São Paulo, domingo, 29 de setembro de 2002

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Dinâmicas de grupo excluem aspirantes com brincadeiras de critérios duvidosos

Jogos avaliam candidatos

FABIANA CIMIERI
FREE-LANCE PARA A FOLHA

As técnicas de psicologia social evoluíram após a Segunda Guerra e começaram a ser utilizadas em processos seletivos da década de 70. As dinâmicas de grupo passaram a ser usadas no Brasil nessa época. Hoje é improvável que um profissional consiga o primeiro emprego em uma grande empresa sem passar por elas.
Essa forma de avaliação se tornou a principal peneira da seleção, pois permite avaliar um número grande de candidatos em pouco tempo, se comparada com as técnicas tradicionais.
Em geral, a dinâmica acontece após uma prova de línguas ou de conhecimentos gerais e precede as entrevistas pessoais. Os candidatos são divididos em grupos de dez a 15 pessoas. Enfrentam situações-limite por um período de pelo menos quatro horas, no qual todas as reações são analisadas.
"Como o jovem muitas vezes não tem experiência, ele participa de dinâmicas que avaliam competências", explica a diretora da Career Center, Karin Parodi. Defendida com unhas e dentes pelos profissionais de recursos humanos, entre os estudantes a dinâmica é vista com um misto de medo com desconfiança.

Constrangimento
A administradora recém-formada Renata Fzterling, 23, calcula ter participado de mais de oito dinâmicas. Afirma ter saído humilhada em pelo menos 70% delas. Fzterling sentiu-se ofendida ao ter de simular uma discussão, "que incluía xingamentos", situação que diz evitar no dia-a-dia. Em outra ocasião, teve de compor uma música com o nome da empresa e depois representá-la, cantando e dançando.
Na opinião da administradora, as dinâmicas intimidam o can- didato e impedem que ele se mostre como realmente é.
Não é o que pensa o consultor John Cymbaum. Segundo ele, o caráter lúdico dos jogos deixa as pessoas mais autênticas.
Cymbaum discorda das críticas dos estudantes, que dizem faltar critérios nas brincadeiras. "Apesar de parecerem esdrúxulos, esses jogos podem ter por trás uma técnica solidificada", afirma.

Critérios objetivos
Luciana Guedes Pinto, gerente técnica da Companhia de Talentos, explica que os critérios não são tão subjetivos quanto parecem. Segundo ela, cada tarefa é montada com o objetivo de avaliar o nível que os candidatos têm em competências predefinidas.
Cada pessoa é analisada tendo como parâmetro as qualidades determinadas pelo perfil que a empresa busca. Interação com o grupo, capacidade de argumentação, nível de agressividade e de flexibilidade são sempre observados, apesar de cada dinâmica ter um alvo próprio.
Para um cargo de gerente de vendas, um determinado nível de agressividade é positivo. Para uma posição administrativa, essa mesma atitude é negativa.
Luciana conta ter avaliado uma candidata em duas situações. Numa, a pessoa concorria a uma vaga de trainee e não passou por falta de liderança. Em outra ocasião, a mesma candidata concorria a uma vaga técnica e foi reprovada por excesso de liderança.
"É desvio de percepção dar à dinâmica de grupo um caráter decisório", diz o filósofo e doutor em educação Mário Sérgio Cortella.
Para ele, os valores mudaram, e o trabalho passou a ser coletivo. Antes a seleção se concentrava em habilidades individuais. "Pessoas que hoje ocupam a primeira linha das empresas seriam excluídas se fossem avaliadas por dinâmicas."


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