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TESOURA AFIADA
Cortes no orçamento podem comprometer inspeção a bancos
Fazenda reduz a um terço
verba de fiscalização do BC
LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O corte no Orçamento da União
definido pelo governo no começo
do ano, para cumprir meta maior
de superávit primário acordada
com o FMI (Fundo Monetário Internacional), atingiu drasticamente uma das principais funções do Banco Central: a fiscalização de instituições financeiras.
Segundo o diretor dessa área no
Banco Central, Paulo Sérgio Cavalheiro, se o Ministério da Fazenda não liberar mais recursos
para a instituição, a regularidade
de fiscalizações e o número de técnicos deslocados por missão terão
de ser reduzidos nos próximos
meses.
"É uma preocupação. Se nada
for feito, teremos de selecionar [as
fiscalizações a serem realizadas],
o que não é o ideal. É um problema que a gente reconhece [existir]", disse Cavalheiro à Folha.
O Ministério da Fazenda determinou uma contenção nas despesas de custeio do Banco Central
neste ano da ordem de 50%.
Dos R$ 312,7 milhões inicialmente autorizados para o banco,
foram contingenciados R$ 158,5
milhões, sobrando apenas R$
154,2 milhões.
Somente a Diretoria de Fiscalização teve sua receita reduzida
para menos de um terço do valor
previsto no Orçamento -de R$
4,950 milhões para R$ 1,532 milhão.
Sem precedentes
"Não lembro de um corte dessa
magnitude desde que entrei no
banco", disse ele. Cavalheiro foi
admitido em concurso no BC em
1976, como auditor da área em
que trabalha até hoje.
A qualidade da fiscalização de
operações críticas realizada por
instituições financeiras, como o
envio de recursos para o exterior
pelas chamadas contas CC-5
(muito utilizadas para evasão e lavagem de dinheiro), pode ficar
comprometida.
Segundo Cavalheiro, todas as
transações feitas por meio das
CC-5 são registradas no sistema
do BC. "Mas, de repente, se detectamos algum tipo de irregularidade, precisamos mandar um inspetor ao local."
Por meio de contas CC-5 foram
remetidos US$ 30 bilhões para o
exterior entre 1996 e 1999, somente pelo Banestado, segundo investigação preliminar da Polícia Federal. A PF suspeita que grande
parte do dinheiro tenha origem
ilícita, como o pagamento de propina a autoridades corruptas.
Superávit maior
Em janeiro, o governo anunciou
aumento da meta de superávit
primário (receitas menos despesas, exceto gastos com juros da dívida) para este ano de 3,75% do
PIB (Produto Interno Bruto) para
4,25%, o que equivale a uma economia de R$ 68 bilhões.
A tesoura nas despesas da Fazenda foi de 15,25%, a terceira
mais branda entre os ministérios.
A disponibilidade de recursos da
pasta caiu de R$ 1,716 bilhão para
R$ 1,454 bilhão, o que dá menos
R$ 262 milhões. Como o Banco
Central é uma autarquia subordinada à Fazenda, é o ministério
que define os cortes de recursos
da instituição.
Cavalheiro contou que já conversou com o Ministério da Fazenda sobre o problema. Segundo
ele, os integrantes da equipe do
ministro Antonio Palocci Filho
"estão cientes da situação" e estudam a liberação de mais recursos
para o Banco Central nesta segunda metade do ano.
No dia em que recebeu a Folha,
Cavalheiro estava com uma carta
pronta à Fazenda para retomar as
discussões sobre o assunto.
"Acredito que eles [do ministério]
vão liberar mais recursos", disse.
Número adequado
Para Cavalheiro, o número de
funcionários da diretoria não é
problema. Ao todo, são 999, dos
quais cerca de 800 diretamente ligados à supervisão e fiscalização
das instituições financeiras. "Um
número adequado."
Segundo ele, na primeira metade do ano a diretoria conseguiu
manter a qualidade da fiscalização. Mas ressalta que, se não houver mais dinheiro disponível, a situação começará a ficar complicada a partir do mês que vem.
Diz que, em setembro, o número de viagens para inspecionar
instituições financeiras já teria de
ser reduzido, assim como o número de integrantes das equipes
que fiscalizam os bancos. "A boa
fiscalização pressupõe viajar, precisa ser feita in loco", disse.
Ajuda de todos
"Todos [os órgãos do governo]
têm de dar sua contribuição [à
economia de receitas]. Mas alguns setores têm serviços indispensáveis", ponderou.
Segundo Cavalheiro, a fiscalização dos bancos realizada pelo
Banco Central melhorou muito
nos últimos anos graças à adoção
de comitês de trabalho.
Funcionários da fiscalização baseados em diferentes Estados reúnem-se periodicamente para trocar informações, o que é importante, na avaliação de Cavalheiro,
para o aprimoramento da formação dos técnicos.
"Com a restrição orçamentária,
teremos de reduzir as viagens para a realização desses comitês",
disse ele.
"Estamos em um nível [de fiscalização] muito positivo hoje. Mas
podemos perder a qualidade do
trabalho que se conquistou nos
últimos anos", afirmou.
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