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INTERNET
Associação que representa 1.219 provedores vai ao Cade contra transferência de recursos da tele ao concorrente gratuito
Empresas contestam acordo iG-Telemar
ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO
A Abranet (Associação Brasileira de Provedores de Acesso à Internet), que representa 1.219 empresas no país, entrou com ações
no Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e na
Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) contestando o
contrato que autoriza a transferência de recursos da concessionária de telefonia fixa Telemar para o provedor de acesso gratuito
iG (Internet Group do Brasil).
A Telemar é uma companhia
de capital aberto, com 80% de
suas ações em poder de acionistas
minoritários, privatizada pelo governo federal em 1998 e cuja área
original de concessão abrange 16
Estados nas regiões Norte, Nordeste e Sudeste.
O iG Brasil pertence a uma
empresa com sede nas ilhas Cayman, de nome iG Cayman. Parte
dos sócios controladores da Telemar, como banco Opportunity,
GP Investimentos, Andrade Gutierrez Telecomunicações e grupo
La Fonte, é também acionista do
iG Cayman.
O contrato entre a Telemar e
o iG não é público. Sabe-se que ele
foi assinado em março do ano
passado, quando o iG, a exemplo
dos demais provedores de internet no Brasil, enfrentava grave
crise financeira.
Dez dos 11 provedores de
acesso gratuito surgidos entre o
final de 1999 e o início de 2000 fecharam as portas, com pesados
prejuízos. O próprio iG, segundo
a Abranet, teria apresentado prejuízo de US$ 70 milhões em 2000.
Dois meses depois de assinar
o contrato com a Telemar o provedor anunciou que havia alcançado o equilíbrio financeiro e mudou para azul a cor de seu logotipo, para sinalizar que havia saído
do vermelho (sua cor original).
O contrato é objeto de intensa polêmica no mercado de internet. Há 12 dias, a Seae (Secretaria
de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda) recomendou que a Telemar estenda
aos demais provedores as condições vantajosas dadas ao iG.
E que condições são essas?
Além de fornecer de graça as
"portas" de conexão à internet (a
Telemar cobra dos demais provedores R$ 100 por mês por porta
IP), a Telemar comprou o Database do iG -o que deu uma injeção de dinheiro inicial à empresa- e se comprometeu a dividir a
receita telefônica que, no futuro,
viesse a ser gerada pelas ligações
dos clientes do iG.
Contrapartida
Em contrapartida, todas as
chamadas para o iG nessas regiões teriam de passar pela rede
da Telemar. No contrato, a empresa justifica a divisão da receita
dizendo que o acordo lhe daria a
oportunidade de capturar tráfego
telefônico nas áreas em que ela
não está presente. A pergunta que
fica é por que a Telemar somente
ofereceu essas vantagens ao iG se
a troca, em tese, é vantajosa.
Pelo contrato, a Telemar repassaria ao iG 48,6% dessa receita
em 2002, começando em março.
O percentual diminuiria para
40,5% em 2003 e para 32,4% em
2004 e em 2005. A empresa de
consultoria Diamond Cluster,
que assessorou a Telemar, estimou que o iG receberia R$ 222
milhões nos quatro anos.
O iG é o primeiro -e, até onde se sabe, o único- provedor de
internet do Brasil a receber "portas" de acesso de graça e repasse
em dinheiro da Telemar. Os outros provedores pagam pelas
"portas" de acesso (monopólio
das teles) e procuram fazer frente
a seus custos através de assinaturas (80% da receita total), publicidade virtual e comércio eletrônico
(20% da receita).
Apesar da melhora de resultados dos grandes provedores de
acesso pago -como UOL (Universo Online, que tem entre seus
acionistas o Grupo Folha), Terra e
AOL (America Online)- nos últimos dois anos, eles continuam
com prejuízo nos balanços.
O acordo entre a Telemar e o
iG levou outras empresas de telefonia a criar provedores de acesso
gratuito à internet. Dessa vez, porém, eles ressurgem como mecanismo para captura de tráfego entre as telefônicas, numa guerra
que, para especialistas, pode canibalizar o mercado de internet.
A Brasil Telecom (concessionária de telefonia fixa nas regiões
Sul e Centro-Oeste) lançou o provedor gratuito iBest, enquanto
sua concorrente naquelas regiões,
a GVT, lançou o Pop. A Telefônica acaba de lançar o i-Telefônica
no interior de São Paulo.
O clima entre as teles esquentou quando três das quatro grandes concessionárias de telefonia
fixa -Telemar, Telefônica e Embratel- obtiveram o certificado
de antecipação do cumprimento
de metas da Anatel, o que lhes deu
o direito de disputar os mercados
de telefonia fixa local e de interurbanos fora de
suas áreas
originais de
concessão.
A Telefônica foi autorizada a expandir seus
mercados em
fevereiro, e a
Telemar obteve a certificação no início de agosto.
A Brasil Telecom optou
por não antecipar o cumprimento das
metas, mas
entrou na
guerra dos
provedores
gratuitos,
com o iBest.
Foi nesse
cenário que o
contrato entre a Telemar
e o iG voltou à berlinda. O acordo
provocou reações em dois segmentos: entre as teles e entre os
provedores de acesso pago à internet, que não recebem "portas"
de graça nem receita das companhias telefônicas pelo tráfego que
geram.
Em agosto, a Abranet entrou
com ação no Cade pedindo a suspensão, por medida preventiva,
de parte das cláusulas do contrato
entre o iG e a Telemar. Mais especificamente, daquelas que permitem a transferência de receita.
A ação se baseia em um parecer da empresa Tendências Consultoria Integrada, que examinou
dados públicos do contrato e suas
consequências sobre as condições
de competição no mercado de internet. Entre os autores do estudo
está o ex-presidente do Cade Gesner de Oliveira.
Na representação que fez ao
Cade, a Abranet sustenta que o iG
começou a receber ajuda financeira da Telemar já em 2001, logo
após a assinatura do contrato. Ela
estaria bancando todos os custos
de infra-estrutura de telecomunicação ("portas" de acesso) necessária para que os clientes se conectem ao provedor.
Custo zero
Tais custos, segundo a consultoria Tendências, representam, em média, metade das despesas dos provedores de acesso à
internet. Para atender a 1,4 milhão
de internautas, um provedor gasta, em média, R$ 144 milhões por
ano em infra-estrutura de telecomunicações. A Telemar estaria
oferecendo essa infra-estrutura
ao iG a custo zero dentro de sua
área de concessão e cobrindo as
despesas do provedor nos demais
Estados.
A ação diz que a atitude da
Telemar configura discriminação
de preços contra os demais provedores de acesso em relação a um
insumo essencial à atividade do
setor. "Essa condição permite ao
iG fornecer serviços com qualidade semelhante à dos demais provedores, praticando preços predatórios (zero)", diz a Abranet.
Para a associação, se essa prática valer para os provedores gratuitos ligados às teles, eles destruirão os demais provedores do país,
que não contam com tal suporte
financeiro. Ela diz ainda que 80%
da receita dos provedores de acesso pago provém da assinatura. Os
outros 20% vêm da publicidade
virtual e do comércio eletrônico.
Segundo a Abranet, o faturamento do mercado de publicidade virtual e de comércio eletrônico no ano passado foi de apenas
R$ 244 milhões, dos quais 51,8%
estão com os três maiores provedores pagos: UOL, AOL e Terra.
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