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TIGRES RESFRIADOS
Investimentos começam a migrar para América Latina
Freada dos EUA, guerra e pneumonia debilitam Ásia
DA REPORTAGEM LOCAL
A combinação entre desaceleração econômica nos Estados
Unidos, pneumonia asiática e
guerra no Iraque tem sido um
balde de água fria para os países
emergentes da Ásia. Indicadores
econômicos da região começam a
dar sinais de enfraquecimento. E
reduções das estimativas de crescimento dos principais países
asiáticos em 2003 têm ocorrido
em cascata.
Por enquanto, os problemas
dos países emergentes da Ásia
têm contribuído para a euforia de
seus pares latino-americanos.
O fluxo de investimentos de
curto prazo que sustentava, até
recentemente, um boom nos
mercados financeiros asiáticos
começa a ser desviado para a
América Latina, principalmente
rumo ao Brasil e à Argentina.
Um sinal disso é o comportamento das Bolsas de Valores das
duas regiões. Há cerca de um ano,
a maior parte dos mercados de
ações emergentes da Ásia registravam forte valorização em dólar. Ao mesmo tempo, as Bolsas
da América Latina derretiam ou
na melhor das hipóteses estavam
no zero a zero.
Hoje ocorre o inverso. Bolsas
importantes como as de Coréia
do Sul, Hong Kong e Cingapura
acumulavam, até o último dia 15,
quedas anuais em dólar de 6,1%,
7,4% e 6,2%, respectivamente.
No mesmo período, os mercados de ações de Brasil e Argentina
subiam 21,5% e 28% em dólar.
"É bastante possível que esteja
havendo um movimento de realocação. Os investidores vão para
os mercados emergentes em busca de altos retornos. E as chances
de retorno na América Latina
agora são maiores", afirma Misham Hing, analista do Citigroup
em Nova York.
Dependência dos EUA
Dos dois lados há exceções. A
Bolsa de Valores da Tailândia, por
exemplo, ainda sustentava alta
anual de 8% em dólar até 15 de
abril. Há um ano, no entanto, esse
mesmo mercado exibia valorização bem mais forte, de 31,2%.
Já a Bolsa mexicana apresentava
modesta elevação de 1,6% em dólar neste ano até meados de abril.
Mas o fato de o mercado mexicano estar seguindo na mesma direção que o asiático está longe de
ser mera coincidência. Isso reflete
a forte dependência que os dois
mercados têm da abalada economia norte-americana.
"Os países da Ásia, como o México, têm o destino de suas exportações muito concentrado nos
EUA. No caso da Ásia, parcela significativa dos produtos com alto
valor agregado vão para o mercado americano", afirma Yusuke
Horiguchi, diretor do prestigiado
IIF (The Institute of International
Finance) e ex-diretor do Departamento de Ásia do FMI (Fundo
Monetário Internacional).
Queda das importações para os
EUA já começa a contribuir negativamente para o setor industrial
de alguns países asiáticos. É o caso
de Cingapura, onde o indicador
de produção industrial despencou de 13,5% (acumulado em 12
meses) em janeiro deste ano para
-1,4% em fevereiro passado.
Além disso, os preços mais altos
do petróleo por conta da guerra
no Iraque também chegaram a
pressionar a inflação em países
como a Coréia do Sul.
Epidemia
O IIF-assim como vários bancos que o instituto representa-
deverá reduzir sua estimativa de
crescimento para os países emergentes asiáticos de 6% para algo
em torno de 5,25% este ano.
Segundo Horiguchi, a epidemia
de pneumonia asiática -que estourou na China e em Hong Kong
no mês passado- também
ameaça as economias da região.
O principal setor afetado, nesse
caso, é o de serviços turísticos-
que respondem por algo entre 3%
e 4% do PIB (Produto Interno
Bruto) da região.
Companhias aéreas já têm acusado o golpe da forte queda no
número de passageiros. Esse é só
o primeiro estágio de uma contração que tem atingido hotéis, restaurantes e vendas no comércio.
Segunda a penúltima edição da
revista britânica "The Economist", grupos industriais afirmam que as vendas no varejo despencaram 50% desde a explosão
da pneumonia asiática.
"Os países mais afetados pela
pneumonia são Cingapura e
Hong Kong", afirma Horiguchi.
Por causa da epidemia, instituições como o Morgan Stanley e o
ING anunciaram na última semana reduções significativas nas
suas expectativas de crescimento
para a Ásia em 2003.
O principal risco, alertam analistas, é o de contágio econômico.
Os países do Sudeste asiático-
principais emergentes da região-formam um bloco econômico bastante interdependente.
A China, por exemplo, vinha
sendo responsável nos últimos
anos por um crescente número de
turistas que circulam pela região.
Com isso, há chances de que
problemas econômicos em um
país acabem redundando, por
meio de canais comerciais ou financeiros, em problemas também para seus vizinhos.
Estabilidade
O economista Paulo Leme, diretor de pesquisa para países emergentes do Goldman Sachs, argumenta que, embora um pouco
abaladas, as economias da Ásia
continuam muito fortes.
"Não acho que dá para dizer
que a situação na Ásia esteja se deteriorando. Na verdade, como um
todo, a região terá crescimento
praticamente estável este ano. E
essa estabilidade acontece com taxas de expansão ainda muito altas", diz Leme.
O país que deverá ser, segundo
o Goldman Sachs, bastante afetado pela pneumonia asiática é
Hong Kong. O banco reviu sua estimativa de expansão do país de
3% para 1,7%.
Mesmo que a desaceleração
asiática seja pequena, os problemas da região já levam analistas a
temer sua piora com sérias consequências para a economia global.
O economista Luiz Gonzaga Belluzzo, da Unicamp, lembra que
os países da Ásia são os principais
financiadores do gigantesco déficit em conta corrente (que contabiliza transações do país com o
exterior) dos EUA. O motivo que
leva os asiáticos a investirem maciçamente em ativos norte-americanos é simples: temem que a desvalorização do dólar prejudique
suas exportações.
Déficit dos EUA
Belluzzo lembra, no entanto,
que esse apetite vem caindo. O
risco disso é que, caso os EUA tenham problemas para financiar
seus gastos, a taxa de juros no país
acabe subindo para tornar o país
mais atrativo para investidores.
Horiguchi acha difícil que os
países asiáticos deixem de se esforçar para que o dólar não se desvalorize demasiadamente.
Mas isso vai depender da situação econômica da região no futuro. Por enquanto, um de seus
principais motores, a China, continua apresentando taxas expressivas de crescimento. O mesmo
não pode ser dito, no entanto, do
Japão, outro país importante para
a Ásia, cujas perspectivas econômicas pioram a cada dia.(ÉRICA FRAGA)
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