São Paulo, domingo, 29 de agosto de 2004

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ARTIGO

Crescem sinais de desaceleração mundial

ANNA FIFIELD
DO "FINANCIAL TIMES"

Os sinais de que o crescimento da economia mundial está se aproximando de seu pico foram reforçados nesta semana, com as projeções de que o colosso econômico chinês passaria por forte desaceleração no ano que vem, bem como indicações de desaquecimento nos Estados Unidos. Mas uma das nuvens mais sombrias que pendem sobre a economia, os preços elevados do petróleo, dissipou-se ligeiramente, ainda que os economistas não descartem a possibilidade de uma nova alta.

Fator China
A China se tornou importadora de produtos agrícolas, em termos líquidos, o que suscita preocupação entre os dirigentes do país quanto à segurança alimentar do 1,3 bilhão de chineses, devido à escassez de água e de terras aráveis que pressiona a produção chinesa de cereais. Hu Jintao, presidente da China, solicitou estudos urgentes sobre a segurança alimentar do país, depois que surgiram indícios, em 2003 e neste ano, de que a produção chinesa de grãos estava em queda, e a demanda deve aumentar em longo prazo, disseram funcionários do governo da China e acadêmicos.
A crescente dependência de importações ocidentais, na China, surge no momento em que o comércio internacional de produtos agrícolas se torna um dos mais disputados aspectos da Rodada Doha de negociações comerciais.
Enquanto isso, o FMI (Fundo Monetário Internacional) afirma que a economia chinesa deve crescer cerca de 7,5% no ano que vem, à medida que os efeitos dos controles macroeconômicos impostos recentemente geram desaquecimento da atividade e das pressões inflacionárias.
Em sua revisão anual da economia chinesa, o FMI disse que esse ritmo de crescimento em 2005, caso se confirme, representaria significativa desaceleração ante o índice de 9% de crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) chinês previsto pelo Fundo para este ano. A projeção foi revisada, de 8,5% em estimativa anterior, e se compara com a estimativa oficial chinesa de uma expansão de 9,7%, em termos anualizados, no primeiro semestre.

Ímpeto do Japão
As exportações japonesas, propulsor essencial da recuperação econômica do país, aumentaram pelo oitavo mês consecutivo em julho, sinal de que conseguiram resistir, até agora, à desaceleração nas economias americana e chinesa. Mas os analistas esperam que o crescimento na exportação se reduza nos últimos meses do ano e disseram que não estava claro se a demanda doméstica, que parece estar oscilando, seria capaz de compensar as perdas.
Os embarques para o exterior subiram em 14,3% ante o período em 2003, de acordo com dados publicados nesta semana. O alto preço do petróleo elevou o valor total das importações, mas o superávit comercial do Japão cresceu em 44%, seu 13º mês consecutivo de expansão.
O país vem desfrutando de sua mais forte recuperação desde o estouro da bolha no mercado de ativos do começo dos anos 90, mas os números mais recentes sobre o PIB causaram temores de que o ímpeto esteja se esgotando, e o consumo começando a cair.

Obstáculo dos EUA
Números mostrando um crescimento insatisfatório nas encomendas à indústria e uma desaceleração na venda de novas residências reforçaram as indicações de que a economia norte-americana continua a se desaquecer.
As encomendas de bens duráveis pareciam fortes, inicialmente, com crescimento de 1,7% diante do total de julho. Mas o número foi influenciado por aquisições extraordinárias de aviões civis, cujo total duplicou durante o mês. Excetuado o setor aeronáutico, notoriamente instável, o aumento nas encomendas foi de só 0,1%.
"É importante reconhecer que os números de hoje não são tão fortes quanto o indicador bruto sugere, porque as encomendas não estão nem perto de um equilíbrio entre os diferentes setores", diz Geoffrey Soms, analista da consultoria Economy.com. "A recuperação da economia americana perdeu, em termos gerais, um pouco de gás no meio do ano."

Telhado britânico caindo?
A muito antecipada desaceleração no mercado britânico de imóveis residenciais parece finalmente estar se materializando, disseram os economistas, com os bancos registrando surpreendente queda de 20% no número de hipotecas aprovadas em junho.
Enquanto isso, uma pesquisa da Confederação da Indústria Britânica constatou que o setor manufatureiro estava apontando para forte recuperação, com as encomendas mais positivas em seis anos. Outras estatísticas, estas do governo, indicavam que, embora o investimento empresarial total tivesse caído no segundo trimestre, o investimento em empresas manufatureiras cresceu pela primeira vez desde 2000.

Déficit alemão
Na Alemanha, o governo deve reportar nesta semana uma violação das regras fiscais da União Européia, pelo terceiro ano consecutivo, em 2004.
De acordo com informações obtidas pelo "Financial Times Deutschland", Hans Eichel, ministro das Finanças alemão, anunciará previsão de um déficit da ordem de 3,7% do PIB, ante a projeção original de 3,3%. Joaquin Almurria, comissário de Assuntos Monetários da União Européia, deve reabrir seu pedido de sanções contra a Alemanha por violação das regras da União. Para 2005, Eichel promete déficit de menos de 3% do PIB, o que manteria o país no limite das regras.

Na boca do poço
E, evidentemente, a semana econômica não estaria completa sem algumas flutuações alucinantes nos preços do petróleo.
Depois de chegar perto da marca de US$ 50 por barril, os preços caíram em 13% nos últimos cinco pregões. O contrato futuro de petróleo cru norte-americano negociado na Bolsa Mercantil de Nova York estabeleceu novo recorde, cotado a US$ 49,40 na semana passada, mas caiu acentuadamente nesta semana, com as notícias de uma melhora no suprimento e uma posição de estoque superior à esperada nos principais países consumidores, especialmente os Estados Unidos, que causaram uma onda de vendas de parte de operadores interessados em realizar os lucros da alta.
A despeito dos preços recorde do petróleo, alguns dos maiores países produtores mundiais reduziram seus investimentos em ampliação da capacidade. A Opep (Organização dos Países Exportadores) revelou nesta semana que seus membros perfuraram 6,5% menos poços em 2003, sugerindo que o baixo suprimento mundial e os preços elevados do petróleo talvez se prolonguem por mais tempo do que se espera.


Tradução de Paulo Migliacci

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