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a sete chaves
Preparação é cercada de segredos
DA DETECÇÃO DE TALENTOS NAS ESCOLAS AO CONFINAMENTO EM CENTROS DE TREINAMENTO,
FORMAÇÃO DE ESPORTISTAS NA CHINA QUE BUSCA TOPO NAS MEDALHAS É ESCONDIDA DE FORASTEIROS
DE PEQUIM
Em apenas 20 anos, a
China dobrou suas medalhas
de ouro e se tornou a segunda
maior potência olímpica. Em
Atenas-2004, ganhou 32 ouros,
quatro a menos que os EUA.
Competindo em casa desta
vez, a China pretende chegar ao
topo do ranking de medalhas.
Como um país que ficou de
fora das Olimpíadas entre 1952
e 1984 já chegou tão longe?
Se depender da China, dificilmente alguém de fora irá saber
a resposta. Até para os padrões
da fechada ditadura comunista,
a fábrica de medalhas olímpicas é supersecreta. Visitas a
centros de treinamento são
proibidas, e os diversos especialistas chineses ouvidos pela
Folha desconversam, dizendo
que a evolução é normal.
Mas relatos de vários esportistas indicam a excepcionalidade da preparação chinesa.
Medalha de ouro na canoagem
em Atenas, Yang Wenjun, 24,
admitiu recentemente que há
três anos não vê seus pais, enfurnado em um centro de treinamento onde não há televisão
e fotos da família são proibidas.
Técnico da seleção chinesa
de remo, o russo Igor Grinko
revelou que preparadores físicos chutavam atletas "moles"
na hora de treinar.
Crianças na mira
Estrela da NBA, Yao Ming foi
"descoberto" aos dez anos,
quando um médico previu que
ele ultrapassaria os 2 m de altura -tem 2,26 m-, pelo tamanho de sua mão.
Sabe-se que crianças ainda
pequenas, quando descobertas
por seus professores de educação física, são enviadas para
centros de treinamento em todo o país. As 3.000 escolas esportivas têm 250 mil alunos, a
partir dos dez anos, e são administradas pelas faculdades de
educação física na China.
"Os professores de educação
física ficam de olho nas escolas,
e os times municipais e de todas as Províncias da China fazem essa seleção", disse Huang
Yaling, chefe do programa de
mestrados da Universidade dos
Esportes de Pequim, a mais importante do país, à Folha.
"Mas muitos pais preferem
que seus filhos cheguem à universidade, então só os que não
confiam muito na dedicação
aos estudos do filho permitem
que ele vá à escola esportiva."
A partir do momento em que
a criança chega aos centros, começam as especulações. A professora Huang, ex-jogadora de
basquete, que nos anos 70 participava de jogos sem placar ou
árbitro pela política comunista
de então, nega a boataria sobre
os métodos bizarros aos quais
os atletas seriam submetidos.
A ex-atleta americana Susan
Brownell, que há 20 anos estuda os esportes no país, nega que
haja engenharia genética para
encorpar os futuros atletas,
que se usem torturas no treinamento ou abuso de crianças.
"São mitos, mas é verdade
que ainda há um peso militar
muito grande na prática esportiva. Ainda há crença em muitos lugares de que dor e sofrimento são fundamentais para
se criar um bom atleta", diz.
Sem casamento
A boataria sobre a construção dos superatletas só aumentou nos anos 90, quando mais
de 30 nadadores chineses foram pegos em antidoping.
Autor de "Olympic Dreams,
China and Sports, 1895-2008"
("Sonhos Olímpicos, China e os
Esportes"), o historiador Xu
Guoqi revela que recrutamento
e treinamento para torneios internacionais são prioridades no
planejamento esportivo e que
atletas de elite são proibidos de
casar até os 26 anos "para se focar nos esportes".
Os investimentos chineses
em esportes são mais focados
na produção de futuros medalhistas. "Assistir a esportes pela
TV é bem mais comum do que
praticar para os chineses", admite a professora Huang.
Seja pela rotina de trabalho
massacrante da maioria ou pela
falta de espaços públicos nas
superpopulosas cidades chinesas, a prática esportiva ainda é
para poucos no país.
Apesar de já ser a terceira
maior economia do mundo, a
China é um país pobre. Sua
renda per capita, de US$ 2.500,
é quase a metade da do Brasil, e
uma pequena fração comparada à dos EUA (US$ 40 mil).
Foco no ouro
"Quando me convidaram para trabalhar na China, falaram-me que um ouro vale por mil
pratas", disse o técnico russo
Grinko ao jornal americano
"The New York Times".
"Se não for ouro, estou demitido. É a mesma política da Alemanha Oriental nos anos 70",
recorda. Há 20 estrangeiros dirigindo algumas das principais
seleções chinesas, e dezenas
deles em times menores.
A China tem priorizado esportes individuais, que dão
muitas medalhas, e deixado de
lado os que rendem um ouro.
Segredo militar
O segredo que esconde a fábrica de medalhas chinesa só
aumenta especulações. A reportagem da Folha foi à Universidade dos Esportes de Pequim falar com especialistas.
Ao sair do táxi, na entrada
principal do campus, fui cercado por oito seguranças de uniforme militar que me perguntavam o que eu fazia ali. Fui
impedido de entrar "por ser estrangeiro". Liguei para a professora Huang, que me esperava, e ela disse que pediria autorização para minha entrada.
Mais de uma hora depois, ela
disse que eu não poderia entrar. Do campus, só vi os murais de pedra na entrada, onde
esportistas são retratados ao
melhor estilo do realismo socialista.
(RAUL JUSTE LORES)
119
é o número
de eventos em que a China
avaliou que vinha falhando
nos últimos anos. Para
tentar ganhar esses ouros
"desperdiçados", o país criou o
"Projeto 119" para investir em
esportes sem muita tradição
no país, como atletismo,
natação e remo
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