São Paulo, quarta-feira, 18 de junho de 2008

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PAULO RABELLO DE CASTRO

Brasil e Japão: o próximo centenário


A semente lançada em 1908 aponta para um caminho de retorno em direção ao Japão, que deve interessar ao Brasil

A EVOCAÇÃO da primeira leva de imigrantes japoneses aportando aqui, cem anos atrás, nos provoca um balanço social desse profundo e fecundo relacionamento. Contudo o mais interessante seria perguntar: como poderíamos construir a relação entre Brasil e Japão dos próximos cem anos?
Já se fala numa "era pós-americana". Mas como serão os arranjos políticos entre países e regiões nas próximas décadas? O Brasil caminha na onda dos Brics, sigla inventada por economistas da corretora Goldman Sachs para ressaltar a novidade dos crescimentos notáveis que se projetam desses quatro países-gigantes, até 2050: China (PIB de US$ 44 trilhões, a preços de 2003), Índia (US$ 27,8 trilhões), Rússia (US$ 5,9 trilhões) e Brasil (US$ 6,1 trilhões).
Torcida brasileira à parte, são nítidas as diferenças projetadas entre os dois primeiros e os dois últimos países. Se os economistas da GS não estiverem muito equivocados, o mundo até 2050 se tornará crescentemente desigual, a favor de chineses, indianos, norte-americanos e europeus, em detrimento de brasileiros (PIB igual a uma quinta, até uma décima parte do tamanho daquelas grandes nações ou blocos). E também em detrimento de japoneses, cujo PIB projetado será -por causa do envelhecimento de sua população- não superior a US$ 6,6 trilhões, regulando com o do Brasil.
A geografia política mundial caminhará, não para Brics, mas para blocos, tanto os de afinidade (leia-se, complementaridade) econômica como também cultural, religiosa ou étnica, ou um pouco de cada coisa. E com quem se casará o Brasil, esse solteirão inveterado que mal conduz, no momento, um namoro forte com seus vizinhos sul-americanos?
O anúncio da União Sul-Americana é um grande passo, mas nos faltam injeções maciças de capital e, principalmente, de tecnologias. O Japão é uma nação extremamente complementar à brasileira. É intensivo em gente educada, em técnicas sofisticadas, em capital financeiro e em cultivo de sutis formas de beleza, enquanto pobre, relativamente ao Brasil, em território e recursos naturais -como água, petróleo e energia verde- e também em agricultura (que os próprios "nisseis" ajudaram a expandir aqui!).
Ambos os países buscam a conservação do ambiente natural (vide o Protocolo de Kyoto) e almejam a paz e o comércio entre as nações como forma de progresso de todos.
A soma dos "modestos" US$ 6 trilhões previstos pela GS para os PIBs do Brasil e do Japão poderiam bem se transformar, na soma, em US$ 15 trilhões a US$ 18 trilhões se houvesse a integração mais determinada e planejada dos interesses nacionais de cada um, no horizonte de 2050.
O mundo caminha para um arranjo de blocos de nações. Alguns serão blocos "naturais", com seus vizinhos mais próximos: os EUA (com o Nafta), a Eurolândia (talvez com a Rússia), a China e seu vasto entorno, e a Índia (com suas espalhadas etnias pela Ásia). Os dois solteirões, no entanto, Brasil (com a América do Sul) e Japão, terão sua posição estratégica cada vez mais estreitada, se não buscarem liderar ou co-liderar uma aliança autônoma e capaz de alavancar o que cada um tem de melhor.
A semente lançada pelos imigrantes do navio Kasato Maru, em 18 de junho de 1908, nos aponta um caminho de retorno do Brasil em direção ao Japão, que muito nos deveria interessar percorrer neste século. Que meu neto Haru Ogata tenha a sorte de ver um bloco América do Sul-Nippon em pleno funcionamento. Seria um dos cinco grandes blocos da era pós-americana.


PAULO RABELLO DE CASTRO , 59, doutor em economia pela Universidade de Chicago (EUA), é vice-presidente do Instituto Atlântico e chairman da SR Rating, classificadora de riscos. Preside também a RC Consultores, consultoria econômica, e o Conselho de Planejamento Estratégico da Fecomercio SP. Escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.

paulo@rcconsultores.com.br


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