|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
HISTÓRIAS REAIS
Plano acabou em 1996,
afirma Edmar Bacha
GUILHERME BARROS
EDITOR DO PAINEL S.A.
O economista Edmar Bacha, 62,
considerado um dos principais
autores do Plano Real, foi o primeiro economista chamado por
Fernando Henrique Cardoso para
integrar a sua equipe econômica,
quando assumiu o Ministério da
Fazenda, em 1993, no governo Itamar Franco.
Bacha trabalhou como assessor
especial do Ministério da Fazenda
e foi o principal responsável pela
criação, em 1993, do Fundo Social
de Emergência, o instrumento
utilizado pelo governo para equilibrar as finanças públicas. Bacha
considera a criação do fundo o
marco da criação do Plano Real.
Em entrevista à Folha, Bacha
diz que o maior legado do Real foi
"o fato de ter sido uma reforma
monetária amplamente pré-anunciada e integralmente negociada com o Congresso". Antes, diz
ele, "a maneira
que se fazia política econômica era
por meio de planos preparados
por tecnocratas na
calada da noite e
que eram enfiados
goela abaixo do
Congresso no dia
seguinte".
Leia a seguir trechos da entrevista
de Bacha.
Folha - Como o sr.
define o Real?
Edmar Bacha - Eu
acho que na hora
em que se fala de
dez anos do Plano
Real é preciso separar o plano da
política econômica posterior. O
plano foi uma reforma monetária
que começou num determinado
dia e acabou numa determinada
data. O Real se iniciou em fevereiro de 93, quando o Congresso
aprovou o Fundo Social de Emergência, que deu partida à URV, e
acabou em junho de 96, quando
terminou a indexação salarial que
existia no país. A partir daí, passou a haver uma moeda nova numa economia desindexada, que
era o objetivo do plano. Ou seja,
uma economia com uma inflação
baixinha. O plano foi isso. É importante não confundir o plano,
que foi uma reforma monetária,
com a política econômica que se
seguiu posteriormente a ele.
Folha - O senhor acredita que a
opção adotada posteriormente tenha sido errada?
Bacha - Você poderia adotar outras políticas econômicas numa
economia com uma moeda nova
e sem inflação. As políticas que se
seguiram ao plano foram escolhas
feitas por quem estava a cargo da
execução da política econômica.
Uma coisa é o Real, outra, a política econômica que sobreveio. Não
vamos confundir alhos com bugalhos. Não podemos esquecer
que houve percalços que prejudicaram o bom andamento das coisas. Por isso, não podemos julgar
o que foi feito sem considerarmos
as adversidades a partir do segundo semestre de 1997 até 2002. Só
para lembrar, houve os choques
da Ásia, da Rússia, da Argentina,
o estouro da bolha da Nasdaq, a
crise de energia, o 11 de Setembro
e o medo de Lula.
Folha - Para o sr., qual foi o maior
legado do Real?
Bacha - O significado histórico
mais importante do Real foi o fato
de ter sido uma reforma monetária amplamente pré-anunciada e
integralmente negociada com o
Congresso. O Plano Real foi um
marco no modo de fazer política
econômica no país. A maneira
que se fazia política econômica
era por meio de planos preparados por tecnocratas na calada da
noite e que eram enfiados goela
abaixo do Congresso no dia seguinte. Desde então, a política
econômica passou a ser feita com
transparência e negociação. Isso
não vai mudar mais. Nem o Judiciário nem o Legislativo aceitarão
outra forma de o Executivo atuar.
Folha - Qual foi o momento mais
marcante do Real?
Bacha - O momento mais marcante dessa preparação prévia ao
anúncio do plano
foi o encontro dos
técnicos com a liderança política
do PSDB no apartamento do então
ministro da Fazenda, Fernando
Henrique Cardoso, em setembro
de 1993. Estavam
lá Mário Covas,
Tasso Jereissati,
Ciro Gomes, José
Serra e, do lado
dos técnicos, eu,
André Lara Resende, Pérsio Arida e Pedro Malan.
Nós quatro éramos muito próximos da liderança
política e militantes do partido
(PSDB) havia
muito tempo.
Folha - Quando o governo decidiu
a alternativa do Real?
Bacha - Acho que em agosto de
1993, quando o André Lara Resende e o Pérsio Arida entraram
no governo. Tanto que houve
uma reunião de Fernando Henrique Cardoso com Stanley Fischer,
diretor-gerente do FMI (Fundo
Monetário Internacional), e as
propostas do Fischer eram seguir
a estratégia gradualista. A decisão
de partirmos para a reforma monetária foi tomada logo depois
dessa reunião, entre agosto e setembro.
Folha - Qual foi a origem do Real?
Bacha - A idéia da criação da
URV começou lá atrás. O ponto
de partida foi o Plano Larida, de
André Lara Resende e de Pérsio
Arida, de criação de uma moeda
paralela. Depois, os textos que
Chico Lopes (economista Francisco Lopes, da PUC-RJ) produziu sobre choque heterodoxo, e
toda a discussão sobre as reformas monetárias durante os períodos de hiperinflação na Europa. A
URV vinha nascendo desde 1983,
desde o Larida, o texto principal
que a originou.
Folha - Por que as tentativas anteriores, como o Plano Cruzado, em
1986, não deram certo?
Bacha - Acho que as idéias não
estavam maduras ainda.
Folha - Quem foi o "pai do Real"?
Bacha - Fernando Henrique
Cardoso, claro.
Texto Anterior: Tributo pós-plano "come" mais um mês de trabalho Próximo Texto: Legado Índice
|