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São Paulo, domingo, 23 de fevereiro de 2003

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País não pode depender de exportações agrícolas, afirma Haberfeld

Para Amcham, perder bloco é perder mercado dos EUA

DO PAINEL S.A.

Na conclusão da entrevista, o empresário Sérgio Haberfeld diz quais são os setores que deverão sofrer mais com a implantação da Alca (Área de Livre Comércio das Américas). O novo presidente da Amcham (Câmara Americana de Comércio) de São Paulo afirma que o país precisa investir em tecnologia de ponta para não depender apenas do agronegócio.
 
Folha - A indústria brasileira está preparada para a Alca?
Haberfeld -
A indústria diz que não vai aguentar, que, se vier a concorrência americana, vai morrer. Eles produzem muito mais, o custo deles é mais baixo. Não se negocia dessa forma. Alguns setores da indústria brasileira têm condições de enfrentar a Alca, outros não. O setor de papel e celulose, por exemplo, tem condições de enfrentar a Alca, o de tecidos também, assim como o de calçados e o agrícola, que está melhor do que qualquer um. Já o setor de mecânica pesada, não sei, não conheço o suficiente, mas tenho a impressão de que teria condições de enfrentar a Alca. O setor que não está em condições, por exemplo, é o de eletroeletrônico. Nós estamos defasados nessa área. Nós precisamos de um apoio muito grande nas áreas de pesquisa e desenvolvimento. Enfim, criar mais mentes para pensar e desenvolver a nossa tecnologia para termos alguma coisa de ponta, que é o que mais valor tem. O que não pode é virarmos só exportadores agrícolas. O preço dos produtos agrícolas é o mais aviltado do mundo.

Folha - Sem a Alca, o que aconteceria com o Brasil?
Haberfeld -
Não podemos perder um dos maiores mercados do mundo, que são os EUA. Se o Brasil ficar fora da Alca, ficamos totalmente fora do mercado americano e talvez do canadense e do mexicano. É isso que me preocupa. A grande exportação brasileira tem sido para os EUA.

Folha - O governo deu indicações de que vai endurecer com os EUA?
Haberfeld -
Vai negociar, como já deveria ter negociado sempre. Para mim, endurecer é sinônimo de negociar. Não tem mais esse troço de ser bonzinho, de ser gentleman, cavalheiro. Acabou a negociação, nós vamos na esquina tomar um uísque, bater um papo, sermos ultra-amigos, mas sentou na mesa de negociação, eu defendo o meu e você defende o seu.

Folha - O sr. acha que o governo Fernando Henrique Cardoso não foi duro na negociação da Alca?
Haberfeld -
O Celso Lafer (ex-ministro das Relações Exteriores) foi um cara muito positivo, que ajudou muito na negociação da Alca, mas o problema é que governo Fernando Henrique promoveu uma política ideal para um país desenvolvido, que não é o nosso caso. Para uma França, o governo FHC teria sido uma maravilha. Nós temos que ser muito mais rústicos, muito mais duros. Não necessitamos falar cinco línguas e nos apresentar nos Champs Elysées. Temos que nos apresentar na Argélia, falando argelino e com ar de necessitado. Não podemos dar uma de rico não sendo rico. O Brasil não precisa dessa figura de estadista do Fernando Henrique, e sim de um bom governo que resolva os problemas do país de forma rústica.

Folha - O presidente Lula é o ideal, então?
Haberfeld -
O Lula tem o perfil ideal. É um homem simpático, sabe se posicionar e bate duro. Negociou a vida inteira pelo sindicato. Não existe melhor negociador de que um sindicalista da CUT. Quando começa a ficar bonzinho, é trocado. Essa é a teoria da CUT. Negociei durante muito tempo com sindicalistas da CUT. Aprendi muito com eles. O PT é imbatível na negociação. Nós, empresários, associações empresariais, precisamos começar a entrar na negociação. A pior solução é a de fazer um movimento contra a Alca. O melhor é ir para a negociação, até não chegar a um acordo.



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