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ARTIGO
Como persuadir o Japão a curar sua economia
MARTIN WOLF
DO "FINANCIAL TIMES"
O Banco do Japão é mestre
em disputas burocráticas.
Mas a realização de Masaru Hayama, o presidente do banco central, ao derrubar Hakuo Yanagisawa, que presidia a Agência de
Serviços Financeiros do governo
japonês, é uma tremenda vitória
mesmo sob esses elevados padrões. Muitos no país vêm tratando essa vitória com a indicação,
na semana passada, de Heizo Takenaka, o ministro da Economia,
para o comando da agência, como
um ponto decisivo na batalha pela
recuperação do país. Eles estão errados. Trata-se apenas de uma pequena escaramuça em uma guerra que mal começou.
Os observadores informados
vêm argumentando já há muito
tempo que uma sensação de crise
é ingrediente essencial para que
surja uma cura para a doença japonesa. E sob esses padrões, Takenaka já provou ser um sucesso.
Sua declaração de que nenhuma
empresa e nenhum banco eram
"grandes demais para falir" deflagrou uma onda de venda de
ações.
Em seu ponto mais baixo, na segunda-feira, o índice Nikkei da
Bolsa de Valores de Tóquio atingiu níveis vistos pela última vez
no terceiro trimestre de 1983, 78%
abaixo de seu pico, em dezembro
de 1989. Mas uma crise, se bem
que necessária, está longe de ser
suficiente. É preciso também que
os remédios certos sejam escolhidos e aplicados.
Que algo precisa ser feito não
está em discussão. Até mesmo as
estimativas oficiais calculam a
proporção de maus empréstimos
nas carteiras dos bancos do país
como equivalente a cerca de 8%
do PIB (Produto Nacional Bruto).
O PIB nominal japonês caiu 5%
desde o quarto trimestre de 1997.
Ao longo dos últimos seis anos,
até o segundo trimestre deste ano,
a economia evoluiu apenas 3%
em termos reais. A dívida pública
bruta deve atingir 155% do PIB
neste ano. A dívida pública líquida aumentou de 22% do PIB em
1996 para a previsão de 74% ao final deste ano.
Economia
Uma cura de longo prazo para
essa doença é desesperadamente
necessária. A questão é: o que pode funcionar? A resposta, em nível conceitual, é que o sucesso requer que os japoneses economizem proporção menor de sua renda do que poupam atualmente ou
invistam mais em casa e no exterior.
O setor privado japonês tem
economizado, sistematicamente,
o equivalente a 25% do PIB
-proporção muito superior à
dos demais países de renda elevada. Nos anos da "bolha", o investimento doméstico privado absorvia quase toda essa poupança.
De lá para cá, o nível de investimento privado caiu. Em 2002, ele
será de 17% do PIB. O aumento
no superávit de poupança do setor privado em relação ao investimento, de uma média de 1,6% do
PIB entre 1986 e 1993 para os 8,3%
do PIB previstos para este ano, foi
absorvido por um governo tomando mais empréstimos. O superávit de poupança do setor privado e o aumento na captação do
governo são os dois lados da mesma moeda. Enquanto isso, o investimento líquido do país no exterior se manteve constante como
proporção do PIB.
Diante desse pano de fundo, suponham que fossem iniciadas reformas estruturais radicais e um
programa de desregulamentação
(como o primeiro-ministro Junichiro Koizumi prometeu, sem
cumprir). As empresas passariam
a ter de atender a critérios ocidentais de lucratividade. O resultado
seria uma imensa queda adicional
nos investimentos.
Capital e produção
Pode-se prever essa consequência por três motivos: o setor privado japonês ainda investe pesadamente, usa um volume imenso de
capital por unidade de produção e
sua lucratividade é medíocre.
Surpreendentemente, o investimento privado japonês responde
por proporção maior do PIB que
o dos Estados Unidos, ainda que
este último tenha obtido ritmo de
crescimento pelo menos três vezes superior do começo dos anos
90 em diante.
