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TRABALHO
Segundo investigação, empresas e sindicatos usam CCPs para fraudar direitos e reduzir indenizações trabalhistas
Força-tarefa aponta crime em comissões
CLAUDIA ROLLI
FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL
Após um ano de investigação,
uma força-tarefa formada pelo
Ministério Público Federal, pela
Procuradoria Regional do Trabalho de São Paulo e pela Delegacia
Regional do Trabalho de São Paulo constatou crime nas Comissões
de Conciliação Prévia (CCPs),
criadas para resolver conflitos entre patrões e empregados.
Essas comissões, que começaram a surgir em janeiro de 2000
para desafogar a Justiça do Trabalho, segundo investigações dessa
equipe, transformaram-se num
negócio "rentável" para sindicatos e empresas ao fraudar direitos
trabalhistas e arrecadar dinheiro.
Os ministérios públicos Federal
e do Trabalho constataram que
essas comissões são montadas para coagir o trabalhador a abrir
mão de direitos trabalhistas e encobrir a sonegação de obrigações
sociais -como o FGTS (Fundo
de Garantia do Tempo de Serviço) e a contribuição ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
Ao ser encaminhado a essas comissões, o trabalhador é pressionado a aceitar o parcelamento de
verbas rescisórias (FGTS, saldo de
salário, férias e 13º) -proibido
pelo artigo 477 da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho)-
para beneficiar a empresa que o
demitiu. E tudo com o aval do sindicato do trabalhador, que lucra
com o negócio ao cobrar taxas para prestar o serviço.
No entender da força-tarefa, essas comissões cometem crime
contra a organização do trabalho,
ao coagir o trabalhador a receber
verbas rescisórias em parcelas, e
contra a União, ao negociar verbas de interesse público, como a
multa de 40% do FGTS (Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço).
Ao ser demitido sem justa causa, o trabalhador deve receber
40% do valor do FGTS numa conta em seu nome na Caixa Econômica Federal. Se esse valor não for
depositado, a União perde o controle desses recursos, aplicados
pelo governo federal em habitação, saneamento básico e infra-estrutura urbana.
O MPF constatou que, em algumas dessas comissões, o trabalhador é vítima de uma falsa homologação. Ao acertar as contas com a
empresa nas CCPs, o empregado
recebe um termo de conciliação
-e não de rescisão-, o que não
lhe dá o direito de sacar o FGTS
nem o de dar entrada no pedido
de seguro-desemprego. Os cálculos referentes ao fundo são embutidos em um "pacote" de direitos
pagos de forma parcelada ao trabalhador, revela a investigação.
"O pagamento das verbas não é
feito de forma transparente e não
permite a verificação detalhada
dos valores que foram sonegados
aos trabalhadores", informa auditoria da DRT feita em duas das comissões sob investigação.
As ações criminosas das comissões foram constatadas pelo MPF
ao investigar o Núcleo Intersindical de Conciliação Prévia do Sindicato dos Condutores em Transportes Rodoviários de Cargas
Próprias de São Paulo. Esse núcleo foi criado pelo sindicato, ligado à Força Sindical, e pelo Simpi
(Sindicato da Micro e Pequena Indústria do Estado de São Paulo).
O MPF identificou que, nesse
núcleo, as verbas rescisórias de
148 funcionários demitidos dos
hotéis Maksoud Plaza e Eldorado
foram pagas na comissão, quando
as homologações deveriam ter sido feitas na DRT ou no sindicato
dos hoteleiros.
O pagamento foi parcelado,
quando deveria ter sido feito de
uma só vez. Mais: esse núcleo recebeu trabalhadores de outra categoria -ao contrário do que determina a portaria nº 329, de
agosto de 2002, que estabelece regras para a instalação e o funcionamento das CCPs e dos núcleos.
A portaria determina que as CCPs
devem conciliar apenas conflitos
de trabalhadores que pertencem à
categoria profissional das entidades sindicais que as instituíram.
"Há indícios de ação criminosa
na forma como foram feitas as
conciliações dos trabalhadores",
diz Sérgio Suiama, procurador do
Ministério Público Federal.
No bolso
Os fiscais da DRT, após constatarem as irregularidades, multaram os dois hotéis. No Eldorado, a
multa foi de R$ 15.450,47. No
Maksoud, de R$ 19.090,23. Os hotéis recorreram.
Segundo os fiscais, ao descumprir a lei, o Eldorado deixou de recolher R$ 239.386 em obrigações
sociais -FGTS e contribuição ao
INSS- no período de setembro
de 2002 a março deste ano. No caso do Maksoud, esse valor corresponde a R$ 144.541,12 -só em janeiro deste ano, considerando
cálculos de 48 demitidos.
A autuação não pesou no caixa
das empresas. A multa do Eldorado representa 6,45% do que o hotel deixou de pagar aos cofres da
União. No Maksoud, 13,21%.
"Os hotéis não tinham dinheiro
para pagar as demissões em massa e, por isso, mandaram os trabalhadores fazer a rescisão de forma
parcelada no núcleo. Foi uma
ação combinada entre empresa e
sindicato", diz Luís Alexandre de
Faria, auditor fiscal do trabalho.
O mais grave, segundo os fiscais, é que, além de sonegar o pagamento ao FGTS e ao INSS, os
valores pagos aos trabalhadores
tinham erros. "Na nossa auditoria, encontramos diferenças entre
os valores que foram pagos e o
que os trabalhadores deveriam
receber. Os empregadores também deixaram de pagar correção
monetária nos valores parcelados", afirma o fiscal.
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