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Consumo chinês influi mais que guerra no preço da soja
DA REPORTAGEM LOCAL
A guerra entre os EUA e o Iraque terá um efeito mínimo no rumo dos preços uma das principais commodities agrícolas exportadas pelo Brasil, a soja.
A despeito do conflito, as cotações devem permanecer em alta
devido à queda dos estoques
mundiais e, principalmente, ao
aumento da demanda chinesa pela commodity.
Segundo a consultoria Tendências, as exportações nacionais de
soja e derivados seguem fortes,
com expansão de mais de 90% em
valor, no acumulado de duas semanas de março, ante igual período no ano passado. Em fevereiro,
elas foram 61% superiores às do
mesmo mês de 2002, ficando em
US$ 190 milhões.
Nesta safra, a China deve importar 16 milhões de toneladas
ante 15 milhões na última safra, de
acordo com Paulo Frota, diretor
da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China.
Com relação aos estoques, o nível atual em relação à safra passada mostra uma queda de 5%. Essa
retração, aliada ao incremento da
demanda chinesa, tem, segundo
especialistas, pressionado os preços no mercado internacional.
A guerra, que conforme previsões do mercado será curta, não
deve alterar esse cenário. "Essa
guerra não será importante a
ponto de gerar oscilações no comércio de commodities. No caso
da soja, por exemplo, a produção
dos principais países [EUA, Argentina e Brasil] não correm risco
de ser atingidas", afirma Joaquim
Guilhotto, professor de economia
agrícola da Esalq/USP.
O mesmo ponto de vista é partilhado por Getúlio Pernambuco,
economista da CNA (Confederação Nacional da Agricultura). Para, ele o efeito direto da guerra nos
preços internacionais deve ser
mínimo.
Outros itens em alta
A previsão de que um conflito
terá um efeito marginal no comércio agrícola brasileiro também é endossada pelo desempenho da balança comercial brasileira com países do Oriente Médio
nos dois primeiros meses deste
ano. Dados da Secex (Secretaria
de Comércio Exterior) revelam
que, no período, a balança comercial registrou superávit recorde de
US$ 2,28 milhões. Boa parte desse
resultado pode ser atribuída ao
incremento das parcerias com
países da região. As exportações
brasileiras para os países árabes
cresceram 27% no primeiro bimestre deste ano em comparação
com o mesmo período do ano
passado. Além da soja, carnes
também tiveram destaque.
No caso do frango, por exemplo, o crescimento das vendas externas foi de 19% em relação a 2002. A Arábia Saudita figura entre os principais compradores
desse item de exportação. As exportações de carne bovina, que se
expandiram 26,7% no período, tiveram como um dos mais relevantes parceiros o Irã. O país também é, desde 1998, o maior importador de óleo de soja brasileiro. Em 2002, foram compradas
573 mil toneladas do produto.
Para José Augusto de Castro, da
AEB (Associação de Comércio
Exterior do Brasil), esse impulso
nas exportações brasileiras na região foi causado pelo temor da
guerra. "Os países anteciparam as
compras para fazer estoques preventivos. Se a guerra for de fato
rápida, vamos observar em breve
um desaquecimento das exportações para a região", diz.
Segundo a Câmara de Comércio
Árabe-Brasileira, entretanto, a
evolução das exportações brasileiras para os países árabes é resultado de uma evolução natural
do comércio. O diretor da FNP
Consultoria, José Vicente Ferraz,
também descarta a hipótese de o
aumento das exportações para o
Oriente Médio no período ter sido
causado por formação de estoques de guerra na região.
Especialistas ouvidos pela Folha
afirmam que ainda é cedo para
antever as consequências do término do conflito para as exportações agrícolas brasileiras, porém
concordam que o Brasil pode sair
ganhando.
O pós-guerra poderia abrir
mercados nos países árabes na esteira de um antiamericanismo na
região. Nos países árabes que se
opõem à posição dos EUA no
conflito, poderia haver um processo de substituição. Importações de produtos agrícolas americanos ou de países alinhados com
os EUA poderiam ser trocadas
por alimentos brasileiros.
"Esse poderia ser um resultado
indireto do pós-guerra. As compras antes feitas no mercado americano poderiam passar para o
Brasil. Com o fim do embargo ao
Iraque, o Brasil também poderia
ter participação maior nesse mercado", diz o economista da CNA.
Para Castro, da AEB, esse processo de substituição é plausível,
mas há ressalvas. "A logística para
a região é complicada. E há o
agravante de que, se os EUA ocuparem o Iraque, o Brasil poderá
perder esse mercado."
A Câmara Árabe-Brasileira de
Comércio não quis comentar o
assunto.
(CÍNTIA CARDOSO)
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