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COMÉRCIO EXTERIOR
Na miniministerial do Canadá, temor é que UE e EUA "deixem de fora" os grandes produtores agrícolas
Minirreunião da OMC é último esforço para salvar Rodada Doha
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
Vinte e cinco países (entre eles o
Brasil) mais a União Européia fazem a partir de amanhã, em Montréal, o último e quase desesperado esforço para salvar do fracasso
a Conferência Ministerial da
OMC (Organização Mundial do
Comércio), marcada para setembro em Cancún.
Trata-se da terceira conferência
miniministerial deste ano, o que
por si só já é uma indicação do desespero que toma conta dos países-membros da Organização
Mundial do Comércio ante o bloqueio das negociações da chamada Rodada Doha de Desenvolvimento.
Miniministeriais são uma forma de fugir das discussões em
pauta com o total de países-membros da OMC (145), o que torna o
processo negociador necessariamente complexo (não há votação,
mas consenso).
Ao fazer a terceira miniministerial consecutiva, a OMC demonstra que nem em grupos menores
se consegue desfazer o nó que
ameaça levar ao fracasso a Ministerial de Cancún (ministeriais são
a instância máxima da OMC).
Questão agrícola
O problema central a ser discutido em Cancún é a liberalização
agrícola, a mesma que vem paralisando avanços nas negociações
comerciais.
Para Montréal, no entanto, houve um tímido avanço: a União Européia, sempre considerada a
grande vilã em matéria de protecionismo agrícola, anunciou modificações na sua política interna,
de tal forma que os subsídios agrícolas não mais estarão vinculados
à produção.
Ou seja, o agricultor europeu receberá recursos oficiais mesmo
que não chegue a plantar um pé
de capim sequer.
Em tese, a produção diminuirá
e não sobrará excedente para exportar, sempre com subsídios, para outros países. É a exportação
subsidiada que mais incomoda
países como o Brasil, por ver o
acesso de seus produtos bloqueado pela entrada de bens europeus
protegidos pelo portentoso Tesouro da União Européia.
O problema é que a nova política interna ainda não se traduziu
em posição negociadora na OMC.
Montréal é a melhor oportunidade para os europeus apresentarem uma proposta capaz de atender às insistentes e já antigas reivindicações dos grandes produtores agrícolas.
Montréal é também a chance
para que os Estados Unidos reajam tanto à nova política interna
européia como a uma eventual
proposta no âmbito da OMC.
Como Europa e Estados Unidos
são, de longe, as duas grandes usinas econômicas e comerciais do
planeta, da posição dos dois depende o sucesso ou o fracasso de
qualquer negociação.
Mas o temor dos países produtores é o de que União Européia e
Estados Unidos repitam o chamado acordo de Blair House. Foi o
entendimento entre os dois grandes que permitiu desbloquear a
Rodada Uruguai, a que precedeu
Doha. Mas o desbloqueio se fez
em detrimento de países como o
Brasil, grande produtor e exportador agrícola, mas sem o peso
político dos ricos.
"Há de fato um cheiro de Blair
House no ar, mas a situação agora
é diferente", diz o embaixador
Luiz Felipe Seixas Corrêa, chefe
da missão brasileira em Genebra,
QG da OMC e de outros organismos internacionais.
A diferença está dada pelo fato
de que "é impossível, hoje, conviver com o protecionismo agrícola
tal como está", completa o embaixador brasileiro.
É razoável supor que a pressão,
no Canadá, estará mais centrada
nos Estados Unidos. Como disse a
primeira-ministra Helen Clark,
da Nova Zelândia, na recente reunião da "Governança Progressista", a Europa apresentou uma
mudança, que pode ser tímida e
tardia, mas é uma mudança. Agora, é a vez dos Estados Unidos.
A Nova Zelândia é um dos mais
ativos e influentes países do Grupo de Cairns, formado pelos grandes produtores agrícolas, Brasil
inclusive.
Os canadenses montaram a reunião de Montréal de uma maneira
criativa: em vez de dividir a agenda pelos temas que compõem a
Rodada Doha, o que certamente
reproduziria os impasses das miniministeriais anteriores, preferiram um formato mais abrangente, quase filosófico.
O encontro terá quatro temas,
que se entrecruzam: como avançar nas negociações; quais as ambições da Rodada Doha; questões
ligadas ao desenvolvimento em
geral (a Rodada leva Desenvolvimento no nome); e o equilíbrio
geral da negociação.
Seixas Corrêa acha bastante
"criativo" o modelo, mas não está
seguro de que seja capaz de apresentar resultados.
"É preciso que Montréal tenha
um efeito energizante, que só pode ser dado por uma abertura clara na área agrícola", diz o embaixador.
Se a energia não surgir, não haverá mais tempo para dissolver os
impasses em Genebra, já que a
OMC pára de funcionar em agosto (férias de verão). Ou seja, vai se
chegar a Cancún, em setembro,
com um excesso de questões a serem resolvidas, o que é um convite ao fracasso, justamente na arena de negociações comerciais que
o Brasil elegeu como a principal.
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