São Paulo, quinta-feira, 21 de agosto de 2008

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VINICIUS TORRES FREIRE

As outras medalhas da China


Apesar da estagnação nos EUA, da Eurozona em crise, do preço do petróleo etc., comércio chinês ainda voa

ONDE A CHINA vai parar, se e quando? O estado atual da hipótese do dominó econômico mundial alega, contra a teoria concorrente, do "descolamento", que a crise americana começou a derrubar a segunda peça do jogo, a Eurozona. Estados Unidos e Europa compartilhavam o baque da crise de crédito e da inflação renitente. O contágio via comércio internacional seria o piparote decisivo.
A economia da Eurozona de fato encolheu no segundo trimestre, mas parece ainda difícil dizer que seja devido ao comércio. Ainda assim, os adeptos do dominó dizem que o baque europeu e a queda da demanda americana já seriam suficientes para começar a derrubar economias exportadoras no mundo dito emergente e Brics, China inclusive.
Nos jornais chineses em inglês, vários dirigentes dizem que não vão deixar a peteca cair. Nesta semana, saíram várias declarações oficiais sobre o estudo de medidas para contrabalançar o efeito do desaquecimento do comércio mundial. O objetivo seria fazer a China "crescer para dentro" (aumentar a renda dos pobres e estimular o consumo nesse país superpoupador).
Desaquecimento? A corrente de comércio da China (exportações mais importações) cresceu mais de 26% nos sete primeiros meses deste ano contra 2007. Em valor, as exportações cresceram 22,6%, embora não se acelerem. As importações continuaram crescendo, agora a 31%.
Os preços ajudaram, e as quantidades exportadas cresceram menos, decerto. Mas bons preços não são bem um sinal de crise. O dominó externo ainda não caiu sobre o comércio chinês, mesmo com alta do petróleo, EUA estagnados etc. A produção industrial deu uma desacelerada dos tempos pujantes de crescimento anualizado de mais de 20%. Mas está pela casa dos 16%.
O investimento produtivo anda pela mesma altura dos 25% de 2007 (todos os dados são de julho). Enfim, o PIB chinês cresceu ao ritmo anual de 10% no segundo trimestre (contra 11,9% em 2007).
A inflação no varejo pulou a barreira dos 8% no início do ano, mas voltou a 6,3% em julho. Há preocupação com o índice de preços no atacado, o IGP deles, que foi a 10%, maior nível em 13 anos. Mas as autoridades chinesas têm dito algo como "o pior já passou" no caso da inflação. Não haveria empecilho para medidas de estímulo do consumo.
Do último trimestre de 2007 até metade de 2008, as autoridades chinesas tomaram medidas para limitar o crédito, o influxo de capital e valorizar a moeda. Mas mudaram o tom desde então, com exceção do fluxo de dinheiro externo.
Em suma, líderes chineses em série, a começar por Hu Jintao, vão à mídia ou ao público para dizer que o aperto monetário acabou. Anteontem, um relatório do JPMorgan difundiu ainda o rumor de que viria um "pacote fiscal" de cerca de 1% do PIB para estimular a economia. O relatório fez as Bolsas da China e da Ásia em geral darem um salto da lama em que se arrastam (boatos sobre uma ajuda estatal à Bolsa de Xangai também ajudaram).
O trem da economia chinesa não está com jeito de parar de correr.
Talvez ainda bata num poste, por excesso de capacidade produtiva e empréstimos podres. Mas não agora.

vini@uol.com.br


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