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São Paulo, domingo, 23 de fevereiro de 2003

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ANÁLISE

Culto às ações já não domina os investidores

DO "FINANCIAL TIMES"

Três anos de mercado em queda mudaram a cara da economia mundial e as atitudes de muitos investidores. Não estamos mais sob o domínio do culto às ações -a vã suposição de que as ações sempre apresentariam desempenho superior ao dos demais ativos financeiros no longo prazo. Os bônus mundiais tiveram desempenho superior ao das ações ao longo dos últimos 16 anos.
A teoria sugere, de fato, que as ações deveriam ter desempenho superior ao dos bônus do governo no longo prazo.
O problema é que, assim que os investidores compreenderam essa teoria, mudaram de atitude. Sobrecarregaram suas carteiras com ações, em busca de retornos excedentes, e levaram os preços nas Bolsas a uma alta que simplesmente garantiu que chegaria um ponto em que os retornos futuros teriam inevitavelmente de ser precários.

Peso do risco
No Reino Unido, nos Estados Unidos e no continente europeu, os investidores institucionais estão agora reconsiderando o peso dado às ações em suas carteiras e pensando de maneira mais profunda na dimensão do risco que eles devem estar preparados para encarar.
Os investidores privados tiveram algumas lições sobre os riscos de carteiras de investimento concentradas e compreendem agora que as operações diárias que valeram a alguns o status de milionários normalmente têm chance de sucesso semelhantes às de uma loteria.
As empresas estão repensando seus planos de incentivos -aqueles planos que, por meio de opções de ações, entregavam uma proporção dos retornos excedentes aos executivos, nos bons momentos, mas deixavam os investidores com o prejuízo no momento em que a situação se voltava para o pior.

Mudanças saudáveis
Essas mudanças de perspectiva são saudáveis. Os investidores de varejo estão igualmente evitando as ações, o que cria o perigo de que muitos deles não acumulem poupança suficiente para manter renda satisfatória em suas aposentadorias. E o declínio nos preços das ações também prejudicou a confiança dos empresários.
Felizmente, o mundo não passou pela espécie de colapso financeiro que costumava ser parte regular das quedas de mercados do passado. Ao que parece, o sistema bancário nos Estados Unidos e na Europa conseguiu descarregar parte suficiente de seus riscos, ou distribuí-los, o que impediu uma calamidade.
Se existe um segmento preocupante, é o de seguros. Mas o colapso de uma companhia de seguros não representaria um risco sistêmico semelhante ao colapso de um grande banco. E no Reino Unido, onde os temores quanto às seguradoras são mais intensos, a Autoridade de Serviços Financeiros agiu com rapidez e corretamente para relaxar os requerimentos de falência.
É evidente que um novo período de queda abrupta nos mercados poderia causar baixas no setor financeiro. Com a guerra no Iraque a apenas semanas de distância, e os mais recentes dados econômicos aparentemente apontando para o pessimismo, um novo período de queda é uma possibilidade clara.
Wall Street, que dita o tom dos mercados mundiais de ações, parece ainda estar sofrendo de avaliações superestimadas, em termos históricos.
Mas, da mesma forma que os investidores precisavam se acautelar quanto à euforia em 1999 e no começo de 2000, não deveriam exagerar o pessimismo agora.
A menos que haja uma catástrofe no Oriente Médio, a situação econômica mundial não parece tão ruim. O crescimento talvez seja lento, mas os bancos centrais abriram as torneiras monetárias, da mesma forma que os governos abriram as torneiras fiscais.
Não estamos na era depressiva dos anos 30 ou na estagflação da década de 70. É preciso cautela para que não nos arremessemos a uma crise ainda maior do que aquela que já enfrentamos.


Tradução de Paulo Migliacci


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