São Paulo, quarta-feira, 20 de agosto de 2008

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VINICIUS TORRES FREIRE

Impostos incorrigíveis e a reforma


Receita federal ainda cresce o dobro do PIB; quanto mais cresce, menos se fala em reforma tributária no governo

O DINHEIRO dos impostos continua a se acumular na arca do governo federal no dobro da velocidade do crescimento da economia -isto nas estimativas mais otimistas para o aumento do PIB. Na verdade, num ritmo algo maior. A receita federal aumentou 11,56% nos últimos 12 meses. O PIB deve crescer uns 5%, por aí.
No início do ano, alguns economistas, o próprio governo e o colunista davam o chute ponderado, digamos, ("educated guess", no eufemismo em inglês), de que a extravagância arrefeceria em meados do ano, para algo em torno de 10%. Passaram os meados do ano e nada. Ontem, o governo reafirmou a estimativa de queda no ritmo de crescimento da arrecadação, para 10%.
É verdade que o crescimento da receita parou de acelerar. Tem variado muito pouco, em torno de 11,6%, de janeiro deste ano para cá.
Em janeiro do ano passado, a arrecadação crescia ao ritmo anual de 6,6%. Em julho de 2007, a 8,9%. É provável que, com o PIB embicando ligeiramente para baixo a partir do último trimestre, o sorvedouro federal de dinheiro fique menos intenso. Em tese, ao menos.
É certo ainda que o governo pouco elevou os impostos (taxação nova ou alíquotas maiores). Houve a exceção maior do IOF, cuja arrecadação deve superar as estimativas oficiais, que eram de R$ 15 bilhões. Até julho, o IOF maior já rendeu R$ 11 bilhões.
No total, a receita federal acumulada em 12 meses até julho foi de quase R$ 681 bilhões. Enfim, o grosso do dinheiro extra se deve a crescimento econômico e mais emprego (de Imposto de Renda e Previdência). Ainda assim, é dinheiro grosso, não importa o motivo.
A persistência da extravagância da receita federal foi acompanhada do desvanecimento do debate sobre reforma tributária ou sobre qualquer outro arranjo menos ambicioso, mas menos defeituoso, da taxação.
Da parte do governo, a notícia mais recente e importante sobre o assunto foi o afastamento de Bernard Appy da cúpula do Ministério da Fazenda, faz dois meses. Appy era secretário do ministério e ali o último defensor de mudanças institucionais na economia, entre elas a reforma tributária. A notícia mais recente e menos importante foi Lula prometer à economista Maria da Conceição Tavares que a reforma sairia ainda este ano. Lula fez a promessa numa reunião de intelectuais próximos do governo. Agora, vai.
Fora do governo, a última notícia foi que a reforma empacou, como de hábito, na guerra fiscal e na disputa entre Estados grandes (São Paulo, basicamente) e o Nordeste. De resto, o PT e próximos vetaram a proposta manca do relator da reforma de talhar a contribuição patronal para o INSS sem propor receita alternativa para a Previdência.
Reforma tributária é coisa de anos, em qualquer país. Reformas amplas são quase inviáveis. Em períodos de receita exorbitante, tornam-se um pouco menos improváveis. Se o governo ou alguém tem a intenção séria de tornar o sistema tributário menos demencial, a "janela de oportunidade", como diz o clichê, ainda está aberta. Poderia ser uma mexida menor -menos tributos sobre emprego ou sobre exportadores ou que talham a renda dos mais pobres. Mas alguma coisa.

vinit@uol.com.br


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