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EMPREGO PELOS ARES
Enquanto fusão Varig/TAM não "decola", funcionário da área convive com o medo da demissão
Trabalho na aviação encara turbulência
BRUNO LIMA
FREE-LANCE PARA A FOLHA
A negociação do acordo de fusão entre as duas maiores companhias aéreas do país, a Varig e a
TAM, apontada como principal
sintoma da crise enfrentada pelo
setor, tirou o sono dos trabalhadores ligados à aviação comercial.
Aeronautas, aeroviários e aeroportuários temem desvios de rota
individuais (encerrando carreiras) e coletivos (barrando conquistas trabalhistas).
Dados do DAC (Departamento
de Aviação Civil) revelam a retração do setor. O número de assentos oferecidos pelas empresas aéreas nas linhas domésticas, por
exemplo, foi 18,9% menor em junho deste ano do que no mesmo
mês em 2002, com redução de
30% no grupo Varig, 27,6% na
TAM e 17,7% na Vasp. Se considerado o período de janeiro a junho, 2003 aparece com 8,9% menos assentos disponíveis.
A baixa na oferta passa por redução de vôos e, dizem especialistas, é acompanhada de cortes de
funcionários e diminuição de custos com cada trabalhador.
"É um setor com empregos
doentes", diz Uébio José da Silva,
presidente do Sindicato dos Aeroviários do Estado de São Paulo. "A
aviação hoje é status. O trabalhador come mortadela e arrota peru." Para ele, o "glamour" do segmento leva funcionários a aceitar
a baixa remuneração.
Ícaro Machado Vieira, 56, comandante da Varig, diz acreditar
que não terá espaço na nova companhia. Ele conta que, apesar do
mercado ruim, paga com prazer o
curso de piloto para o filho Felipe,
21, "porque é o que ele quer". "É
caríssimo, não fica em menos de
R$ 60 mil. E estou pagando sabendo que não haverá emprego."
"A aviação continua atraindo
pelo romantismo. Mas a realidade
é outra", ressalta o comandante
desempregado Reginaldo Teixeira, 43, que diz viver hoje com ajuda de custo recebida de colegas.
Na TAM e na Varig, onde, segundo estudo atribuído aos responsáveis pela fusão, haveria cerca de 5.000 demissões, uma das
preocupações dos funcionários,
que são habilitados para lidar
com aeronaves determinadas, é
saber quais serão os aviões da nova empresa. A Varig atua com
Boeing e MD, e a TAM, com Airbus e Fokker. "A maioria pensa
nisso o dia inteiro", afirma o mecânico Jucelino dos Santos, 46.
Segundo o porta-voz para assuntos de fusão da Varig e da
TAM, Roberto Müller, não há definição sobre demissões.
Hotel
Sem emprego nas companhias
aéreas, comissários de bordo com
e sem experiência profissional
têm buscado colocações alternativas em hotéis, joalherias e navios.
A categoria é a que enfrenta a
pior situação no setor, em razão
da grande oferta de mão-de-obra.
Segundo o SNA (Sindicato Nacional dos Aeronautas), há cerca de
30 mil profissionais certificados
pelo DAC sem vaga na aviação.
Em 2002, 17 escolas de comissários foram abertas -107 instituições oferecem o curso no país.
A reconfiguração das tripulações, reduzidas ao mínimo exigido -um comissário por porta do
avião-, colaborou para o encolhimento dos postos de trabalho
nas companhias tradicionais sem
que as novas empresas pudessem
absorver todos os demitidos.
A Gol, que começou a operar
em janeiro de 2001, diz que admitiu 135 comissários em suas três
últimas seleções -21% novatos,
36% da Rio Sul (grupo Varig),
16% da Vasp, 11% da Varig, 7% da
Transbrasil (que encerrou operações em dezembro de 2001), 6%
da TAM e 3% das demais. Do total
de comissários em exercício, 58%
vêm de outras empresas.
Mordomo de um hotel nos Jardins desde outubro de 2002, Alexandre Aveiro, 33, revela que ganha um terço do que recebia como comissário, mas com a vantagem de ter agora um plano de
saúde. "O glamour acabou na
aviação. Antes ficava em bons hotéis, tinha um uniforme legal, com
tecido decente. No final, estava
dormindo até em pousada."
Oswaldo Moraes, consultor de
relações do trabalho do Snea (Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias), afirma que a aviação é
recessiva e que não difere do mercado de trabalho de modo geral.
"Mas está sempre entre as primeiras a sentir as crises e entre as últimas a se recuperar", argumenta.
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