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São Paulo, domingo, 21 de dezembro de 2003

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DOMÍNIO

Mais companhias conquistam mercado no exterior, mas 200 maiores do país ampliam sua participação nas vendas

Grandes empresas concentram exportações

ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL

Ano a ano cresce o número de companhias brasileiras que se arriscam no comércio exterior. Hoje, já somam 16.640. Apesar disso, também aumenta a concentração de exportações nas mãos de poucas empresas. Em 1998, 200 delas eram responsáveis por 68% das vendas externas. Em 2002, esse percentual saltara para 70,59%.
Estudo dos economistas João Alberto De Negri, diretor do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), e Jorge Arbache, da Universidade de Brasília, mostra que, no Brasil, exportação é um negócio dominado por grandes empresas.
"Os resultados revelam que, no Brasil, para exportar, é fundamental ter escala no mercado. Por isso, o surgimento de novas empresas exportadoras, geralmente menores, não consegue inverter a tendência de concentração nas mãos de poucas", diz Negri.
Dados recém-atualizados por Negri para sua tese de doutorado revelam, por exemplo, que as empresas exportadoras, em média, têm faturamento anual de R$ 64,8 milhões. O número é mais de dez vezes superior aos R$ 4,5 milhões faturados pelas firmas não-exportadoras. Apenas as empresas que vendem commodities estão fora dessa conta.
Além disso, essas grandes companhias exportadoras empregam mais gente, investem mais em treinamento e pagam melhor (leia texto nesta página).
"O Brasil é diferente de vários outros países em desenvolvimento. O mercado doméstico é muito grande e abre espaço para que as grandes empresas consigam ganhar escala, reduzir custos e, com isso, tornar-se mais competitivas no mercado externo. As pequenas têm mais dificuldade", afirma o diretor do Ipea, em Brasília.

Rotatividade
Além disso, segundo Negri, a rotatividade entre pequenas e grandes empresas brasileiras no mercado externo é grande.
Muitas começam a exportar por fatores conjunturais, como câmbio desvalorizado, mas, depois, não conseguem se manter competitivas e acabam desistindo.
No caso das grandes, ocorre o oposto. Análise feita pela Folha a partir de estatísticas do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior mostra também que há pouca mudança no ranking das maiores empresas exportadoras do país.
Das 40 empresas que constavam do ranking das maiores exportadoras brasileiras entre janeiro e outubro de 2002, apenas sete mudaram no mesmo período deste ano. As demais 33 -entre elas, gigantes como Petrobras, Embraer, Volkswagen e Sadia- se repetem no ranking.
Esse padrão de repetição -independentemente do setor, no caso da indústria- tem se mantido nos últimos cinco anos.
"No Brasil, tirando os setores que exportam commodities e, portanto, têm o preço do seu produto dado, importa muito pouco o setor industrial. São características individuais de cada empresa que vão determinar sua competitividade", diz o economista Jorge Saba Arbache, da Universidade de Brasília.
Segundo Arbache, a teoria tradicional de comércio exterior sempre preconizou que, por possuir mão-de-obra e recursos naturais abundantes, o Brasil deveria se especializar na exportação de produtos pouco sofisticados.
"Mas não é isso o que tem ocorrido. A competição de outros países em desenvolvimento com o mesmo perfil produtivo do Brasil dificulta a situação de empresas intensivas em mão-de-obra", afirma Arbache.
"Por outro lado, o grande mercado doméstico favorece grandes empresas, de perfil mais sofisticado", diz o economista da Universidade de Brasília.

Prós e contras
O desenho do mercado exportador brasileiro tem prós e contras, segundo especialistas.
As grandes empresas do país são bastante competitivas lá fora. Isso tem contribuído para o crescimento das exportações, para a conquista de fatias maiores do mercado externo pelo país e para o fortalecimento do que os analistas chamam de "marca Brasil" no mercado externo.
Já as principais desvantagens são duas. Se são poucas as empresas competitivas, há um limite para o quanto conseguem alavancar as exportações do país. Se a concentração estivesse se diluindo nas mãos de mais companhias, o potencial de crescimento das vendas externas do país seria maior.
Além disso, segundo Júlio Gomes de Almeida, diretor do Iedi (Instituto de Estudos para Desenvolvimento Industrial), para ser competitiva lá fora, uma empresa é forçada a investir na melhoria da qualidade de seu produto, em uma distribuição eficiente e a cortar custos.
"Tudo isso acaba transbordando para o mercado doméstico e, portanto, beneficiando-o. Se poucas empresas dominam as exportações, esses ganhos relativos são bem menores. É o caso do Brasil", diz Almeida.

Política industrial
Almeida defende, por exemplo, a manutenção de um câmbio mais desvalorizado como incentivo para que mais empresas consigam exportar e aumentar sua fatia nas vendas externas totais do país.
Arbache concorda que é importante aumentar o leque de empresas competitivas no exterior, mas acha que um câmbio mais desvalorizado não é a melhor solução: "É uma forma de criar competitividade de forma artificial, difícil de manter quando a moeda volta a se valorizar", diz.
Os especialistas, de forma geral, defendem a necessidade de adotar uma política industrial que fortaleça a competitividade de mais empresas.
Embora, às vezes, discordem do formato ideal dessa política, concordam também que o atual governo ainda está longe de dar um passo significativo nessa direção.



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