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OUTRAS IDÉIAS
MICHAEL KEPP
Auto-estima e suas oscilações
A auto-estima brasileira é um tema recorrente -em colunas,
entrevistas e textos
acadêmicos- que continua a
acender debates. É alta ou baixa demais? Este povo se coloca
num pedestal ou acha que não
merece plataforma? As opiniões se dividem radicalmente,
não só entre brasileiros mas
dentro deles, em uma ambivalência interna que faz alguns
parecerem esquizofrênicos.
Por exemplo, o mesmo brasileiro que diz "Deus é brasileiro"
pode contar a piada em que o
anjo pergunta a Deus por que
ele escolheu o Brasil para ser
este paraíso na Terra -sem terremotos, vulcões ou furacões.
Ao que Deus retruca: "Espera
até eu botar o povinho".
A maioria dos brasileiros, porém, é bem menos dividida e
sente orgulho de fazer parte de
um "povinho" que produz os
melhores jogadores de futebol,
uma música que brilha entre as
melhores e o Carnaval, o maior
espetáculo da Terra. Pelé e Chico Buarque são endeusados
porque são a epítome dessas
fontes de orgulho nacional.
Mas o orgulho nacional não
aumenta necessariamente o
orgulho pessoal. A maioria dos
brasileiros não ganha respeito e
sobrevive economicamente
por se destacar, mas por ter se
integrado a turmas interdependentes, seja a família, seja redes
de "quem indica", seja gangues
de traficantes de drogas. E essa
conformidade coletiva inibe a
expressão pessoal, que aumenta a auto-estima.
Em comparação, os americanos são ensinados a se destacar
criativa ou intelectualmente e a
ter independência financeira
desde cedo. Pelo fato de a sociedade americana ser um ensopado de individualistas, e não
uma sopa de tipos similares,
tem excedente de auto-estima
pessoal, quiçá narcisismo. Esses traços, diz o ensaísta David
Foster Wallace, criaram "a geração mais egocêntrica desde
Luís 14" -a fonte do complexo
de superioridade americano.
O status dos EUA como poder global dominante alimenta
esse complexo. E leva o Brasil,
uma potência emergente, a
buscar seu reconhecimento. A
frase "deu no "NY Times'" mostra a importância que os brasileiros conferem a esse reconhecimento. Apesar do forte sentimento antiamericano aqui, um
editorial favorável do "NYT"
sobre o Brasil ainda infla o ego
nacional. Mas um desfavorável
dispara a indignação. Este povo, ao valorizar demais a opinião americana sobre a própria
pátria, não estaria expondo um
ego nacional frágil?
Nelson Rodrigues chamou
essa condição de "o complexo
de vira-lata". Nos anos 50, de
acordo com o colunista Daniel
Piza, Rodrigues criticou o cronista esportivo brasileiro que
idealizava times de futebol europeus, supondo que um povo
mestiço não produzisse grandes atletas. No início dos anos
70, o cronista via que sua seleção era a melhor.
Cada cultura oscila entre períodos de auto-enaltecimento e
autodesvalorização. Desde a
Guerra do Iraque, os americanos têm se perguntado "por
que eles (quase todos os outros
povos) nos odeiam?". Não é
uma pergunta surpreendente,
diante do narcisismo deles,
mas faz americanos capazes de
ver os EUA com olhar crítico se
sentirem diminuídos.
MICHAEL KEPP , jornalista norte-americano radicado há 25 anos no Brasil, é autor do livro de
crônicas "Sonhando com Sotaque - Confissões e
Desabafos de um Gringo Brasileiro" (ed. Record)
www.michaelkepp.com.br
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