São Paulo, domingo, 14 de julho de 2002

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CONTAS EXTERNAS

Queda de investimentos, que já era de 8,2% até maio, seria ainda maior, não fossem recursos desses países

Holanda e Cayman investem mais no Brasil

ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL

Houve uma movimentada dança de cadeiras entre os principais países que investem no Brasil, neste ano. O volume de recursos trazidos por investidores importantes, como Estados Unidos e Espanha, despencou. Isso abriu espaço para Holanda e Ilhas Cayman -cujas aplicações no Brasil aumentaram- assumirem a liderança entre os maiores investidores estrangeiros diretos no país.
A queda de investimentos diretos para o Brasil -que já era de 8,2% até maio passado em relação ao mesmo período de 2001- seria ainda maior se não fosse o aumento expressivo de recursos enviados por países como Holanda e Ilhas Cayman.
Os dois países já vinham ganhando importância entre os principais investidores estrangeiros na economia brasileira nos últimos anos. Agora, mesmo com a crise econômica, intensificaram ainda mais o ritmo de aplicações no país neste ano. O volume de investimentos de Holanda e Ilhas Cayman no Brasil aumentou, respectivamente, 112% e 70,6% entre janeiro e maio de 2002, segundo dados do Banco Central.
Segundo Antonio Corrêa de Lacerda, presidente da Sobeet (Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e Globalização), no caso da Holanda, o incremento de investimentos no Brasil tem três explicações.
"A Holanda está bem economicamente, começou a investir recentemente no ramo de supermercados no Brasil e sempre teve tradição de investimentos no país", disse Lacerda.
Nos últimos anos, empresas holandesas fizeram investimentos em importantes grupos brasileiros, como o Banco Real e a rede de supermercados Bom Preço.
Já o fluxo de investimentos cada vez maior vindo das Ilhas Cayman, famoso paraíso fiscal, possui duas causas principais, segundo analistas. A primeira delas são as vantagens fiscais.
"Empresas do mundo todo abrem filiais nas Ilhas Cayman e em outros paraísos fiscais e fazem seus investimentos de lá porque pagam menos impostos", explica Renato Bauman, economista-chefe da Cepal no Brasil.
Neste caso, o país de origem da empresa é quem perde receita com impostos, segundo analistas.
Outra explicação para o aumento de investimentos vindos das Ilhas Cayman é um movimento de repatriação de recursos de brasileiros. "Alguns investidores podem estar optando por trazer de volta os recursos em dólares que têm em paraísos fiscais para se beneficiar da desvalorização do real", diz a economista Virene Matesco, da FGV (Fundação Getúlio Vargas).
A percepção de Virene é compartilhada por Marcelo Cypriano, economista do BankBoston. Segundo Cypriano, os investimentos das Ilhas Cayman podem ser, na verdade, empréstimos de companhias de lá para filiais no Brasil. O destino dos recursos provavelmente é o pagamento de dívidas aqui. "Se esse capital estiver entrando para abater dívidas nem chega a ter efeito sobre a economia real. É uma operação contábil", afirma Cypriano.
O mapa correto do destino de investimentos estrangeiros diretos no Brasil está nas mãos do Banco Central, que controla de perto esses fluxos. Mas, procurada pela Folha, a instituição preferiu não se manifestar.

Retração
Apesar do maior fluxo de recursos vindos de alguns países, o movimento de retração tem pesado mais na conta global de investimentos estrangeiros diretos no Brasil. O volume de recursos aplicados no país por Estados Unidos e Espanha, por exemplo, caiu, respectivamente, 45,8% e 85,7%, nos primeiros cinco meses de 2002 em comparação com o mesmo período do ano passado. Em 2001, esses dois países ocupavam o primeiro e segundo lugar na lista de maiores investidores no Brasil.
"Muitas empresas estrangeiras perderam valor nas Bolsas pelo mundo. Isso tem afetado diretamente o fluxo de investimentos, principalmente para países emergentes como o Brasil", diz Octavio de Barros, economista-chefe do BBV Banco.
De acordo com Virene Matesco, os EUA são um investidor tradicional no Brasil. Com a desaceleração econômica nos dois países, é natural que haja redução no volume de recursos vindos de lá.
A crise na Argentina também contribuiu para a redução de investimentos no Brasil e no resto da América Latina. As empresas espanholas, por exemplo, amargaram vultosos prejuízos no país vizinho e, por isso, reduziram suas aplicações na região.
Dados do BBV mostram que a queda de investimentos diretos em outros países da América Latina também tem sido bastante severa. Até março deste ano, o fluxo de investimento direto para países como México (-24%), Venezuela (-62%) e Chile (-83%) havia despencado.
No caso do Brasil, os recursos de investimentos diretos vindos de fora são importantes porque, além de representarem uma aposta de longo prazo na economia, ajudam a financiar o déficit que o país apresenta em suas contas externas. Neste ano, estima-se que o fluxo de investimentos diretos será de US$ 16 bilhões, suficiente para cobrir cerca de 80% do déficit em conta corrente do país.


Colaborou Georgia Nascimento, da Reportagem Local

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