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NO BAGAÇO
Em São Paulo, indústria exportadora de suco contrata de forma irregular e demite trabalhadores que reclamam
Exploração envenena colheita da laranja
CLAUDIA ROLLI
FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL
A indústria de suco de laranja,
um dos setores mais importantes
da economia brasileira, que exporta perto de US$ 1 bilhão por
ano, paga R$ 0,16, em média, pela
caixa da fruta colhida, não remunera o dia de trabalho de quem fica doente, faz contratação de forma irregular e expõe o empregado a agrotóxicos, sem proteção.
Quem reclama é demitido.
Essa é a situação vivida pelos colhedores de laranja da região de
Araraquara, a 273 quilômetros de
São Paulo, responsável por 12%
da produção paulista de laranja,
segundo o Instituto de Economia
Agrícola. A resistência dos trabalhadores começou há cerca de um
mês na chamada Califórnia brasileira, em referência ao Estado
norte-americano pela riqueza e
diversidade econômica da região.
Na última segunda-feira, um grupo de 160 trabalhadores da fazenda Fittipaldi Citrus (que pertence
ao ex-piloto Emerson Fittipaldi),
localizada em Araraquara, entrou
em greve após descobrir irregularidades na contratação, feita pelo
Condomínio Antônio Martinez e
Outros, localizado em Catanduva.
Os colhedores de laranja foram
contratados em 18 de junho por
um período determinado, mas
outro carimbo na carteira dá como cancelado esse contrato com a
mesma data. Isto é, eles trabalharam três meses sem registro, o
que não lhes dá direito a benefício
algum, nem sequer ao seguro-desemprego. Além do acerto na carteira, eles querem ganhar mais
pela caixa colhida: R$ 0,25.
Antônio Martinez, sócio do
condomínio responsável pelas
contratações na fazenda Fittipaldi, informa que seguiu instruções
da Delegacia Regional do Trabalho de Catanduva e que as carteiras dos trabalhadores seriam recolhidas para serem corrigidas.
"Entendemos que, quando um
contrato de trabalho determinado
é cancelado, passa a valer o indeterminado", diz Martinez. Só que
na carteira dos colhedores de laranja isso não está especificado.
A Federação dos Trabalhadores
Rurais do Estado de São Paulo e o
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Araraquara solicitaram
aos fiscais do Ministério do Trabalho que investiguem o caso. O
condomínio tem prazo até terça-feira para se explicar.
Élio Neves, presidente da federação, diz que o condomínio não
pode contratar trabalhador por
prazo determinado. A idéia desses condomínios rurais -formados por grupos de produtores- é
justamente manter o emprego do
trabalhador durante o ano todo
num esquema de rodízio entre as
fazendas da região.
A Fittipaldi Citrus, que é de propriedade do ex-piloto e de José
Francisco de Fátima Santos, é
uma das fazendas que abastecem
a Cutrale, uma das maiores exportadoras de suco de laranja do
país e, portanto, sofre grande
pressão para vender laranja "a
preço de banana", segundo os trabalhadores.
Roni Bello, administrador da fazenda Fittipaldi, que trabalha para José Francisco, diz que a fazenda não está em débito com os trabalhadores e que iria entrar em
contato com o sindicato deles para acertar a situação.
Os colhedores de laranja têm
outras reclamações. Ao chegar à
fazenda, eles são obrigados a molhar, em produtos químicos, os
pés, as mãos e os garrafões de
água que carregam. A Fittipaldi
alega, assim como todas as outras
fazendas da região, que isso é necessário para evitar a proliferação
do cancro cítrico, uma doença
dos pomares, e outras pragas.
"Nós já denunciamos isso ao
Ministério Público do Trabalho
porque todas as fazendas da região chegavam a pulverizar o trabalhador no frio e no calor como
num lava-rápido. Depois da denúncia, eles pararam de pulverizar o corpo todo deles. Agora, só
pedem para molhar os pés, as
mãos e os garrafões de água e ninguém sabe quais os produtos são
usados", afirma Neves.
Há cerca de três semanas foi a
vez dos empregados do grupo Fischer cruzarem os braços. Cerca de
4.000 trabalhadores que colhem
laranja para a empresa em fazendas espalhadas em quatro cidades
da região participaram de uma
greve de 15 dias para pedir mais
pela caixa colhida. Recebiam R$
0,14, e, após a paralisação, conseguiram aumento para R$ 0,18.
Em Matão (SP), a situação da
exploração da mão-de-obra não é
diferente. Trabalhadores informaram que tiveram de procurar a
Justiça do Trabalho e o Ministério
Público do Trabalho para receber
pelo serviços prestados.
Mais problemas
Fiscais, engenheiros do trabalho
e procuradores do interior do Estado também detectaram casos de
superexploração da mão-de-obra
na região de Nova Odessa, Limeira e Piracicaba. Um grupo de 50
trabalhadores foi encontrado em
condição de trabalho degradante
em Nova Odessa. Trazidos da Paraíba, eles ficaram até dois meses
sem receber salário pelo corte de
cana. Em depoimento feito ao Ministério Público do Trabalho de
Campinas, eles informaram ainda
que eram obrigados a fazer compra em armazém determinado
pelo empreiteiro, eram maltratados, não tinham direito a folga e
viviam em alojamentos com péssimas condições de higiene.
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