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AVIAÇÃO
Documento interno aponta medidas tomadas pelo Estado, desde o período militar, para explicar o endividamento
Governo é o culpado pela crise, diz Varig
ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO
Mergulhada em sua pior crise, a
Varig culpa os governos dos últimos 20 anos por seus problemas.
Um documento interno da companhia, assinado pelo conselheiro
de administração Harro Fouquet,
revela que os administradores e o
acionista controlador -a Fundação Ruben Berta- não se vêem
como responsáveis pela situação
de insolvência da empresa, que
desde 2000 apresenta patrimônio
líquido negativo.
De 1990 para cá, a Varig só apresentou lucro duas vezes: em 1994
(US$ 202 milhões) e em 1997 (US$
25 milhões). O último balanço, referente ao primeiro semestre,
mostra patrimônio líquido negativo de R$ 1,5 bilhão (US$ 555 milhões pela cotação média do semestre). Significa que os bens não
cobrem as dívidas e que a empresa, tecnicamente, é dos credores.
Como a maior companhia aérea
brasileira chegou a tal estado? O
documento de Harro Fouquet dá
a versão da Varig, mas só elenca
fatores externos à empresa.
Ele começa pelo governo João
Figueiredo (1979-85). Diz que a
moratória do Brasil, em 1982, teria impedido a obtenção de financiamento nos EUA para cinco
"jumbos" (747-300). Segundo o
conselheiro, as autoridades da
época autorizaram a companhia a
buscar crédito no Japão. Com a
valorização do iene, o custo das
aeronaves duplicou em dólar. Em
1999, quando os aviões foram desativados e devolvidos à Boeing,
havia dívida de US$ 250 milhões.
A queixa maior é com os governos José Sarney (1985-90) e Fernando Collor (1990-92). A empresa atribui a eles uma perda de receita de US$ 986 milhões, por reajuste insuficiente das tarifas dos
vôos domésticos, entre 1986,
quando começou o Plano Cruzado, e 1991. O setor como um todo
alega ter perdido US$ 2,2 bilhões,
e há uma ação de indenização
contra a União em curso no STJ
(Superior Tribunal de Justiça).
Diz a Varig que seu desequilíbrio financeiro começou com a
contenção das tarifas e foi agravado por outros fatores igualmente
de responsabilidade do governo,
como impostos, combustíveis e
política de concessão de rotas.
O documento diz que as companhias aéreas brasileiras pagam
35% de impostos, enquanto suas
congêneres européias pagam
16%, e as norte-americanas, 7,5%.
O querosene de aviação, que representa 20% dos custos, aumentou 834,8% desde janeiro de 99.
As tarifas aeroportuárias são
outro foco de reclamação. O Aeroporto Internacional de São Paulo é apontado como o terceiro
mais caro, entre os 50 principais
aeroportos do mundo, só perdendo para os de Osaka e Tóquio.
Guerra de mercado
Até 1983, a Varig, que absorvera
a Cruzeiro do Sul em 1975, tinha
monopólio dos vôos internacionais. Começou a perder o privilégio quando a Transbrasil e a Vasp
foram autorizadas a fazer vôos
não regulares. Em 1987, o Ministério da Aeronáutica abriu concessão de linhas a outras companhias, mas manteve salvaguarda
para as concessões da Varig.
Mas foi em 1992 que aconteceu
o que a empresa chama de "reviravolta total". O governo passou a
permitir que mais de uma empresa brasileira voasse para o mesmo
destino no exterior. A Transbrasil
e a Vasp compraram aviões maiores, ofereceram tarifas promocionais e passaram a voar para a
América do Norte, Europa e Ásia.
Rapidamente, a Varig perdeu um
terço do mercado para elas, pois
não estava preparada para enfrentar a concorrência.
Com a diversificação de empresas brasileiras voando para o exterior, grandes companhias estrangeiras tiveram acesso ao mercado
brasileiro, baseadas no princípio
da reciprocidade.
A desvalorização cambial ocorrida em 1999 levou a Vasp a encerrar suas operações internacionais
em 2000. No ano seguinte, o mesmo aconteceu com a Transbrasil.
A desistência das empresas brasileiras só fortaleceu as estrangeiras. A rota Brasil-Estados Unidos
tem hoje duas companhias brasileiras (Varig e TAM) competindo
com quatro norte-americanas.
A Varig sustenta que, mesmo
fragilizada, mantém 87% da fatia
de vôos internacionais que restou
para as empresas brasileiras e
39% dos serviços domésticos.
Afirma possuir índice de aproveitamento (relação passageiro/quilômetro pago) superior aos das
outras nacionais: 67% contra
56%, na média, e que sua rentabilidade nos vôos, embora negativa,
é superior às das concorrentes
brasileiras.
Embora o presidente da Varig,
Manuel Guedes, afirme que não
quer dinheiro do governo, o documento defende que a companhia, líder na América do Sul, seja
preservada para impedir a absorção do tráfego internacional pelas
companhias estrangeiras. A ausência da Varig no mercado internacional significaria a perda de
divisas de US$ 2 bilhões por ano
para o país, diz a empresa.
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