|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
EUFORIA DO MERCADO
Disparada das Bolsas de Valores e desabamento do preço do petróleo não devem se sustentar
Desdobramentos da guerra podem calar coro de otimismo
DA REPORTAGEM LOCAL
As estimativas das consequências econômicas da guerra contra
o Iraque têm sido dominadas por
um coro otimista que prevê um
conflito rápido seguido de recuperação de PIBs (Produtos Internos Brutos) mundo afora. Embora esse seja o discurso principal,
detalhes que escapam das análises
dão pistas de possíveis desdobramentos menos róseos.
Embora as estimativas de crescimento da economia global piorem a cada dia, muitos economistas defendem que boa parte das
tensões econômicas atuais são
fruto das incertezas geopolíticas.
Portanto, terminada a guerra, a
tendência seria de recuperação.
Essa expectativa se refletiu no
comportamento dos mercados na
semana passada. Bolsas de Valores dispararam e o preço do petróleo recuou bastante.
Mesmo que o conflito seja rápido-é isso que sugeriram os primeiros ataques ao Iraque- há
possíveis desdobramentos que
têm escapado de muitas análises
do mercado. Além disso, as principais causas da fraqueza da economia mundial, dificilmente, desaparecerão com o fim da guerra.
Detalhes ignorados
O rumo dos preços do petróleo,
os gastos com o conflito, a melhora dos índices de confiança de
consumidores e investidores e a
recuperação das Bolsas de Valores serão os principais fatores que
determinarão as extensões macroeconômicas da guerra.
Para começar, ao contrário de
algumas previsões, é improvável
que as Bolsas de Valores norte-americanas tenham forte recuperação depois da guerra. A análise
de indicadores de mercado como
o P/L, que mede a relação entre
preços e lucros, mostram que as
cotações das empresas continuam infladas em relação aos
seus ganhos. Isso indica que há,
sim, espaço para correção dos
preços, mas para baixo.
O P/L calculado com base nos
últimos resultados das empresas
da S&P, bolsa que reúne as 500
maiores companhias norte-americanas, está atualmente em 30. O
número indica que serão precisas
três décadas até que a distribuição
dos lucros correntes das empresas, via dividendos, atinjam quantia equivalente ao atual valor de
mercado das mesmas.
"Esse P/L indica que a empresa
está cara, que o lucro corrente não
justifica a cotação inflada", diz
Alexandre Silvério, sócio da Gap
Asset Management.
Se forem consideradas as estimativas de ganhos futuros das
empresas para este ano, o P/L da
S&P despenca para 16,2. A redução é explicada pelas projeções
significativamente maiores para
os lucros das empresas este ano.
Boa notícia? Não exatamente.
Esse é apenas outro sinal de que o
mercado exagera nas suas previsões otimistas. Afinal, as chances
de que os lucros disparem em
2003 não combinam nada com as
projeções cada vez mais magras
para o desempenho da economia.
Gastos
Os custos do conflito também
parecem subestimados. Devem
ultrapassar os US$ 50 bilhões em
gastos militares calculados pelo
governo dos EUA.
A única análise detalhada sobre
os custos além de gastos militares
foi feita pelo economista William
Nordhaus, da Universidade de
Yale, EUA. Ele estimou custos de
ocupação, reconstrução, assistência humanitária, impacto no mercado de petróleo e consequências
macroeconômicas.
Sua projeção otimista é de US$
99 bilhões num período de dez
anos. A pessimista chega a US$ 1,9
trilhão, o equivalente a 2% do PIB
norte-americano para cada ano
de uma década.
O problema, que afeta até os cálculos elaborados de Nordhaus, é a
impossibilidade de se prever e calcular todos os desdobramentos
da guerra. No caso das cotações
de petróleo, há analistas que esperam que as cotações desabem para US$ 20, a exemplo do que ocorreu na Guerra do Golfo.
Essas análises ignoram, por
exemplo, que parte da pressão
atual sob as cotações da commodity se deve à crise na Venezuela.
Embora a greve no país latino-americano já tenha terminado, a
produção no país não deve voltar
ao normal este ano.
Ainda piores seriam as consequências de sérios danos à infra-estrutura de produção da "commodity" no Oriente Médio.
Como previam especialistas em
conflitos internacionais, Saddam
Hussein tem dado ordens para
que as estruturas de produção de
petróleo sejam danificadas, por
vingança. O ditador iraquiano já
havia feito isso antes de deixar o
Kuait, derrubando a produção do
país de 2 milhões de barris por dia
para 200 mil em 1991.
A hipótese de que a guerra seja
seguida por ataques terroristas e
conflitos internos no país também traria consequências incalculáveis, como pressão extra sobre os preços de petróleo.
As crises que afetaram muito os
preços de "commodity" (como
em 1973, 1979, 1991) acabaram
contaminando a economia global
com fortes efeitos recessivos.
Isso acontece porque a alta dos
preços do petróleo é como um
imposto adicional sobre os custos
das empresas. Tende a provocar
elevação de preços e cortes de
produção, contribuindo para o
desaquecimento econômico.
A resposta dos governos, nesses
casos, depende da situação econômica. Nas últimas crises, como
a economia global passava por expansão, houve elevação de juros
para coibir a inflação. Agora, como vivemos dias de desaceleração, as respostas a uma possível
disparada nos preços do petróleo
são mais difíceis de prever.
À primeira vista, a expectativa é
que os países desenvolvidos sigam o receituário tradicional e
afrouxem ainda mais suas políticas monetárias para tentar aquecer suas economias.
Mas, no médio prazo, já há
quem veja sinais de que os EUA
terão de subir juros, o que prejudicaria ainda mais a economia
global (leia texto na página B13).
(ÉRICA FRAGA)
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Mercados e serviços: Fisco paulista exige declaração sobre doação Índice
|