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Salários em alta alimentam a inflação
Aumento real é obtido em 83,5% das negociações no primeiro semestre, e economistas temem impacto nos preços
Preocupação é que reajustes
ajudem a manter demanda
aquecida e elevem custo das
empresas; percentual de
ganho é inferior ao de 2007
CLAUDIA ROLLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Apesar da alta da inflação, os
trabalhadores conseguiram obter aumento real na maior parte dos acordos salariais negociados no primeiro semestre.
A concessão de ganhos reais
no momento em que a inflação
sobe com mais força divide a
opinião de economistas e especialistas em mercado de trabalho. Enquanto parte se preocupa por acreditar que o ganho
real pressiona a inflação no futuro, parte defende que o aumento subiu em ritmo inferior
à produtividade das empresas.
O aumento real foi obtido em
83,5% de 91 negociações feitas
em 16 Estados por categorias
profissionais com data-base
entre janeiro e maio, segundo
levantamento da Folha com
sindicatos e centrais sindicais.
Os ganhos se concentram,
em sua maior parte, no intervalo até 1% acima da inflação medida pelo INPC do IBGE (indicador mais usado nas negociações e que serve para reajustar
o salário mínimo). Entre os
acordos que superaram a inflação, o percentual de aumento
real é inferior ao concedido em
2007, quando ficaram de 1,01%
a 2% acima do INPC.
O Dieese prepara para agosto
a divulgação de estudo nacional sobre a concessão de reajustes salariais, mas confirma
já ter verificado, nas negociações de janeiro a maio, as tendências apontadas no levantamento da Folha.
Se a inflação persistir elevada neste semestre, as negociações tendem a ficar mais difíceis. Sindicalistas dizem não
abrir mão de repor a aceleração
dos preços nos salários e não
descartam paralisações.
Na previsão do Dieese, a proporção de acordos com reajustes superiores ao INPC deve se
reduzir em conseqüência da alta dos juros e da inflação.
Há dois meses, a Diretoria de
Política Econômica do Banco
Central ressaltou que, em um
cenário de crescimento, o comportamento dos salários tem
impacto mais intenso na inflação por aumentar o poder de
barganha dos sindicatos. O BC
quer incluir mais informações
sobre o mercado de trabalho
nos modelos usados pelo Copom (Comitê de Política Monetária) para projetar a inflação e alterar a taxa de juros.
Para Tomás Málaga, economista-chefe do banco Itaú, como os aumentos reais concedidos estão abaixo da produtividade das empresas, os salários
não afetam, em tese, a inflação.
"Nos 12 meses encerrados
em abril, a produtividade cresceu 4,5% no setor industrial
pelos dados do IBGE, e os ganhos reais têm sido inferiores a
esse percentual. Ainda estamos
recuperando o poder de compra com um pouco de aumento
real. A reposição está coberta
pela produtividade."
O cenário no segundo semestre, diz, pode ser "outra história". "Se a pressão sobre o preço dos alimentos e do petróleo
continuar, os trabalhadores
podem lutar por reajustes ainda maiores, acima do patamar
de produtividade, para evitar a
corrosão dos salários. E isso
preocupa", diz Málaga.
O ganho real repassado aos
salários ajuda a manter a demanda aquecida, o que pode,
combinado ao aumento de custos das empresas, gerar mais
inflação, avalia José Márcio
Camargo, professor da PUC-RJ e economista da Opus Gestão de Recursos. "Como o mercado de trabalho ainda está
aquecido, com o desemprego
em queda, os trabalhadores pedem reajustes maiores para
compensar a inflação. Quando
isso ocorre, gera mais pressão
sobre os custos das empresas.
Com a demanda aquecida e o
custo aumentando, as empresas repassam os custos da folha
de pagamento para os preços, o
que realimenta a inflação."
Camargo destaca ainda que o
custo unitário do trabalho (razão entre o salário real médio e
a produtividade) tem crescido
perto de 1% ao mês na média
dos últimos seis meses. "Isso
certamente pressiona a inflação em algum momento."
Mão-de-obra escassa
Alexandre Schwartsman,
economista-chefe para América Latina do Banco Santander,
ressalta que, com a escassez de
mão-de-obra qualificada, alguns setores concedem reajustes mais expressivos para não
correrem o risco de perder os
empregados. "Quando é preciso aumentar a produção para
atender a demanda, paga-se
mais porque está faltando gente, máquina. O aumento de salário não é a causa da inflação,
mas é a forma pela qual a pressão de demanda se produz em
aumento de preços."
Para Fábio Romão, economista da LCA, os ganhos reais
não exercem pressão na intensidade que técnicos do BC acreditam. "Os aumentos reais neste ano têm sido em intervalos
inferiores aos de 2007. E o salário mínimo, que serve de parâmetro para o reajuste de quem
está na informalidade e para
categorias menos organizadas,
também teve ganho real inferior a anos anteriores." Neste
ano, o mínimo subiu 4,1% acima da inflação. Em 2007, 5,3%.
E, em 2006, 12,9%.
"Como a inflação está mais
salgada, o gasto com alimentação acaba roubando a renda
disponível para outros bens, o
que tem impacto no consumo.
Esse fator também tem de ser
considerado." Romão destaca
que o mercado de trabalho já
deu sinais de desaceleração -o
emprego formal cresce em ritmo menor que em 2007 e o rendimento médio real também
recuou em maio, diz o IBGE.
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