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INSPIRE RESPIRE TRANSPIRE
Ioga nas alturas
Nova aula propõe posturas realizadas com o corpo suspenso em barras
e de cabeça para baixo; especialista
adverte que há riscos para quem tem pouco preparo muscular
IARA BIDERMAN
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
A aula de ioga gravitacional começa sem grandes vôos. Sentados, os alunos praticam
os exercícios respiratórios. A repórter consegue acompanhar as instruções
preliminares, apesar de ser iniciante na prática milenar. Bem, milenar se considerarmos
metade da história, a que é inspirada nas técnicas da ioga mesmo. A outra metade, ou
seja, a "gravitacional", é invenção bem contemporânea.
Seu criador, Pedro Goulart de Andrade Filho, acumula os créditos de designer de
sapatos, faixa preta de tae-kwon-do, pára-quedista e iogue autodidata. Atenção,
puristas: iogue no sentido, dicionarizado, de pessoa que pratica ioga. Ele aprendeu as
práticas sozinho, com livros, enquanto procurava uma "luz no fim do túnel em que se
encontrava".
Andrade Filho chegou ao fundo do poço por um processo de crises profissionais,
acelerado por pelo menos meia dúzia de acidentes em saltos de pára-quedas. No
último, teve várias fraturas, agravou quatro hérnias de disco e teria de passar por uma
cirurgia na coluna.
Desafiando o diagnóstico, ele buscou soluções próprias. Descobriu a ioga e voltou a
pular de pára-quedas. Durante um salto, praticando as respirações profundas da ioga,
sentiu suas vértebras se descomprimirem e sua coluna se alinhar.
Foi a deixa para ele inventar uma forma de praticar ioga como se estivesse flutuando
no ar. Para isso, pendurava barras no teto e, segurando-se em correias de tecido,
elevava-se para realizar as posturas mais ou menos como um trapezista. Não
satisfeito, desenhou e confeccionou as "botas gravitacionais", espécie de tornozeleira
com ganchos, que lhe permitiam ficar pendurado de ponta-cabeça. Assim, ficava nas
posturas invertidas da ioga, como a vela, sem ter de apoiar a cabeça no chão e
contando com a força da gravidade.
Voltando à aula, a fase seguinte é a "saudação ao sol", série composta de 12 posturas
que alongam o corpo todo. Os outros dois participantes (as aulas são para, no máximo,
seis pessoas) já eram veteranos em outras modalidades de ioga, mas experimentavam
a gravitacional pela primeira vez.
Finalmente, ao que interessa. Os alunos agarram as correias e a ordem é: pernas para
o ar. Na demonstração do professor, não parece difícil. Com os braços estirados, ele
eleva as duas pernas. Fácil, se você tiver um abdômen de aço. Caso contrário, a
impressão é a de ter de erguer pernas de ferro. A força da gravidade e o peso do corpo
estiram os braços ao limite.
No exercício seguinte, a coisa fica séria: um salto mortal duplo, que termina no ar. A
iniciante tem direito a uma mãozinha do professor e a um banco para se apoiar ao
descer. Antes de poder recusar o tentador convite, vapt, um giro, vupt, outro. A
sensação de náusea fez com que a repórter agradecesse a Shiva por não ter comido
nada nas últimas cinco horas.
Mas o salto mortal não era nada comparado à posição da chegada. Os braços torcidos
e estirados para trás, a coluna em forma de U, as pernas dobradas com os pés na
direção da cabeça. Pensando em pedir ajuda ao professor para sair dali, a repórter
percebe que ele está pendurado em sua barra. Talvez por instinto de sobrevivência,
descobre-se como sair dali. De volta ao solo, dá para observar com uma ponta de
inveja os veteranos repetindo a façanha mais duas vezes. Na ioga gravitacional, são
feitas, no máximo, três repetições de cada movimento -e é muito.
Chegou o grande momento. Os alunos colocam as botas gravitacionais e ficam de
cabeça para baixo. Para quem nunca fez uma vela, a sensação é a de que o mundo
está caindo na cabeça, tamanha a pressão na testa. "Esqueça qualquer desconforto e
concentre-se nos prazeres propiciados pela posição. Imagine coisas agradáveis",
sugere o professor.
O final da aula é dedicado ao relaxamento, com as luzes apagadas e ao som de uma
música "new age". O simples fato de estar em contato com o solo é o suficiente para
relaxar. Terra firme é o Nirvana.
De volta ao mundo dos bípedes, a primeira preocupação é verificar se todos os ossos
estão no lugar. Parece que estão. Os músculos peitorais e os dos braços estão
doloridos, e os abdominais acusam o esforço realizado. A impressão é a de que deve
ser uma ótima aula para quem quer ganhar uma barriga impecável e nunca mais se
preocupar com aquele músculo do tchau (o tríceps). Também deve ser boa para alunos
avançados de ioga que querem melhorar a performance. Para os iniciantes, há
controvérsias.
Segundo Ricardo Munir Nahas, diretor científico da Sociedade Brasileira de Medicina
do Exercício e do Esporte, sustentar o peso do corpo em uma posição que não é
natural exige preparo. "Quem não está preparado fisicamente tem de atingir um bom
estágio de condicionamento para, depois, poder se aventurar em outras coisas sem
problemas", diz. Mesmo os mais condicionados precisam passar por um período de
adaptação -os movimentos novos devem ser introduzidos gradativamente, para que o
organismo aprenda a suportar o novo estresse e haja menos riscos de lesões. "Ficar
pendurado sobrecarrega as articulações e as ligações, causa uma força indevida. Mas
o organismo pode se adaptar a essa força, desde que seja feita de maneira
progressiva", explica.
Além disso, a carga aplicada na cabeça pode causar sintomas que vão do desconforto
ao aumento de pressão. "Deve-se ficar de cabeça para baixo por pouco tempo."
Andrade Filho recomenda que as pessoas façam consultas com cardiologista,
ortopedista e oftalmologista antes de aderirem à pratica. Ele também adverte que os
exercícios só podem ser feitos no mínimo duas horas após a ingestão de alimentos e
sempre com um acompanhante por perto.
onde praticar:
>>> Yoga Flow
[www.yogaflow.com.br]
tel. 0/xx/11/3849-6857
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