De acordo com Andrew Smithers, da Smithers & Co., de Londres, a relação entre capital e produção no setor corporativo não-financeiro japonês é cerca de dois
terços mais alta do que nos Estados Unidos. Além disso, assim
que levamos em conta a depreciação subestimada dos inchados
ativos corporativos japoneses e o
impacto da deflação sobre o valor
real de sua dívida, percebemos
que o setor corporativo japonês
oferece, em termos agregados, retorno negativo sobre o capital.
Reformas estruturais
Trata-se de um quadro com sérias implicações. Se os Estados
Unidos estiverem investindo
mais ou menos o total correto para uma economia competitiva
com força de trabalho crescente, o
Japão provavelmente está investindo em excesso, de talvez até 4%
a 5% do seu PIB. A segunda implicação é que uma imensa reavaliação negativa é necessária para trazer os balanços das empresas de
volta ao azul.
Smithers argumenta que seria
necessário reduzir os passivos
corporativos em cerca de 25% do
PIB. Quase toda essa soma teria
de ser coberta pelos contribuintes. Uma redução como essa seria
altamente desejável. Emergeria
um sistema bancário novo e substancialmente menor. Mas não
existe razão para esperar um influxo de novos empréstimos depois dela. Se existissem muitas
oportunidades para novos empréstimos lucrativos, alguém
-possivelmente algum estrangeiro- já as teria aproveitado
nos 12 anos que se passaram. E
além disso, como argumentei, o
investimento está alto demais -e
não baixo demais.
Assim, nem reformas estruturais nem a redução da dívida corporativa e a recapitalização do sistema bancário devolverão o crescimento sustentado ao Japão. O
que é preciso, em lugar disso, são
políticas que enfrentem o legado
de erros passados e preparem
uma plataforma para crescimento
sustentado nos anos vindouros.
A eliminação do legado do passado requer uma reestruturação
de balanços e o fim da deflação. Se
o governo considerar politicamente impossível o financiamento direto da reestruturação, a solução é a inflação. De qualquer
forma, o Banco do Japão precisa
agir, de forma ortodoxa ou heterodoxa, para criar uma expectativa de inflação positiva. Existem
muitas maneiras de consegui-lo.
Se o banco central não agir, o Ministério das Finanças deveria monetizar sua dívida, tomando dinheiro emprestado do sistema financeiro.
Mas a estabilidade nos anos vindouros quase certamente exigiria,
também, um aumento no superávit em conta corrente, para absorver o superávit de poupança de
que o país dispõe agora. No começo do século 20, o superávit da
conta corrente do Reino Unido
chegou a um pico de 9% do PIB.
Essa é a espécie de resultado que
esse país rico e em processo de envelhecimento deveria estar gerando agora.
Mais investimento
Como pode o Japão atingir essa
meta? Uma solução vinda do setor público seria a combinação de
um programa de consolidação
fiscal confiável, em médio prazo,
com um maciço relaxamento da
política monetária. Uma solução
do setor privado, se bem que exigindo acomodação monetária, seria fazer com que os japoneses
compreendessem que acumular
riqueza hipotética em casa faz
pouco sentido. Se, no final de
1989, eles tivessem investido na
Bolsa dos Estados Unidos, em lugar de em Tóquio, eles teriam se
saído em média oito vezes melhor, em termos de ienes, do que
se saíram de fato -e isso levando
em conta as recentes quedas das
ações no mercado norte-americano.
Porque conservam seu dinheiro
no país, os japoneses estão, na
melhor das hipóteses, investindo
em uma economia com más perspectivas. Na pior, estão acumulando promissórias que jamais
poderão resgatar contra eles mesmos e seus filhos. O Japão precisa
de maior investimento líquido no
exterior e de um superávit maior
em conta corrente. Se eles não
surgirem, a reforma estrutural e a
reestruturação dos bancos não
conseguirão propiciar a cura para
os males japoneses.
Tradução de Paulo Migliacci
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