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LUÍS NASSIF
O poeta que morreu de amor
Cada cidade é um mundo,
com sua história, personagens e peculiaridades. E cada
mundo desses tem seu caso de
amor, um momento qualquer na
sua história que se fixa e passa a
ser transportado pelos tempos,
carregado na lembrança de sucessivas gerações.
Poços de Caldas teve seu poeta
dândi, homem de belos versos e
de belas damas e que morreu de
amor em 9 de setembro de 1941.
Mas só agora, através do historiador Hugo Pontes, parte de sua
obra vem à tona.
Léo fazia parte dos "almofadinhas", grupo de dândis que encantava as jovens banhistas solteiras e casadas que iam ao balneário durante as temporadas.
Faziam parte do grupo o Ulpiano
Mine, goleiro da Caldense, gerente do Grande Hotel, Archanjo
Mourão, João Andrade de Andrade, os irmãos José e Mário Cavalcanti, Salim Jorge Daud e Otorino Danza. Vestiam-se de modo
impecável, com camisas especiais
costuradas pela mãe de Salim,
eram fãs de Eça de Queiroz, que
recitavam nos jardins da cidade.
Léo foi o primeiro dono da farmácia Rosário, que começou com
ele, poeta e cronista, depois passou para seu sobrinho Jurandir
Ferreira, notável contista, de onde derivou para dois outros farmacêuticos-escritores, o Cyrillo e
meu pai Oscar.
O grupo dos almofadinhas reunia-se de dia no restaurante Castelões e à noite na boate Ao Ponto, onde brilhava o pianista Ary
Barroso. Algumas crônicas de Léo
Ferrer, recolhidas por Pontes, são
pequenas jóias, como "Prosa
Amarela", de 1928, que relata o
seu encontro com Miss Melancolia e Miss Felicidade.
Ferrer tentou o romance, começou mas não prosseguiu. Preferia
encantar as mocinhas com as crônicas diárias para a rádio e para
os semanários da cidade.
No fundo, era um solitário, como todo romântico. Apesar de dezenas de paixões despertadas,
mantinha-se solteiro.
Em 1937 apaixonou-se por Clarice, jovem de Passos, vizinha a
Poços, filha de um juiz de direito
que viera passar uma temporada
em Poços. A paixão foi tanta que
ele encomendou ao ourives Otorino Danza, seu colega almofadinha, um anel -com o marfim de
uma bola de bilhar e com sua foto
incrustada- para dar de presente à amada.
Depois de algum tempo, pediu-a em casamento. O pai da jovem
negou. A amada casou-se tempos
depois com um juiz de direito, depois desembargador de Justiça
Antonio Cintra Neto.
Léo enclausurou-se em sua casa
por dois anos. Em 9 de setembro
de 1941 morreu de amor. Deixou
para cidade a lembrança do jovem romântico e um soneto de
despedida da amada, que foi passado oralmente de pais para filhos, carregado pela memória coletiva das gerações.
"Fiz mal em ter erguido meu
olhar para teu vulto / Que mora lá
tão alto e eu tão baixo moro... /
Fora afronta querer, fora talvez
insulto / Humilde pirilampo,
igualar-te, meteoro"
"Fiz mal, eu bem sei, em ter rendido meu culto / A uma visão fatal. No entanto, não deploro / O
quanto te adorei o quanto ainda
te adoro / Face a minha timidez e
meu querer estulto"
"Mas se em tua vaidade imaginastes louca / Que eu fosse implorar um riso dessa boca / E que todo curvado ao estertor do pranto"
"Dos olhos, fosse lhe pedir mágicos favores... / Enganastes, senhora, não mendigo amores / Tenho
orgulho demais para descer-me a
tanto."
E-mail - lnassif@uol.com.br
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