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Cobranças de Lula e temor de
dívida levaram Palocci a aumentar aperto
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A avaliação de que a dívida pública é hoje um problema mais
preocupante do que a inflação. O
medo de abortar a retomada do
crescimento por alta demasiada
dos juros. Uma cobrança do presidente Luiz Inácio Lula da Silva
ao ministro Antonio Palocci Filho
(Fazenda) para flexibilizar a meta
de inflação do próximo ano. E
manter a credibilidade perante os
credores para deixar de renovar
acordo com o FMI (Fundo Monetário Internacional).
Segundo a Folha apurou, essas
foram as quatro principais razões
que levaram o ministro da Fazenda a fazer um novo "ajuste" no
seu rigor fiscal e monetário. Ele
desencadeou articulações no governo para afrouxar um pouco a
meta de inflação de 2005 e elevar o
superávit primário deste ano (a
economia do setor público para
pagar juros da dívida).
O superávit subiu de 4,25% para
4,5% do PIB (Produto Interno
Bruto). A meta de inflação, na
prática, passou a 5,1%, e não mais
de 4,5%, número ainda oficial segundo o IPCA (Índice de Preços
ao Consumidor Amplo).
É o segundo "ajuste" no rigor
fiscal e monetário. No início de
2003, Palocci convenceu Lula a
elevar o superávit primário herdado da gestão FHC, aumentando-o de 3,75% para 4,25% do PIB.
A meta de inflação de 2003 também foi "ajustada". Era de 4%,
com margem de tolerância de 2,5
pontos. Teto de 6,5%. O governo a
reajustou para 8,5% sem margem.
Mesmo assim, a inflação estourou
a meta (9,3% pelo IPCA).
Para 2005, com o chamado centro da meta em 4,5% e margem de
tolerância de 2,5 pontos percentuais para mais ou menos, o teto
ficou em 7%. Com o novo centro
de 5,1% previsto na ata do Copom
(Comitê de Política Monetária) da
semana passada, é menor a necessidade de subir juros para conter a
inflação. Se perseguisse os 4,5%, o
BC (Banco Central) teria de elevar
a Selic de modo mais prejudicial
ao crescimento.
Com tudo isso, Palocci aprofundou o esforço fiscal e abrandou a
política monetária. Ao elevar o
superávit, quer diminuir a relação
dívida pública-PIB. De quebra, visa evitar alta maior da taxa básica
de juros (a Selic, 16,25% ao ano).
A dívida pública líquida hoje é
de R$ 941,3 bilhões -equivalente
a 54,1% do PIB, o menor nível
desde abril de 2003. Baixar essa
relação é a prioridade da política
econômica. Ao assumir em 2003,
quando havia projeção de inflação de 40% no ano, a alta dos preços era o maior inimigo. O governo admitiu maior tolerância com
ela por julgar os 4,5% irrealistas, o
que sufocaria o crescimento econômico em 2005 e 2006.
Freio no crescimento
No início de agosto, Lula demonstrou preocupação em reuniões com o risco de frear o crescimento econômico caso voltasse a
subir a Selic, então em 16%.
Numa conversa direta com Lula, o presidente do BC, Henrique
Meirelles, disse que havia três diretores da instituição que sempre
jogavam juntos no Copom e que
eram os mais pró-mercado.
Preocupado, Lula marcou uma
reunião em 19 de agosto com as
cúpulas da Fazenda e do BC. Queria conhecer e dar um recado aos
membros do Copom, principalmente aos três. De modo simpático, Lula disse que os dois times
""estavam de parabéns" pela retomada do crescimento, mas que
temia eventual erro de dosagem,
como alta desnecessária de juros.
Apesar do recado de Lula, Meirelles disse depois a Palocci que
seria difícil, em nome da credibilidade do sistema de metas de inflação, evitar nova alta da Selic. Informado, Lula ficou contrariado.
Foi quando cobrou Palocci: "Use
a margem da meta, não precisa
cumprir exatamente a meta".
O ministro repetiu o argumento
de que poderia perder credibilidade e começou a "construir", segundo expressão de um interlocutor, uma saída. Em maio, Palocci se recusara a aumentar a meta de inflação de 2005 de 4,5% para 5,5% -idéia que quase seduziu o presidente. Para 2006, a meta é 4,5%, com margem menor, de
2 e não 2,5 pontos percentuais.
Com aval de Lula, Palocci passou a trabalhar para evitar alta da
Selic em setembro e para convencer o BC a abandonar o centro da
meta, os 4,5%, para 2005. Declarações de membros do governo, especialmente do ministro José Dirceu (Casa Civil), dificultaram a vida de Palocci. Em setembro, veio
uma alta moderada da Selic. Estava quase fechada a articulação entre Lula, Palocci e Meirelles para
subir o superávit, medida combatida por Dirceu e o ministro Guido Mantega (Planejamento).
A equipe de Palocci desejava
elevar o superávit para 4,75%,
mas ele fechou com Lula. "O presidente quer um meio-termo, é da
natureza dele", disse o ministro
da Fazenda aos subordinados.
O superávit ficou em 4,5% do
PIB. Na prática, deverá ser maior.
Nos últimos 12 meses, já está em
4,95% do PIB (R$ 80,608 bilhões).
Não está afastada a possibilidade de novo aumento do superávit.
Há fortes defensores dessa medida no governo. Por ora, só a meta
deste ano foi oficializada, mas ela
deverá, no mínimo, ser repetida
em 2005. Hoje, a avaliação da cúpula do governo é que está pelo
menos atenuada a necessidade de
aumento da Selic.
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