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IMPÉRIO ABATIDO
Buraco nas contas externas e internas do país enfraquece dólar e coloca em risco a estabilidade mundial
Déficits gêmeos ameaçam retomada dos EUA
CÍNTIA CARDOSO
DE NOVA YORK
A despeito dos sinais de crescimento da economia norte-americana, a disparada dos chamados
déficits gêmeos, o buraco nas
contas externas e internas do país,
ameaça a estabilidade dessa recuperação e, como consequência, de
toda a economia mundial. O efeito pode desvalorizar o dólar e
provocar uma alta nos juros.
O déficit orçamentário do ano
fiscal de 2003 deve ficar acima de
US$ 450 bilhões, um recorde em
termos nominais. Para o próximo
ano, a estimativa é que ele atinja
US$ 500 bilhões, perto de 5% do
PIB (Produto Interno Bruto).
O déficit em conta corrente, nas
transações do país com o exterior,
acompanha essa tendência. Neste
ano, deve representar 5% do PIB.
No ano que vem, a fatia deverá subir para 5,2%. Para os analistas, o
alarme começa a soar quando o
buraco passa de 3% do PIB.
Locomotiva da economia mundial, os EUA pagam o preço de serem o único país central a conseguir imprimir um ritmo forte de
crescimento. No acumulado do
ano, a expectativa é que o PIB
americano tenha uma expansão
de 4%, bem acima da virtual estagnação européia.
A retomada dos EUA em si é
uma boa notícia, mas, como os
seus principais parceiros econômicos patinam, os americanos
terminam por acumular um
grande desequilíbrio na balança
comercial.
"A demanda interna nos EUA
cresce, as importações crescem,
mas as exportações não acompanham. Se a situação externa se
mantiver assim, com as economias da Europa e do Japão paradas, o déficit comercial só tende a
crescer", avalia Victor Zarnowitz,
do NBER (sigla em inglês para
Serviço Nacional de Pesquisa
Econômica).
A organização, que reúne renomados economistas do país, determina a duração dos ciclos econômicos norte-americanos.
A manutenção dos desequilíbrios em conta corrente torna o
país dependente de investimentos
estrangeiros a fim de cobrir esse
buraco nas contas. A estimativa é
a de que sejam necessários US$
500 bilhões ao ano. Quando os recursos não entram, o dólar cai.
A solução mais óbvia e imediata
para corrigir o desequilíbrio seria
permitir a desvalorização do dólar. A saída, porém, esconde armadilhas para toda a economia
mundial.
"O governo Bush adota a retórica de que deseja um dólar forte,
mas, na prática, está contente
com o enfraquecimento da moeda. Só que esse é um jogo perigoso. Primeiro porque um dólar
muito fraco pode levar a uma recessão mundial. Segundo porque,
se a cotação da moeda cair drasticamente, os investidores vão perder o interesse nos EUA. Isso vai
tornar o déficit mais difícil de financiar", diz Michael Carey, vice-presidente do Crédit Lyonnais.
Para o economista Nigel Gault,
da consultoria Global Insight, a
chave para resolver o descompasso da balança comercial dos EUA
está no crescimento da eurolândia e do Japão.
"Só a desvalorização não resolve. Os outros países também têm
que crescer. Internamente, o que
o governo dos EUA pode fazer é
tentar refrear a demanda interna
com um aumento de impostos,
por exemplo", afirma Gault.
A adoção do remédio amargo,
porém, não teria uma boa receptividade política. "Estamos entrando na corrida presidencial. Ninguém, especialmente o presidente
que quer se reeleger, vai tomar
medidas que podem ser impopulares", pondera Gault.
Dependência externa
Segundo a Oxford Economic
Forecast, braço de pesquisas econômicas da Universidade de Oxford, o prognóstico é o de um
crescimento acelerado do déficit
público. "O aumento das despesas com segurança e com a reconstrução do Iraque e do Afeganistão vai perdurar por muitos
anos", diz relatório da instituição.
Não bastasse isso, o Estado
americano também terá que arcar
com o programa de cortes de impostos promovido pelo governo
George W. Bush. Fora isso, a arrecadação já estava comprometida
pela desaceleração econômica.
O aumento do déficit orçamentário cruza com o outro déficit.
Com mais gastos e menos recursos, os EUA mantêm laços de dependência forte com o capital estrangeiro para se financiar e crescer, o que pressiona o desequilíbrio em conta corrente. "Esse é
um problema de longa data, e não
há perspectiva de resolvê-lo logo", diz Zarnowitz.
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