|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
VINICIUS TORRES FREIRE
A banca fala da bancarrota
Diretor do BIS, consórcio dos bancos centrais do mundo, alerta para estagflação e contínua crise de crédito
|
"PARECE QUE vamos entrar
em um período de séria estagflação, de aumento
agudo da inflação combinado a grandes riscos de queda no crescimento e
no emprego." Duas semanas antes
do mais recente desmoronamento
das Bolsas, celebrado na quinta-feira, era o que pensava Malcolm
Knight, gerente-geral do BIS, a respeito da crise financeira, da inflação
e do crescimento no mundo.
O Bank for International Settlements, BIS, é o consórcio dos bancos
centrais do planeta. Knight, de saída
para a vice-presidência do Deutsche
Bank, falava para uma platéia qualificada, reunida pelo International Institute of Finance, a associação mundial dos bancos. Disse cobras e lagartos sobre as finanças globais.
Primeiro, Knight afirmou que não
sabe onde vai dar a "desalavancagem
financeira". Dizia que virão mais
anúncios de perdas em bancos e seguradoras. Que mudanças no ciclo
de crédito, em especial nos EUA,
tendem a ser violentas, associadas ao
declínio do preço de ativos imobiliários e que detonam baixas no PIB. Se
o aperto de crédito ainda parece pequeno, é porque muito da alavancagem não aparece nos balanços bancários (como os derivativos imobiliários que foram à breca).
Segundo, o banqueiro observava
que dois indicadores muito importantes de tensão no mercado monetário estavam longe de registrar alívio. Tratava: 1) Da diferença
("spread") entre os juros interbancários (Libor) e a taxa esperada para os
"fed funds", a taxa "básica" de juros
americana; 2) Do custo de contratos
de seguro contra a inadimplência de
empresas e bancos (CDS). Os indicadores decolaram no estouro da crise,
em meados de 2007, e foram ao pico
quando o Bear Stearns explodiu, em
março. O "spread" Libor-OIS e os
CDS ainda estavam bem acima do
nível pré-crise quando Knight falou.
Pioraram desde então. Indicam relutância dos bancos de emprestar uns
aos outros e/ou escassez de capital
nos bancos e/ou alta no risco percebido de calote.
Terceiro: a desalavancagem (redução do crédito, grosso modo), a queda no preço dos ativos, a desconfiança no mercado interbancário e as
perdas bancárias sugerem que deve
haver ainda menos empréstimos para a atividade produtiva.
Quarto, o risco de recessão fez com
que os BCs relaxassem: os juros reais
caíram a níveis negativos (EUA e
Ásia "emergente") ou inferiores a 1%
(mundo rico afora EUA). Para piorar, na visão de Knight, muitas economias emergentes fazem maciças
intervenções no câmbio a fim de evitar o fortalecimento de suas moedas. Ou seja, todo mundo injeta dinheiro nos canos da economia.
Sexto, esse grande jorro de liquidez alimenta a inflação e deprecia o
dólar, o que contribui em muito para
o aumento do preço do petróleo e de
outras commodities e, assim, para a
piora das expectativas de inflação.
Mesmo descontado o molho conservador, o BIS reúne um dos corpos
de economistas mais sensatos e precisos. Knight falava por si, mas temperado pela pesquisa e pelas dicas de cocheira do BIS. O.k., a elite da banca não só não previu como causou,
cinicamente, o presente rolo. Mas
Knight ecoa o que se diz na alta banca, oficial e privada. É só má consciência? O colunista vai esperar para ver, mas de óculos de sol: em férias.
vinit@uol.com.br
Texto Anterior: Fabio Giambiagi: O Ipea e as instituições Próximo Texto: Arrecadação com setor de mineração aumenta 746% Índice
|