo com o setor privado e o mercado tem validade expirada por outras razões. "As questões internacionais, como a crise na Venezuela e a alta na cotação do petróleo, nos atingem diretamente e têm efeito imediato no bolso do brasileiro. E ainda há a questão do acordo com o FMI. Haverá o primeiro teste da equipe econômica em fevereiro, com a reunião do novo governo com o Fundo."
Ainda existem outras medidas em estudo, confirmadas pelo governo para análise relâmpago, nos três primeiros meses de governo. São elas: tentar mudar o cálculo das tarifas de luz e telefone, que deverão pressionar a inflação em 2003. E negociar com os líderes do MST (Movimento dos Sem Terra), que não darão trégua ao governo Lula no início de 2003.



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