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São Paulo, domingo, 27 de abril de 2003

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MÍDIA

Executivo já tentara negócio antes; cancelamento de transação de concorrente permitiu preparação para aquisição

Murdoch realiza sonho ao comprar Hughes

TIM BURT
DO "FINANCIAL TIMES"

O telefonema para Rupert Murdoch foi dado às 16h44 da quarta-feira de duas semanas atrás. O magnata da mídia, de 72 anos, sentado em seu escritório na Sexta Avenida, em Manhattan, estava esperando a chamada. Na verdade, estava esperava por ela havia mais de três anos.
O chairman da News Corporation se permitiu um breve sorriso quando Rick Wagoner, executivo-chefe da General Motors, ofereceu suas congratulações. O conselho da GM havia acabado de concordar em vender a Hughes Electronics, sua divisão de televisão via satélite e comunicações, à News Corp.
"Trata-se de um marco muito importante para Rupert", diz um colega. "Da última vez, ele ficou arrasado ao ver a Hughes escapando por entre seus dedos."
A GM deixara Murdoch atônito em outubro de 2001 ao recusar uma oferta da News Corp. pela Hughes, aceitando em lugar disso uma contra-oferta realizada no último minuto pela EchoStar, uma operadora de TV via satélite sediada no Colorado.
Naquela altura, a GM mudou de idéia enquanto seu conselho estava lendo a resolução que autorizava a venda da divisão à News Corp.
"Na semana, a sensação era a de que já tínhamos visto a cena", diz outro aliado de Murdoch. "Ninguém estava contando com um acordo até que o telefonema de Wagoner chegou."

Ação imediata
Passadas 12 horas, o chairman da News Corp. estava a caminho de Washington. "O modus operandi dele é sempre envolver as autoridades regulatórias no processo o mais cedo possível", afirma um assessor.
Nos próximos nove meses, isso vai envolver persuadir o Departamento de Justiça e a Comissão Federal de Comunicações (FCC) dos Estados Unidos a aprovar o acordo, avaliado em US$ 1,6 bilhão, que dá à News Corp. o controle da maior plataforma de TV via satélite da América do Norte.
No ano passado, as mesmas autoridades regulatórias abriram caminho à proposta da News Corp. ao bloquear a oferta da EchoStar.
Em entrevista coletiva telefônica concedida na semana retrasada, Murdoch disse que a lógica industrial era simples. "Isso dará à TV via satélite a melhor chance de romper o controle dominante do setor de TV a cabo sobre a televisão nos Estados Unidos."
Como acontece com a maior parte das transações da News Corp., o acordo com a General Motors envolve uma mistura complexa de pagamento em dinheiro, ações preferenciais e notas promissórias, além da conversão de ações preferenciais da GM-Hughes em ordinárias e um dividendo especial para a montadora de automóveis.
Em resumo, o grupo de mídia norte-americano está pagando US$ 14 por ação para adquirir o controle de uma empresa que estava avaliada em mais de US$ 18 por ação em 2001.

Concorrente ajudou
Murdoch deve agradecer à EchoStar pelo sucesso. O atraso causado por dificuldades regulatórias e o colapso subsequente na tentativa de tomada de controle acionário efetuada pela empresa deram à News Corp. tempo para reanimar seus balanços e construir uma reserva de caixa de US$ 3 bilhões antes de voltar a procurar a GM.
Murdoch também explorou a oposição política à transação da EchoStar, que ameaçava criar um monopólio sobre a TV via satélite nos Estados Unidos, para reduzir a preocupação quanto às suas ambições com respeito à DirecTV.
Essas ambições vêm fervilhando há anos. Um executivo de primeiro escalão diz que o chairman da News Corp. estava à procura de uma plataforma para TV via satélite nos Estados Unidos havia mais de uma década e de olho na DirecTV desde o final dos anos 90.
"Ele realmente se abalou com a rejeição da GM em 2001, mas a mudança na situação, de lá para cá, foi dramática", acrescenta o executivo.
Dois anos atrás, alguns analistas classificavam Murdoch, desdenhosamente, como "velha mídia". Executivos jovens e impetuosos como Jean-Marie Messier, da Vivendi Universal, estavam ditando o ritmo. Na frente pessoal, o chairman da News Corp. teve diagnosticado um câncer de próstata e havia incertezas quanto à sucessão no grupo.
"Olhe para ele agora. Está superanimado", diz um amigo íntimo. "Sua saúde é boa, ele vai se tornar pai de novo em breve, a empresa está em ótima forma e ele se mantém completamente envolvido."

Estratégia defensiva
Tendo sobrevivido a outros executivos de mídia como Messier, Murdoch está agora determinado a integrar a DirecTV aos seus ativos de mídia existentes nos Estados Unidos.
Alguns de seus críticos, no entanto, percebem uma estratégia defensiva em funcionamento. Alegam que a competição intensa e a instabilidade do mercado publicitário aumentaram a pressão sobre a Fox, a divisão de televisão aberta, a cabo e estúdio cinematográfico em que a News Corp. tem participação majoritária.
Ainda que a rede tenha sido revigorada por seus reality shows durante o ano, sua audiência está sob pressão. "A News Corp. precisava da DirecTV para defender a Fox; era uma dessas ocasiões em que eles simplesmente tinham de desgastar a ponta de venda", diz um banqueiro de investimento de Nova York.
Ao adicionar a DirecTV ao seu grupo, a News Corp. garantirá uma base segura de distribuição para a programação da Fox, bem como uma fonte de pressão sobre seus rivais no setor de cabo.
"Trata-se do tipo de poder que Rupert adora. Ele agora pode dizer à Comcast que não exibirá seus canais na DirecTV se ela tentar cobrar caro demais da Fox", diz uma pessoa familiarizada com o mercado.
O controle da DirecTV, embora com participação de apenas 34%, também acrescenta uma dimensão preciosa à rede de satélites da News Corp.
A empresa pode empregar sua escala internacional -que inclui a BSkyB britânica, a StarTV asiática, a FoxTel australiana e em breve a Sky Italia- para garantir contratos favoráveis de programação e distribuição.
Além disso, técnicas de cortes de custos e administração aperfeiçoadas no exterior podem ser aplicadas à DirecTV.
Murdoch acredita que, ao fazê-lo, pode pelo menos provar que a TV via satélite é capaz de desafiar a TV a cabo como melhor veículo para a TV por assinatura.
"Ele não teme a tecnologia", diz um colega. "Talvez este não seja seu momento supremo, mas está perto disso."


Tradução de Paulo Migliacci


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