São Paulo, domingo, 13 de julho de 2008

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Alta dos alimentos compromete ainda mais o orçamento

Refeições na Baixada Fluminense deixam de contar com carne, e famílias economizam cortando até a compra de gás

Renda das famílias se apóia na aposentadoria dos mais velhos; esperança vem com os mais jovens, na escola ou no alistamento militar


DA SUCURSAL DO RIO

Para as mulheres que vivem no bairro pobre e quase rural de Marapicu, em Nova Iguaçu, o principal problema atualmente é a persistente alta dos preços dos alimentos, que as obriga a cortar as quantidades adquiridas e compromete o consumo.
"Comprava de 15 kg a 20 kg de arroz e 10 kg de feijão. Agora, só dá para levar 10 kg de arroz e, no máximo, 5 kg de feijão. Tive de cortar outras coisas", diz Luiza dos Santos Silva.
Ela relata que freqüentemente as refeições não contam com carne à mesa. "Só deu para comer bem quando matamos um porco no Natal passado." O bicho também era criado "à meia" com o vizinho.
Elisabeth Conceição Ferreira, 40, conta que o preço da comida aumentou tanto que falta dinheiro para o gás: "Daí, corro para a lenha [num fogão improvisado com tijolos e uma grade de metal], fazer o quê?"
No acumulado deste ano até maio, o arroz e o feijão-preto (mais consumido no Rio), itens de primeiríssima necessidade, subiram 25,75% e 46,68%, segundo o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), do IBGE. E empurraram os alimentos para cima -alta de 6,40% de janeiro a maio.
José Faustino reclama que poderia "comer melhor" se o terreno no fundo da casa não estivesse encharcado pela língua negra que também atravessa o quintal de Luiza. "Fica imprestável. Não dá para plantar nada", diz Faustino, que mora com a mulher e os dois filhos.

Mais sorte
Nesse aspecto, André Henrique Oliveira, 33, casado com Elisabeth, tem um pouco mais de sorte. No terreno mais seco e maior, cultiva pés de frutas, cana e planta eventualmente verduras. Na pequena casa de madeira, vivem com os três filhos.
Ele construía uma casa melhor, de alvenaria, mas ficou desempregado. Teve de parar a obra. A moradia ficou sem telhado. "Há sete meses, perdi o emprego. Trabalhava sem carteira numa construção, em obra grande, mas, pelo menos, tinha um dinheiro certo." Ganhava salário mínimo. Agora, consegue apenas, no máximo, R$ 400 com os bicos. O que ajuda é a renda da mulher, Elisabeth, que recebe R$ 300 para cuidar de uma criança.
Nesse cenário de pobreza crônica, a esperança muitas vezes reside nos filhos -todos os entrevistados estavam no colégio- e nos mais velhos. José Francisco de Souza Cardoso, 40, recorre ao pai aposentado: "Ajudo quando posso porque também ganho pouco, um salário mínimo só. É pouco, mas é certo", afirma Sebastião Cardoso, 68.
Já a mulher de José Francisco, Luciana de Souza Andrade, 39, aguarda com ansiedade a ida do filho Thiago, 17, para o Exército. Ela espera o soldo para reforçar o modesto orçamento da família.


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