São Paulo, domingo, 26 de setembro de 2004

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PÚBLICO X PRIVADO

Recursos de R$ 8 bilhões por ano são geridos por empresários e sustentam rede em mais de 2.000 cidades

Governo quer ampliar poder no sistema S

FÁTIMA FERNANDES
CLAUDIA ROLLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Governo e trabalhadores estão de olho nos R$ 8 bilhões arrecadados anualmente pelo chamado sistema S (Sesi, Senai, Sesc, Senac e Sebrae), quase três vezes mais o que a União pretende gastar com saneamento básico neste ano.
Dizem querer mais transparência na utilização desses recursos, recolhidos de forma compulsória sobre a folha de pagamento de 1,9 milhão de empresas no país.
Os empresários controlam o uso desse dinheiro há mais de 60 anos. Governo e trabalhadores entendem que é preciso abrir o que chamam de "caixa-preta" do sistema S -o TCU (Tribunal de Contas da União) já encontrou irregularidades em unidades dos S no país. Os problemas apontados pelo tribunal vão desde ausência de licitação para execução de obras e contratação de pessoal sem realização de concursos até desvios de recursos e concessão irregular de bolsas de estudo.
Para representantes de centrais sindicais e do governo, os recursos do sistema são públicos porque são recolhidos compulsoriamente das empresas -como um imposto qualquer-, além de ter finalidade pública: servem para dar formação profissional e assistência social ao trabalhador.
O que está em jogo na reestruturação desse sistema, fora o orçamento bilionário, é uma estrutura de atendimento social em mais de 2.000 municípios do país.
Ampliar a participação nas decisões do sistema significa, além de aumentar o poder político, utilizar uma estrutura que, segundo especialistas, deu certo do ponto de vista social.
A acirrada disputa pelo comando da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), uma das mais importantes entidades empresariais do país, é prova de que administrar esses recursos é sinônimo de poder.
Ao assumir a presidência da federação amanhã, Paulo Skaf vai tomar conta de um orçamento anual de R$ 750 milhões, quase todo proveniente do sistema S. A entidade é responsável pela administração dos recursos do Sesi e do Senai no Estado de São Paulo.
Para discutir a reforma no sistema S, o governo criou neste ano um fórum com representantes do governo, dos trabalhadores e das empresas. Jair Meneguelli, ex-sindicalista, foi nomeado pelo presidente Lula para presidir o conselho nacional do Sesi e comandar a reestruturação dos S.
"O governo quer democratizar a administração dos recursos do sistema S, unificar as estruturas para que os S não disputem entre si e usar as unidades já instaladas no país para viabilizar políticas públicas", diz Meneguelli.
Mudar a administração do sistema S não será tarefa fácil. "O que o governo chama de democratizar o sistema S nós chamamos de "estatizar" o sistema S", afirma Rodolfo Tavares, vice-presidente da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil).
Não há o que mudar no sistema S, na opinião de Antônio Carlos Brito Maciel, superintendente corporativo da CNI (Confederação Nacional da Indústria).
"Esse sistema vem dando certo há 60 anos. Tem sido submetido a auditorias ao longo desse período, que têm mostrado que esse dinheiro é muito bem empregado. Ensino profissional no Brasil só tem no sistema S. O próprio presidente Lula já disse que a melhor coisa que aconteceu na vida dele foi o Senai", afirma.
O dinheiro que os S arrecadam e a infra-estrutura de que eles dispõem são expressivos. De janeiro até agora, o Sesc, que oferece assistência social ao empregado do comércio e do setor de serviços, arrecadou R$ 799,2 milhões. O Sesc está espalhado por cerca de 2.000 municípios, atende 17 milhões de pessoas por ano e oferece mais de 260 mil refeições por dia.
O Senai, que forma trabalhadores para a indústria, atende em média 2 milhões de alunos por ano em 20 mil empresas distribuídas em 830 municípios no país.
Um dos mais recentes empreendimentos do sistema S também impressiona. Na semana passada, o Sesc inaugurou uma nova unidade em Pinheiros, a maior do país. Com investimento de R$ 55 milhões, o prédio, que levou oito anos para ser erguido, tem 36 mil metros quadrados de área construída, com capacidade para atender cerca de 3.000 pessoas por dia.
Para a procuradora-geral do Ministério Público do Trabalho, Sandra Lia Simón, a proposta do governo de discutir mudanças na gestão e democratização do sistema S é "imprescindível". "É necessário ter controle desses recursos que são arrecadados pelo Estado e repassados para as entidades empresariais. O que nos causa estranheza é que os serviços que prestam normalmente não são compatíveis com o montante que arrecadam. E ainda muitos dos serviços oferecidos são cobrados do usuários, o que rende uma receita ainda maior para essas entidades sociais."


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