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Nova lei para internet pode favorecer banco
Para advogados e técnicos, bancos se livram de indenização por fraudes com nova legislação para crimes cibernéticos
Provedores terão de arcar com prejuízos de R$ 500 mi no lugar dos bancos se não identificarem internautas que praticam os golpes
JULIO WIZIACK
GUSTAVO VILLAS BOAS
DA REPORTAGEM LOCAL
Já aprovado pelo Senado e
em tramitação na Câmara, o
projeto de lei do senador
Eduardo Azeredo (PSDB-MG)
que definirá os crimes praticados na internet ou em qualquer
ambiente eletrônico favorecerá
as instituições financeiras, segundo afirmam representantes
do setor de internet, advogados, consultores e até técnicos
da Febraban, a federação que
representa os bancos.
Oficialmente, a Febraban
não comenta o assunto. Entre
os congressistas, é consenso
que a instituição foi a mais ativa
nas discussões. Os bancos pagam por ano cerca de R$ 500
milhões às vítimas de fraudes
na rede, clonagem de cartões e
golpes em caixas automáticos.
Hoje eles acabam pagando a
conta porque, pelo código de
defesa do consumidor, o cliente
não é obrigado a provar que sofreu um golpe. Esse papel é dos
bancos. Para eles, é mais barato
ressarcir o correntista do que
investigar a fraude.
Muitas vezes, nem é possível
chegar aos criminosos porque
os provedores de internet não
costumam manter por muito
tempo registros de acesso, como o horário de entrada e saída.
O projeto determina que empresas de todos os portes e provedores de internet terão de armazenar esses registros por
três anos. Quem não cumprir
com essa obrigação pagará
multa que vai de R$ 2.000 a R$
100 mil, independentemente
do ressarcimento por perdas e
danos às vítimas de golpes.
Advogados consultados pela
Folha afirmam que os provedores podem ainda ter de arcar
com a indenização aos clientes
lesados no lugar dos bancos.
"Há chance de que se inverta
o ônus da prova", diz Alexandre
Atheniense, presidente da Comissão de Tecnologia da Informação do Conselho Federal da
OAB. "O texto deixa uma brecha para essa interpretação."
Outro ponto polêmico é o
que define a segurança dos dados armazenados, a auditoria a
que eles serão submetidos e a
autoridade competente pela
auditoria. De acordo com o projeto, esses temas serão definidos por meio de decreto presidencial, sem passar pelos trâmites do Congresso.
É o que diz Pedro Rezende,
professor da UnB (Universidade de Brasília). "Existe um risco
de que volte à tona a questão da
certificação dos internautas",
afirma Rezende, que acompanha o projeto desde o início.
A certificação sempre foi defendida pelos bancos. É como
uma chave que funciona como
"identidade digital" toda vez
que for conectada às redes de
dados, incluindo a internet. O
problema é que, pelo contrato
assinado ao adquirir essa
"identidade", a responsabilidade passa a ser do titular do certificado, mesmo que ele seja vítima de fraudes.
Advogados, representantes
do setor de internet e especialistas que acompanharam as
reuniões com Azeredo consideram que empresas de segurança de dados e certificadoras digitais serão beneficiadas futuramente com a lei.
A Scopus, que cuida da infra-estrutura de "internet banking" do Bradesco, incluindo a
certificação, seria uma das beneficiadas. Nas eleições de
2002, a empresa -que pertence ao Bradesco- doou R$ 150
mil à campanha de Azeredo. O
senador nega qualquer favorecimento aos bancos na nova lei
(leia texto à pág. B12).
Os críticos não condenam a
natureza do projeto. Segundo
Eduardo Parajo, presidente da
Abranet, a associação dos provedores, a tipificação dos crimes é necessária. "O armazenamento dos dados colabora em
eventuais investigações", diz.
"O que surpreende é que isso
tenha de valer para qualquer
rede de computadores."
Para Rezende, da UnB, esse é
um dos motivos da polêmica.
"O projeto se vale de argumentos pertinentes, como o fornecimento de dados em casos de
investigação de crimes para favorecer os bancos", diz.
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