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ARTIGO
O futuro do sindicalismo brasileiro
JAQUES WAGNER
ESPECIAL PARA A FOLHA
Para ter sucesso, a reforma
sindical e trabalhista não pode restringir-se à discussão pontual de questões laborais. Precisará enfrentar temas cruciais, como
a representação e a representatividade dos sindicatos, a democratização das relações de trabalho por
meio de novos instrumentos de
negociação coletiva e a construção de um ambiente mais propício à solução dos conflitos. Por esse motivo, deve se empenhar de
forma cautelosa na escolha dos
seus representantes que vão participar do Fórum Nacional do Trabalho para discutir as mudanças
na legislação, de maneira a ampliar a credibilidade e a assegurar
que os debates não se transformem em bandeira pela mera supressão de direitos.
Como base para ajudar nos trabalhos está a radiografia da organização sindical no país que foi
exibida na quarta, com a divulgação pelo IBGE dos resultados de
sua Pesquisa Sindical 2001.
É curioso que, nos últimos dez
anos, a despeito do crescimento
econômico modesto, o número
de sindicatos teve aumento expressivo, chegando a 16 mil agremiações. Mais curioso é o fato de
que a taxa de sindicalização entre
ocupados se tenha mantido nos
mesmos patamares do início dos
anos 90 -em torno de 26%.
O crescimento quantitativo dos
sindicatos parece, portanto, ter
resultado menos do avanço da organização sindical ou dos serviços
prestados pelas entidades sindicais e mais da fragmentação das
entidades já existentes. Essa pulverização sinaliza necessidade de
rever os problemas enfrentados
na representação de trabalhadores e de empregadores. O contraste entre o crescimento numérico
de entidades e o ritmo mais lento
da economia, com as conhecidas
pressões sobre o mercado de trabalho, indica a necessidade de
mudança. É preciso romper o mito da efetividade das normas trabalhistas brasileiras.
Como se sabe, a Constituição de
1988 eliminou os instrumentos
mais explícitos de interferência e
intervenção estatal sobre os sindicatos e consagrou o princípio da
livre associação sindical e profissional. Mas manteve a unicidade,
o imposto sindical e o poder normativo da Justiça do Trabalho.
Além disso, o texto constitucional
instituiu uma contribuição para
custeio do sistema confederativo
que possibilitou aos sindicatos o
acesso a mais uma fonte de sustentação financeira, recolhida livremente e sem a garantia prévia
de contrapartidas.
Somos a favor de uma revisão
do imposto sindical. A cobrança
desse imposto é um dos maiores
incentivos à formação de "sindicatos cartoriais". É preciso encontrar um novo modelo de financiamento da atividade sindical.
Assim conseguiremos atingir as
metas de democratização das relações de trabalho, adequar a legislação à nova realidade do mercado e estabelecer garantias trabalhistas nos termos das convenções e recomendações da OIT.
Essa estrutura sindical possibilitou a sobrevivência do sistema
confederativo e abriu brechas para a criação de novos sindicatos,
para o desmembramento de categorias profissionais e econômicas, para a fusão de sindicatos
preexistentes e para a legalização
das centrais sindicais, sem, contudo, conferir a elas estatuto sindical. Ao mesmo tempo em que caíram por terra as antigas exigências de enquadramento sindical, o
Ministério do Trabalho foi chamado a acolher os pedidos de registro sindical, passando a regular
de maneira frouxa o processo de
criação de sindicatos.
Tudo isso alimentou a pulverização sindical, tendo o município
como base territorial mínima. Daí
resultou o aparecimento de sindicatos não necessariamente comprometidos com as demandas
reais dos setores que pretendem
representar. Atualmente, o Ministério do Trabalho e Emprego recebe uma média de mil pedidos
de registro sindical por ano, dos
quais 400 logram sucesso. Para
onde esse ritmo nos levará?
Outra ordem de questões trazida à luz pelo Censo Sindical diz
respeito às tendências da negociação coletiva. Foi registrado um
crescimento da negociação direta
entre trabalhadores e empregadores, a qual passou de 58% em 1991
para 81% em 2001. No entanto
houve redução de 53% para 51%
no percentual de instrumentos
contratuais celebrados. Também
caiu o número de dissídios coletivos. De um lado, é claro o aumento da disposição de trabalhadores
e empregadores para negociar e
dirimir seus conflitos sem a intervenção da Justiça. De outro, observa-se certa dispersão da negociação coletiva, traduzida na descentralização dos acordos coletivos e que reflete a própria pulverização da representação sindical.
É evidente, portanto, a necessidade de superar o atual modelo de
organização sindical, sempre criticado por sua origem autoritária
e corporativista. É preciso passar
das idéias luminosas para a concretização de uma reforma verdadeiramente democrática. Isso exigirá não só grande disposição para buscar soluções negociadas
mas o compromisso de sintonizar
a reforma sindical e trabalhista
com as novas exigências do desenvolvimento econômico e social e com a necessidade de geração de emprego e renda.
Jaques Wagner, 51, é ministro
do Trabalho e Emprego.
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