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ENTRAVES
Problemas são a fragilidade fiscal e o baixo volume de exportações; taxa muito baixa traz risco de alta da inflação
Para economistas, juro real tem piso de 8%
CLÁUDIA TREVISAN
DA REPORTAGEM LOCAL
O Brasil ainda deve conviver por
um bom tempo com taxas de juros reais superiores às praticadas
por grande parte dos demais países emergentes, com impacto negativo sobre os níveis de crescimento da economia. A trajetória
de queda iniciada pelo BC (Banco
Central) em julho e aprofundada
na semana passada tem um limite, definido por fatores como o
desequilíbrio fiscal e o baixo volume de exportações em relação ao
tamanho da dívida externa.
O debate sobre a persistência
dos juros elevados ganhou força a
partir da semana retrasada, quando o economista Pérsio Arida, um
dos formuladores do Plano Real,
propôs a seus colegas uma reflexão sobre a natureza desse fenômeno e as características que ele
adquire no Brasil. Em sua opinião, os juros reais têm um piso
-que está entre 8% e 10%-
abaixo do qual a taxa não pode
cair, sob risco de alta da inflação.
Depois do corte de 2,5 pontos
percentuais feito pelo BC na quarta-feira, os juros reais caíram para
15%. O "desejável" seria uma taxa
de pelo menos 5% ao ano. Os 15%
são resultado da taxa Selic (22%)
menos a expectativa de inflação
para os próximos 12 meses.
Ato de vontade
Economistas ouvidos pela Folha concordam com a tese do piso
e apontam para os mesmos índices que Arida. Na origem do problema, apontam a fragilidade fiscal ou o baixo volume de comércio exterior em relação à dívida
externa. E são unânimes em afirmar que o corte dos juros não depende de um ato de vontade do
BC ou do governo, mas da obtenção de determinadas precondições, sem as quais nenhuma redução será sustentável.
Ao lançar seu desafio, quando
recebeu da Ordem dos Economistas o prêmio "Economista do
Ano", Arida também esboçou a
tese de que o alto nível dos juros
teria um caráter estrutural, semelhante ao que teve a hiperinflação,
e exigiria soluções "criativas". A
reflexão chamou a atenção do ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, que convidou Arida para
uma conversa em Brasília nesta
semana.
O economista Paulo Rabello de
Castro, colunista da Folha, não vê
no problema uma questão estrutural. "Nós temos muito pouca
história de taxa real elevada para
transformá-la em uma maneira
de ser ou em algo intransponível",
afirma.
Para ele, a taxa pode cair rapidamente se o país passar a ter uma
"obsessão exportadora", que melhore a relação entre dívida e exportações, que hoje é próxima de
três para um. Ou seja, a dívida supera em três vezes o que o país obtém nas vendas ao exterior, o que
indica uma baixa capacidade de
captar dólares para pagar seus
compromissos externos. Se essa
relação fosse melhorada, diminuiria o risco de investir em reais
e, em consequência, os juros exigidos pelo mercado.
A frágil situação fiscal é outro
fator apontado por Rabello de
Castro para a alta taxa de juros.
Com necessidade de se financiar
no curto prazo, o governo acaba
refém da alta remuneração exigida pelos investidores. A solução,
diz ele, passa pela obtenção de
grandes superávits primários, que
são a economia que o governo faz
para pagar os juros da dívida.
A equação do problema fiscal é
apontada como precondição para
a queda sustentada dos juros por
outros quatro economistas: Sérgio Werlang, economista-chefe
do Itaú, Gustavo Loyola, ex-presidente do BC, Octavio de Barros,
economista-chefe do Bradesco, e
Alexandre Schwartsman, economista-chefe do Unibanco.
Segundo Werlang, os juros cairão na medida em que diminua a
relação entre dívida pública e PIB,
hoje próxima de 50%. A previsão
dele para dezembro de 2004 é de
juros reais de 8%, equivalentes ao
que seria o "piso" da taxa hoje.
Plano Collor
Além da questão fiscal, Werlang
lembra o trauma do Plano Collor,
em 90, que dizimou a confiança
na dívida interna. O economista
observa que, a partir daí, os juros
reais passaram a patamares inexistentes nas décadas de 70, quando foram negativos, e de 80, quando tiveram média de 1,5%. Em 92,
por exemplo, a taxa atingiu 35%, e
o índice mais baixo do período foi
de 5,9%, em 2002.
Loyola, sócio da consultoria
Tendências, é categórico: "Enquanto não resolvermos a questão fiscal, o Brasil vai conviver
com altas taxas de juros reais". Ele
também defende o aumento do
comércio internacional, que aumentaria a capacidade do país de
reagir a choques externos.
Barros diz não considerar um
"desafio intransponível" o país
chegar a taxas de juros reais de 5%
a 6% em 2006. Para isso, é preciso
melhorar a relação dívida/PIB,
afirma. Diante de uma situação
fiscal mais consistente, o investidor veria menos risco de não receber o retorno por sua aplicação e,
em consequência, exigiria uma
menor remuneração.
O economista prevê uma trajetória descendente dos juros reais
nos próximos meses, mas estima
que eles ainda estarão em 8,5%
em dezembro do próximo ano.
Loyola é mais pessimista e estima
taxa próxima de 10%.
Schwartsman observa que a rigidez do gasto público aumenta a
fragilidade fiscal. Segundo ele, o
primeiro passo para atacar o problema foi dado com a aprovação
da reforma da Previdência.
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