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LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA
Estagflação e queda-de-braço
Os preços sobem, a inflação é uma ameaça, mas o petróleo é a commodity que pode gerar estagflação mundial
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EM TODO o mundo os preços
sobem, a inflação volta a ser
uma ameaça. Poder-se-ia
pensar em uma clássica inflação de
demanda porque apenas nos Estados Unidos esteja começando uma
recessão, mas um número crescente
de analistas adverte sobre os riscos
de estagflação -ou seja, de inflação
combinada com recessão ou crescimento muito baixo. A preocupação
é legítima. A estagflação é uma combinação de inflação de custos com
alguma indexação de preços. Não é a
mesma coisa do que foi a nossa inflação inercial, que era indexada também formalmente, mas tem suficiente número de mecanismos de
indexação de preços para que um
aumento inicial de custos provoque
em seguida um quadro temporário
de estagflação.
A commodity que tem capacidade
de provocar estagflação mundial é o
petróleo. Em duas ocasiões nos anos
1970 (1973 e 1979) e uma vez nos
anos 1990, em seguida à invasão do
Kuait pelo Iraque, o aumento do
preço do petróleo foi um fator detonador da inflação de custos que, em
seguida, se inercializou por um ou
dois anos (não por 14 anos, como
aconteceu com o Brasil a partir de
1980). Agora, ainda que outros preços de commodities estejam crescendo, o petróleo, cujo preço aumentou 150% no mesmo período, é
o fator decisivo a provocar uma inflação que ameaça se transformar
em estagflação.
Diante desse quadro de forte mudança dos preços relativos em favor
dos países produtores de petróleo e
de outras commodities, que fazer?
Economistas do Norte têm uma solução para o problema: esses países
deveriam concordar com uma substancial apreciação de suas moedas.
De fato, se eles mais a China com seu
superávit derivado de rendas do trabalho barato apreciassem suas moedas, haveria uma redução de preços
de todos os bens comercializáveis
que controlaria a inflação local. Os
países ricos continuariam importando inflação porque os preços das
commodities não cairiam, mas os
Estados Unidos não precisariam
mais enfraquecer o dólar para resolver o problema do seu déficit em
conta corrente.
É pouco provável, entretanto, que
os grandes países em desenvolvimento aceitem apreciar suas moedas. No caso do Brasil, porque a
apreciação já lamentavelmente
ocorreu. No caso de quase todos,
porque significaria aceitarem o
aprofundamento de sua própria
doença holandesa -uma falha de
mercado que deriva não apenas de
recursos naturais, mas também de
mão-de-obra barata que, para ser
neutralizada, requer a depreciação
de suas moedas ao invés da apreciação. Além disso, para os exportadores de manufaturados, significaria
perda de competitividade.
Se os Estados Unidos não resolverem essa queda-de-braço com os
países em desenvolvimento, a solução clássica para seu déficit em conta corrente e para o controle da própria inflação seria a combinação de
dois movimentos: de um lado, continuar a depreciar o dólar -uma medida que reduz o déficit em conta
corrente, mas não implica diminuição da inflação; de outro, aumentar
os juros e esperar que, com a diminuição da absorção, os preços afinal
caiam.
Nesse segundo ponto, porém, o
Fed (Federal Reserve, o banco central norte-americano) fazia o inverso e agora está paralisado -preso à
armadilha da crise bancária interna
e da ameaça de recessão. O problema fica, assim, sem saída fácil, e a estagflação torna-se cada vez mais
provável.
LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA , 73, professor emérito
da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Macroeconomia da Estagnação: Crítica da Ortodoxia Convencional no Brasil pós-1994".
Internet: www.bresserpereira.org.br
lcbresser@uol.com.br
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