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INTERNACIONAL
Dragão chinês e o cabresto ortodoxo
GIULIANO GUANDALINI
DA REDAÇÃO
Só faltava Alan Greenspan, o oráculo maior do
mundo capitalista. Já não falta
mais. O presidente do Federal
Reserve (banco central norte-americano) afirmou na semana
passada que a China terá que
deixar sua moeda flutuar, porque não terá como manter o
câmbio fixo, atrelado ao dólar,
sem que haja um elevado desequilíbrio financeiro.
O rápido avanço chinês nos
mercados globais incomoda cada vez mais, principalmente os
países ricos, que tentam fazer o
dragão do Oriente vestir o cabresto da ortodoxia econômica.
Não há como competir com as
importações chinesas, argumentam, se o país preservar sua
moeda, o yuan, subvalorizada.
Desde 1994, a China adota
uma âncora cambial que mantém sua moeda praticamente estável em relação ao dólar. De lá
para cá, o yuan só passou por
ajustes uma única vez, durante a
crise asiática, em 1997. A estratégia é manter o yuan deliberadamente desvalorizado para que
os produtos do país sejam mais
competitivos comercialmente.
Mas a China está sob acirrada
pressão internacional, acima de
tudo dos Estados Unidos e da
União Européia, para permitir
uma apreciação do yuan. Antes
de Greenspan, o secretário do
Tesouro norte-americano, John
Snow, o secretário de Comércio,
Donald Evans, e autoridades européias, como Wim Duisenberg
(presidente do BC Europeu), já
haviam condenado a política
cambial chinesa.
Por trás da pressão, há grandes lobbies industriais. Ainda na
semana passada, senadores
americanos apresentaram uma
solicitação ao Departamento do
Tesouro para que se investigue
se a China tem "artificialmente"
enfraquecido o yuan.
"Isso está custando empregos
americanos", condenam os senadores, em carta enviada ao
Tesouro. A balança comercial
entre os dois países dá uma medida do problema. Em 2001, o
saldo ficou positivo para os chineses em US$ 28,2 bilhões. No
ano passado, a vantagem saltou
para US$ 43,3 bilhões.
Mas, se por um lado cresce o
time dos incomodados pelo dragão chinês, de outro há os grupos que correram ao país em
busca da conquista do mais novo Eldorado do globo. No ano
passado, a China ultrapassou os
EUA e se tornou o principal destino dos investimentos diretos
estrangeiros, com um total de
US$ 55 bilhões.
A China está na moda e pouco
importa se está longe de ser um
modelo democrático e de desenvolvimento (seu Índice de Desenvolvimento Humano é inferior ao brasileiro). País nenhum
cresce como a China, o que assegura bom retorno aos investimentos. No primeiro semestre,
mesmo com os efeitos adversos
da Sars (síndrome respiratória
aguda grave), a economia registrou uma expansão de 8,2%,
mesmo ainda que a demanda
estivesse reprimida nas principais economias.
Para os críticos da ortodoxia
liberal, o país se tornou paradigma de um modelo alternativo.
Gente como o Nobel de Economia Joseph Stiglitz não se cansa
de apontar o sucesso da China
diante do "fracasso" do liberalizante Consenso de Washington.
Mais uma vez, democracia parece questão menor.
Mas, apesar da grande especulação nos mercados sobre uma
possível valorização do yuan e
da pressão internacional, a China não deverá mexer no câmbio
tão cedo. Após as críticas de
Greenspan, o governo afirmou
que a estabilidade cambial não
traz benefícios apenas para o desenvolvimento local, mas contribui para o bom funcionamento de toda a economia mundial.
Ainda não será agora que o dragão se dobrará ao cabresto.
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