|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
O NEGÓCIO DO VOTO
Investidores embolsam lucro com volatilidade dos C-Bonds
Dívida e eleições rendem
milhões em NY e Londres
SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL
A eleição presidencial no Brasil
é um grande negócio em Londres
e Nova York. Numa contabilidade modesta, pelo menos US$ 1,8
bilhão foram embolsados por investidores internacionais neste
ano, até na véspera do primeiro
turno, com a compra e venda de
C-Bonds, os títulos da dívida externa brasileira mais negociados
no mercado secundário dos papéis de mercados emergentes.
"Esse foi o tamanho da desvalorização desses papéis, do pico ao
vale das cotações", diz Paulo Possas, diretor da Eagle Capital. "Alguém perdeu e alguém ganhou
com isso. Como o lucro é dado
pelo giro diário, pode ter gente
que ganhou esse valor, sozinha."
Medir o ganho com a volatilidade desses papéis, segundo os analistas, é algo impossível. "Os resultados dessas operações são da ordem de milhões de dólares", diz
Dráusio Giacomelli, vice-presidente e especialista em mercado
de dívida de países emergentes do
JP Morgan, de Nova York.
Segundo ele, um investidor que
tenha uma carteira de US$ 50 milhões, pode ganhar, em um dia,
pelo menos US$ 1 milhão com a
oscilação dos preços. "Também
pode perder a mesma quantia se
apostar que o mercado vai numa
direção e seguir por outra."
Na última terça-feira, por exemplo, executivos de cinco importantes bancos de investimento
jantavam em um restaurante londrino e comemoravam o acerto
das suas apostas para o primeiro
turno das eleições. Eles haviam
vendido uma grande quantidade
de títulos a descoberto [sem ter o
papel", quando as cotações estavam altas, apostando que os preços cairiam com uma vitória da
oposição no primeiro turno.
Uma semana antes da votação,
quando os títulos bateram em
49% do seu valor de face, perceberam que poderia haver segundo
turno, e começaram a comprar,
para cobrir a posição vendida. "É
nesse momento, da compra na
baixa, que esse tipo de investidor
realiza seu lucro", explica Raphael
Kassin, que administra um fundo
off-shore de mercados emergentes do ABN-Amro, em Londres.
Já na segunda-feira, terminada a
contagem dos votos no Brasil,
aqueles bancos voltaram a vender
C-Bonds a descoberto, com a cotação no pico. E diziam-se prontos para novos ganhos no segundo turno, se houver default [calote na dívida" no novo governo.
Esses cinco bancos não estão
sós. A maioria dos hedge funds e
traders (operadores que atuam
para bancos) que operam nesse
mercado estão apostando no pior
cenário para o país, após a eleição,
segundo operadores ouvidos pela
Folha. Ao longo da semana, eles
não se cansaram de apregoar isso,
enquanto os preços dos C-Bonds
despencavam fechando na sexta-feira a 50% do seu valor.
Mercado
As análises pessimistas sobre os
destinos do país após a eleição,
que circulam no mercado internacional, baseiam-se na fragilidade real da economia brasileira:
sua eterna dependência de recursos externos - que minguaram- para financiar o déficit do
balanço de pagamentos.
Acreditam os agentes desse
mercado que o novo governo terá
muita dificuldade em retomar linhas de financiamento externo, e
acabará sem condições de pagar a
dívida interna e a externa. "Se isso
ocorrer, os preços dos papéis despencarão e quem está "vendido"
poderá comprar para cobrir a posição, realizando gordos lucros",
diz Possas.
Mas, em 98, quando Fernando
Henrique Cardoso disputou em
"pole position" a eleição, vencendo no primeiro turno -e não se
falava em moratória- os títulos
tiveram intensa volatilidade, semelhante à atual. Os C-Bonds foram desvalorizados em 28,71%
naquele ano, considerando-se a
cotação mais alta registrada e a da
véspera do primeiro turno.
Agora, a perda de valor dos papéis atingiu 33,98%, usando-se os
mesmos critérios (leia quadro).
"Em 98, os C-Bonds sofriam os
efeitos da crise da Rússia, que deteriorou o valor dos ativos de todos os emergentes", diz Giacomelli. O Brasil se contorcia ante a
iminência de uma crise cambial,
que provocava a saída de capitais
e o encolhimento das reservas internacionais do país. A eleição era
a referência para a mudança da
política cambial. Era o risco FHC.
Texto Anterior: Luís Nassif: O "Tico-tico no Fubá" Próximo Texto: Saiba mais: Volume diário de negócios chega a US$ 500 milhões Índice
|