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LUÍS NASSIF
O samba-choro e o sincopado
A moderna música popular
brasileira nasceu em Recife,
nos anos 20. Mas apareceu para o
público e historiadores do sul no
início dos anos 30, por meio da
marchinha e do samba cariocas.
No Carnaval em Recife, tive a
oportunidade de ouvir um frevo
inédito de Raul Moraes, composto por volta de 1920. Estava lá,
com todas as cifras e notas, a
marchinha carioca, na forma
moderna que só começaria a se
desenvolver no Rio a partir de
1930 -quando Lamartine Babo
lança "O Teu Cabelo", em parceria com os compositores de frevo
Irmãos Valença.
Tome-se o livro de Zuza Homem de Mello e Jairo Severiano
com a relação das músicas brasileiras do século, ano a ano, e se verá que as primeiras músicas caracterizadas como marchinhas,
no ano de 1930, eram autênticos
frevos pernambucanos. Até meados dos anos 40, a marchinha
atinge o seu auge. Nos anos 30, foi
mais relevante que o próprio
samba.
Nesse período se desenvolvem
dois gêneros primos irmãos, que
pouco foram analisados separadamente: o samba-choro e o samba sincopado, com sua variante samba-de-breque. Em geral, se
colocam ambos no mesmo baú do
samba.
Há muitos anos minha turma
toca um repertório específico, de
músicas de natureza muito semelhantes, com as mesmas características, que formam uma linha musical continuada e com identidade própria. Na minha roda
chamamos de samba-choro e
samba sincopado.
Exemplos de samba-choro:
"Marambaia", do Henricão ("eu
tenho uma casinha lá na Marambaia"), "Minha Palhoça", de J.
Cascata e Leonel Azevedo ("se você quisesse / morar na minha palhoça"), "Sou Bom Chefe de Família" (Joel de J. Batista), "Maria
Madalena dos Anzóis Pereira"
(Pedro Caetano), "Pra que Discutir com Madame" (Janet de Almeida). De samba sincopado se tem a vasta produção de Geraldo
Pereira, como "Escurinha" ("escurinha / tu tens que ser minha /
de qualquer maneira"), "Foi uma
Pedra que Rolou", de Pedro Caetano ("levava jurando / ter grande afeição por mim"). Wilson Batista tem um samba sincopado
composto nos anos 20, em parceria com Sinhô.
Os intérpretes favoritos desses
gêneros foram os conjuntos vocais
dos anos 40, alguns sambistas excepcionais como Luiz Barbosa,
Vassourinha e Ciro Monteiro.
Mas os intérpretes que melhor
personificaram esse balanço foram a dupla Joel e Gaúcho. São
imbatíveis, com uma produção
vasta e de qualidade superior à de
qualquer conjunto vocal do período, dos Anjos do Inferno aos Garotos da Lua. Já escrevi sobre eles em 2001.
O curioso é que nenhum dos
dois gêneros costuma ser identificado na maioria absoluta dos escritos sobre a música brasileira. E, no entanto, conquistaram uma
legião de compositores de primeiro time, que formaram uma das
mais brilhantes, modernas e irreverentes discografias da música
popular -em que João Gilberto foi beber direto.
Desse grupo brilhante, participaram Gadé e Walfrido Silva
("Estão Batendo"), Nássara e Rubens Soares ("Batuque na Cozinha"), os grandes Roberto Martins ("Cai, Cai") e Antonio Almeida, J. Cascata, Haroldo Lobo, Pedro Caetano e o próprio Noel,
com o pioneiro "Conversa de Botequim", um samba-choro.
Da longa discografia da dupla
Joel e Gaúcho, há apenas uma
música identificada como samba-choro, o "Mais um Episódio"
(Braga Filho e Pedro Caetano),
música divertidíssima, mas que
sumiu no tempo.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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