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ANÁLISE
Sem caixa, França prepara onda de privatizações
DO "LE MONDE"
Ante a contínua degradação das finanças públicas, o
premiê francês, Jean-Pierre Raffarin, e o ministro da Economia e
Finanças, Nicolas Sarkozy, querem utilizar a cessão das participações do Estado nas grandes
empresas para pagar a dívida.
Após a Snecma (fabricante de
equipamentos aeronáuticos), a
France Télécom poderá entrar no
programa. O primeiro-ministro
anunciou no início do mês que vai
"acelerar" sua política de privatizações "no setor competitivo".
Raffarin estima que, depois de
privatizadas, as empresas retomarão as contratações e o investimento. Sarkozy indicou que as receitas liberadas permitirão "diminuir a dívida" pública (cerca de
1 trilhão) e também "recapitalizar" certos grupos industriais.
O Partido Socialista exige que o
governo renuncie à mudança de
estatuto da EDF-GDF (estatais de
eletricidade e gás). Para a oposição, trata-se de uma liqüidação
para cobrir dois anos de gestão
Raffarin."
Raffarin e Sarkozy sabem que
em período de crescimento fraco
não há receita milagrosa para recuperar as finanças públicas, as
querem mostrar que não estão
imóveis no momento em que os
déficits e a dívida aumentam. O
premiê decidiu encontrar rapidamente dinheiro cedendo as participações do Estado em empresas.
Sarkozy foi mais direto. "É impossível deixar os déficits aumentarem. As vendas de ativos permitirão reduzir a dívida e também
recapitalizar a indústria." O porta-voz do governo, Jean-François
Copé, indicou que "as condições
do mercado" agora estão mais favoráveis a essas operações.
A alta do euro ante o dólar, que
prejudica a competitividade das
empresas européias, tem perdido
força. Para Sarkozy, é urgente
conter a dívida, que, no final de
2003, chegava a 980 bilhões. Se
acrescentarmos o déficit público
previsto para 2004 ( 55 bilhões),
atingiria 1,035 trilhão (fora o
déficit da Seguridade Social).
Estimativas internas do Ministério da Economia indicam que,
sem medidas corretivas, a dívida
poderia atingir 67% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2005
(contra 63% em 2003), ou sete
pontos percentuais a mais que o
limite fixado pelo Tratado de
Maastricht (60%). A carga da dívida representa o segundo peso
no Orçamento civil e "absorve
80% do imposto de renda", comenta o círculo de Sarkozy, mesmo com taxas de juros historicamente baixas. Mas elas não ficarão para sempre nesse nível.
As privatizações, porém, só remediarão parcialmente o problema. Uma parte do produto dessas
cessões de ativos servirá, na verdade, para consolidar o capital de
empresas públicas, principalmente a Giat Industries e a DCN
(ex-direção de construções navais). Entre 1985 e 2003, o Estado
tirou apenas 66 bilhões dessas
vendas, ou seja, um ano de déficit
acumulado do Estado e da Seguridade Social. No Ministério da
Economia e Finanças, estima-se
que uma aceleração do programa
permitirá mobilizar rapidamente
cerca de 20 bilhões, dos quais
4 bilhões já estão inscritos na Lei
de Finanças de 2004.
Já anunciado, o lançamento na
Bolsa de uma parte do capital
(cerca de 30%) da Snecma poderia ocorrer a partir de junho e traria cerca de 2 bilhões.
Os particulares poderiam ser
chamados a participar de uma
nova cessão de títulos da France
Télécom, da qual o Estado ainda
detém 50,15%. Essa empresa vale
55 bilhões na Bolsa. Os banqueiros de negócios estimam que, depois da Snecma, é a operação mais
provável. Na opinião deles, é possível colocar entre 5 bilhões e
7 bilhões em títulos no mercado.
Quando a aproximação na Bolsa
entre a Air France e a aérea holandesa KLM for concluída, o Estado
também poderá se livrar de uma
parte de seus títulos da companhia francesa. Também restam
todas as empresas nas quais ele
tem uma pequena participação.
Em discurso, Raffarin parece ter
excluído aquelas que não podem
ser vendidas sem um reforço de
sua lógica industrial.
Ele explicou: "Devemos reforçar nossa base industrial favorecendo as alianças, principalmente
nos setores em que a França é dinâmica, como nas indústrias ferroviária, automobilística, aeronáutica, farmacêutica, agroalimentar, de telecomunicações ou
espacial". Por trás da urgência orçamentária, restaria, portanto,
um vestígio da lógica industrial.
Outras na mira
O primeiro-ministro também
lembrou que essas privatizações
ficariam "no setor competitivo".
Trata-se de apressar o passo, mas
sem agitar um lenço vermelho recolocando em questão a propriedade pública de empresas como o
Correio, a SNCF (ferrovias) ou a
RATP (transportes urbanos).
Por outro lado, o calendário vai
ficar mais rápido para a EDF. Examinado no Conselho de Estado, o
projeto de mudança de estatuto
da empresa poderia passar ao
mesmo tempo pelo Conselho de
Ministros.
Se essa operação for realizada
antes do fim do ano, a EDF pagaria uma compensação que beneficiaria os regimes de aposentadoria básica e complementares e aliviaria o déficit público. Mas nem
o valor nem as modalidades foram definidos.
Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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