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Amorim ataca europeus e vê dia "inútil" de negociações
Na 1ª fase do encontro da Rodada Doha, brasileiro classifica proposta da UE de "encenação"
Ministro diz que nova oferta não traz nenhum avanço; expectativa é que os temas principais comecem a ser discutidos hoje na OMC
MARCELO NINIO
DE GENEBRA
O primeiro dia da reunião
considerada decisiva para quebrar um impasse de sete anos
nas negociações comerciais da
Rodada Doha serviu como um
prenúncio pessimista do que
virá no resto da semana. O encontro começou com a União
Européia prometendo mais
acesso a seus mercados agrícolas, e terminou com o Brasil
chamando a proposta de "encenação". O chanceler Celso
Amorim chegou a dizer que a
primeira reunião foi "inútil".
A suposta oferta européia foi
feita logo pela manhã pelo comissário de Comércio do bloco,
Peter Mandelson. Ele sugeriu
que o bloco estaria disposto a
aceitar cortes de 60% em suas
tarifas de importação sobre
produtos agrícolas, o que seria
um avanço em relação ao número atualmente na proposta
em discussão, de 54%.
Já era noite em Genebra
quando os ministros deixaram
a sede da OMC (Organização
Mundial do Comércio), após
cinco horas de reunião. Indagado sobre a proposta européia,
Amorim negou que ela represente uma nova concessão.
"Ora, 60%!", ironizou. "É
muito fácil produzir números
como 60% ou 90% quando eu
escolho os produtos em que
ninguém está interessado ou
que poucos países exportam.
Eu quero saber o que eles vão
fazer com frango, etanol, açúcar. É isso que me interessa."
Completou o comentário classificando a oferta européia de
"encenação estatística".
Sobre o primeiro dia de reuniões, o chanceler brasileiro
não escondeu sua impaciência
com a ausência de discussões
substanciais. "Talvez tenha sido uma reunião necessária e
nós precisemos passar por isso", disse Amorim. "Mas do
meu ponto de vista foi totalmente inútil, porque não ouvi
idéias ou sugestões novas. Vamos ver amanhã [hoje]."
A manipulação de Mandelson ao sugerir que estava oferecendo nova concessão foi logo
desqualificada dentro da própria UE. Mariann Fischer-Boel, comissária européia de
Agricultura, reconheceu que a
proposta não tinha "nada de
novo". O mesmo tom foi usado
pela ministra de Comércio da
França, país que atualmente
ocupa a Presidência da UE. Segundo Anne-Marie Idrac, a diferença entre o número na proposta e o oferecido por Mandelson era uma questão de como
calcular os cortes, com ou sem a
inclusão de produtos tropicais.
"Houve progresso ou novas
porcentagens? A resposta é
não. Peter Mandelson esclareceu o que as discussões técnicas
mostraram: nada a mais e nada
a menos", disse Idrac, que reiterou a protecionista posição
francesa, de que nenhuma concessão adicional deve ser feita
em acesso a seu mercado agrícola. "Nossa proposta já é a
mais generosa sobre a mesa."
No fim do dia, Mandelson negou-se a detalhar sua oferta e
jogou a pressão para os países
em desenvolvimento, dos quais
espera cortes maiores em suas
tarifas industriais que os aceitos até agora. "Esses cortes precisam dar acesso a mercados na
prática, essa é a questão. Nada
além disso funcionará. Nada
além disso permitirá um acordo", disse Mandelson.
Ninguém esperava um avanço logo no primeiro dia, mas diplomatas presentes à reunião
disseram que o chanceler brasileiro e outros ministros estavam visivelmente impacientes
com o tempo excessivo gasto
com a apresentação de propostas que todos já conhecem. A
expectativa é que os temas
principais comecem a ser discutidos hoje, quando será possível avaliar quais as chances de
sucesso do encontro. "O jogo
começa amanhã", disse o chanceler de Barbados, Christopher
Sincker, um dos 35 ministros
que participaram da reunião.
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