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TRANSE GLOBAL
Alta da dívida em relação ao PIB cresce na maioria desses países e no Brasil e os sujeita a "ataques especulativos"
Crise da dívida pública atinge emergentes
ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL
Os temores de investidores estrangeiros em relação a riscos de
calote na dívida pública não se
restringem ao Brasil. Sinais de
alerta emitidos por importantes
instituições internacionais têm
colocado vários países emergentes na pauta de preocupações do
mercado.
Relatório divulgado recentemente pelo American Express
Bank chama a atenção para a explosão no endividamento dos governos desses países nos últimos
cinco anos. Na lista dos casos de
"alto risco" apontados pelo banco
figuram Brasil, Argentina, Turquia, Israel e Indonésia. A situação de outros países, como Tailândia, Índia, China, Malásia, Filipinas e Venezuela, é tida como
"vulnerável".
Segundo o banco norte-americano, que tem boa reputação nos
Estados Unidos e na Europa, aumentam as dúvidas sobre a sustentabilidade das dívidas desses
países. Em outras palavras, a instituição questiona a capacidade
que governos terão de honrar
seus compromissos, em um cenário de baixo crescimento econômico e altas taxas de juros.
Geralmente, relações muito altas entre dívida e PIB (Produto Interno Bruto) podem ser estabilizadas por meio de um esforço fiscal dos governos. Cortes severos
de gastos podem levar a superávits primários (receitas menos
despesas, sem incluir gastos com
juros) suficientemente elevados.
Com isso, governos conseguem
receita para que juros e amortizações da dívida sejam pagos.
Se esses superávits são constantes, a tendência é que a relação entre dívida e PIB se estabilize. Se,
além disso, há uma redução das
taxas de juros nesses países o ritmo de expansão do endividamento diminui e a relação entre dívida
e PIB pode até cair.
No entanto, segundo o American Express Bank, o ônus político
de cortes severos de gastos é grande demais para alguns países
emergentes, principalmente em
um cenário de crescimento econômico modesto. Além disso,
muitos deles convivem com altas
taxas de juros. Essas dificuldades
ameaçam colocar a capacidade de
pagamento da dívida em xeque.
Se essa percepção crescer no
mercado financeiro, as dívidas de
alguns países podem sofrer um
ataque especulativo. Assustados,
investidores decidem vender os
títulos da dívida externa de um
país, temendo problemas de solvência. O risco disso é que esse
movimento acabe provocando de
fato um calote, que poderia não
ter ocorrido sem o ataque.
Para alguns analistas, o Brasil
está vivendo exatamente essa situação. Os C-Bonds, principais títulos da dívida brasileira, já se
desvalorizaram 33% neste ano.
Mas economistas brasileiros garantem que os riscos de calote na
dívida brasileira são mínimos (ver
texto na página B3).
Motivos do endividamento
São três as principais causas para a explosão no endividamento
público dos países emergentes:
1) altos déficits orçamentários;
2) a substituição, em muitos
países, de câmbio fixo por flutuante abriu espaço para a forte
desvalorização de muitas moedas. Como muitos países têm parte de suas dívidas em (ou corrigidas pelo) dólar, a desvalorização
fez com que o endividamento aumentasse;
3) depois das repetidas crises
que afetaram os mercados emergentes, muitos governos partiram
para o saneamento dos sistemas
bancários de seus países, assumindo dívidas de segmentos quebrados do setor privado.
Segundo o relatório do American Express Bank, dos 20 maiores
países emergentes analisados 11
deverão encerrar 2002 com uma
relação entre dívida e PIB superior a 50%. Em outros seis países,
esse indicador tende a ultrapassar
70%. O Brasil, de acordo com estimativas do banco, faz parte da segunda lista, devendo encerrar o
ano com uma relação dívida/PIB
de 72,4%.
As preocupações refletidas pelo
American Express Bank já vinham ganhando contorno no
comportamento de investidores
estrangeiros. O índice Embi Plus,
calculado pelo JP Morgan, que
mede a percepção de risco dos
mercados emergentes, teve um
salto de 36% neste ano.
O temor em relação à capacidade de pagamento dos países
emergentes cresce principalmente porque os mercados financeiros globais passam por um momento de aversão generalizada a
risco.
Perspectivas de que a economia
mundial vai se recuperar a passos
lentos somadas a prejuízos causados por escândalos corporativos
reduziram o apetite por aplicações arriscadas. Investimentos
em mercados emergentes se enquadram nessa categoria.
O economista Otaviano Canuto, professor da USP e da Unicamp, aponta outro interessante
motivo para a preocupação de investidores estrangeiros em relação às economias emergentes. Ele
lembra que está em discussão no
FMI (Fundo Monetário Internacional) proposta da vice-diretora-gerente da instituição, Anne
Krueger, de criação de um mecanismo para reestruturação de dívidas soberanas.
A idéia de Krueger é que quando um país enfrentar problemas
de solvência sua dívida possa ser
reestruturada e que os custos
também sejam arcados pelos credores privados. Ou seja, a intenção é reduzir o ônus do FMI com
pacotes de socorro.
"A intenção do FMI é que os investidores estrangeiros pensem
bem antes de assumir riscos. Parte dos temores atuais com endividamento dos emergentes já pode
estar refletindo isso", diz Canuto.
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