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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Novo plano japonês rompe com a ortodoxia financeira
GILSON SCHWARTZ
ARTICULISTA DA FOLHA
A tal ponto chegou a estagnação japonesa que o
Banco do Japão anunciou, na semana passada, uma estratégia
que rompe com todos os preceitos da ortodoxia financeira, algo
praticamente sem precedentes
na história recente da economia
mundial. O banco central japonês vai começar a comprar
ações de empresas controladas
ou associadas aos bancos em dificuldades.
A propriedade cruzada de
ações entre empresas e bancos
sempre foi um dos segredos do
sucesso financeiro japonês. Mas
desde o final da bolha especulativa, nos anos 90, o que era uma
virtude estratégica transformou-se num pesadelo crônico.
As Bolsas caem, arrastando os
bancos que, sem poder emprestar nem receber créditos, tornam a situação das empresas
ainda mais difícil, o que prejudica o seu valor em Bolsa.
O círculo vicioso já tem mais
de uma década. Cálculos oficiais
situam em US$ 428 bilhões o volume de ativos podres (empréstimos com baixa ou nenhuma
perspectiva de recuperação) no
sistema bancário japonês. De
acordo com informações do
"Wall Street Journal", o Banco
do Japão estaria disposto a comprar US$ 49 bilhões em ações,
que ficariam em seus cofres por
dez anos.
Credibilidade em risco
Masaru Hayami, o presidente
do banco central japonês, rendeu-se a um esquema de resgate
de bancos e empresas que sempre foi anátema entre os economistas ortodoxos. E reconheceu:
não há banco central no clube
das economias desenvolvidas
que atue desse modo, colocando
em risco a credibilidade do próprio banco central como emprestador de última instância. O
Fed (banco central dos Estados
Unidos) é proibido por lei de
comprar ações.
Afinal, é a mais pura injeção
de dinheiro em bancos e empresas falidas, algo que pode evitar
uma crise maior, mas que em
caso de fracasso também poderia levar a níveis de corrupção e
injustiça sem precedentes. Afinal, quem vai controlar a impressora de papel-moeda e selecionar os beneficiados pelo esquema?
A questão não é apenas saber
que empresas e bancos sairiam
ganhando. O velho ideal de independência do banco central
pode ir por água abaixo, pois nada garante que as ações das autoridades estejam voltadas apenas para o saneamento do sistema financeiro. O calendário político e o clima na Bolsa também
podem entrar na agenda.
O fato é que a inclusão de
ações no balanço de um banco
central é sinônimo de injetar risco no âmago de uma instituição
que deveria representar a estabilidade e a segurança por excelência.
Se o esquema não funcionar,
como já ocorreu com tantos outros expedientes usados pelo governo japonês nos últimos anos
para reanimar a economia, será
atingida a própria noção de regulação monetária.
Em termos simbólicos, é algo
semelhante à desmoralização
das regras financeiras atualmente em curso na economia norte-americana.
Em outras palavras, a crise
econômica mundial entra numa
nova fase. Em crises clássicas, o
baixo dinamismo, a recessão ou
a estagnação preocupam.
O exemplo japonês, semelhante ao que se vê nos Estados
Unidos, indica uma deterioração mais profunda, pois a instabilidade atinge o próprio sistema de normas, fragilizando as
instituições fundamentais sem
as quais a própria definição de
"mercado" perde sentido.
Combinam-se na mesma vertigem uma crise econômica e
um desnorteio institucional.
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